“Energia é o que tensiona o arco;
decisão é o que solta a flecha.”
Sun Tzu
Desde a pandemia iniciada em 2020, seguida da guerra Rússia-Ucrânia em meio a uma guerra fria EUA/China, o mundo vive uma complexa conjuntura. Essa é a base das dificuldades para se desenhar cenários para as indústrias energéticas. A imensa maioria dos países é signatária do Acordo de Paris sobre a descarbonização, de alguma forma “travado” sob a conjuntura atual.
Percebe-se uma fase de montagem de estratégias em P&D mais aplicada, com leis suportando as ações de países como os EUA (IRA) e a União Europeia (Green Deal), entre outros, enquanto a imensa maioria dos países espera o caminho que virá. Essa constatação se relaciona com a lógica do processo de desenvolvimento e os países líderes de um lado e seus seguidores ou antigas colônias de outro. Pode-se ver isso na agricultura, em que a imensa maioria dos países apenas adaptou a tecnologia desenvolvida pelo mundo temperado do hemisfério Norte à sua realidade.
Nesse sentido, o Brasil foi muito diferente em seu agronegócio, a partir dos anos 1970. Uma onda positiva trouxe investimentos privados e política pública suportando programas de modernização das lavouras e de P&D em que, do lado público, foi criada de forma genial a Embrapa e seu modelo inovador. Entre as boas novas, veio a onda chamada Proálcool, focada na substituição da gasolina pelo etanol, seguida mais tarde pelo biodiesel, bioeletricidade e, hoje, com o uso de subprodutos das indústrias, o biogás e o biometano.
Produzindo em larga escala, os biocombustíveis marcaram fortemente a capacidade brasileira privada de criar e de gerir (público e privada) a oferta e estimular uma demanda que, além de substituir importações (década de 1970), respondeu de forma acelerada à redução da poluição local e das emissões de CO2, com milhões de empregos em uma longa cadeia produtiva, que se somou à da indústria automobilística, da energia elétrica e, mais recentemente, à da biogás e biometano (reduzindo o consumo de diesel), como antes citado.
Uma série de registros climáticos de temperatura, calor do oceano e gelo marinho da Antártida alarmaram alguns cientistas que dizem que sua velocidade e tempo são sem precedentes. “Não tenho conhecimento de um período semelhante em que todas as partes do sistema climático estivessem em território anormal ou recorde”, diz Thomas Smith, geógrafo ambiental da London School of Economics. No gráfico em destaque estão quatro recordes climáticos quebrados até agora nesse verão de 2023 – o dia mais quente já registrado, o mês de junho mais quente já registrado globalmente, ondas de calor marinhas extremas, gelo marinho antártico recorde.
Qualquer cenário no mundo hoje considera pelo menos 3 fatores fundamentais para desenhar perspectivas: as mudanças climáticas e os esforços em descarbonização, a insegurança alimentar e a energética.
Os dados internacionais mostram queda de investimentos globais em novos poços de petróleo ou em shale oil, que na conjuntura de crise e menor crescimento ainda não se fizeram sentir tanto. Por outro lado, seguem investimentos no mundo em carvão mineral (recaída justificada pela insegurança energética atual) e em energia nuclear, ao mesmo tempo em que se tornam competitivas as energias eólicas e solares.
No mundo de crescente demanda energética, mesmo na crise, e com fortes compromissos de redução de emissões como a China e a Índia, as novidades têm sido interessantes. No mundo rico, com planos e poucas ações, e casos de desconfortável ausência de soluções, além da melhoria de eficiência energética e tentativas unilaterais de regramento (União Europeia) global, o novo é a tendência afunilada na busca ao hidrogênio verde.
Esse o cenário mais claro no “fog” que limita a visão, o qual para o Brasil traz positivas oportunidades ao seu agro, nitidamente pela sua capacidade competitiva, sua infraestrutura de postos de abastecimento e pelas ações público-privadas desenvolvidas desde os anos de 1940, pressionado pela Segunda Guerra Mundial e pela escassez de gasolina.
A biomassa é o grande vetor energético do mundo tropical, casada com o desenvolvimento nacional da mistura de combustíveis renováveis/fósseis, com o avanço dos motores flexíveis e dos modelos híbridos (com motores elétricos junto aos de combustão), na lógica de se ter, por exemplo, o etanol como um verdadeiro cacho de hidrogênios! Enquanto o País aprovou sua lei federal dos biocombustíveis – RenovaBio – tem havido a importante adaptação das políticas nessa linha pela Índia, extremamente relevante à disseminação do processo no mundo do Sul.
Através do programa governamental “Combustível do Futuro”, foram elaboradas as coordenadas à plataforma de desenvolvimento da célula de combustível, como meta de uso do hidrogênio em escala mundial. O biodiesel, nas cadeias de leguminosas, palmáceas e do sebo animal, cuidaria da substituição do diesel, suportado também por subprodutos das refinarias de petróleo.
Esse cenário brasileiro já parte com a enorme vantagem de realizar quase 50% do consumo de energia renovável em sua matriz energética, e acima de 85% em sua matriz elétrica! O cenário do setor sucroenergético é, de fato, de grande relevância e oportunidade. Há importantes investimentos na produção, como a integração cana-milho; do etanol de segunda geração, via celulose de bagaço e palha; na produção de biogás e biometano, além da bioeletricidade; há uma integração antiga cana/soja sendo a leguminosa fonte de biodiesel e proteínas; há efetivo esforço na recuperação da produtividade agroindustrial canavieira, base para o processo de capacidade competitiva da cadeia produtiva.
Todos os caminhos, na tendência global, acentuam o foco para o desenvolvimento da bioeconomia, com elevada competitividade, incluídas nisso a produtividade total dos fatores e a sustentabilidade dos processos produtivos. Essa é uma procura que valoriza sobremaneira o Brasil e seu Agro tropical desenvolvido para as suas condições tropicais.
Olhando o lado da demanda, temos não apenas o modo rodoviário, onde tudo começou, mas também os mercados de biocombustíveis sustentáveis de aviação (SAF) e os mercados de biocombustíveis para a marinha, ambos com consumos elevados e, portanto, com emissões de CO2 a serem mitigadas.
A lógica econômica-ambiental-social do negócio sucroenergético está toda assentada em produtividade agroindustrial, uso integral da biomassa, valorização das externalidades positivas dos seus produtos frente aos que substitui, agregação de valor em integração com outras culturas e desenvolvimento tecnológico.
Esse cenário, como todos os que procuram antecipar o futuro, depende de uma sólida relação pública-privada, em ambiente de profundas mudanças. Essa é uma variável complexa, política e indefinida em um país com dificuldades de lideranças que unam objetivos nessa dimensão.
É fundamental, nesse cenário, ter proatividade como país, em questões que possam dificultar a narrativa positiva desse processo da bioeconomia, como o combate ao desmatamento ilegal e, um posicionamento do Brasil junto à OMC e à OCDE. É importante ter Acordo Comerciais e estar inserido na evolução de outros países emergentes.
Exemplo recente disso foi o bloqueio, por vários países liderados pela Arábia Saudita, para que as nações que compõem o G20 reduzam o uso dos combustíveis fósseis. Esse tipo de pressão continuará na próxima reunião da COP28 nos Emirados Árabes.