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José Guilherme Perticarrari

Consultor da Perti Agri Consultoria

Op-AA-48

O desafio que está sendo vencido
O foco principal deste artigo é mostrar a evolução do sistema de plantio mecanizado no Brasil e a constatação de que, apesar dos desafios tecnológicos que o setor ainda precisa vencer para obter resultados de produtividade similares ou superiores ao sistema de plantio manual, com as tecnologias já existentes, uso do bom senso e de uma boa estratégia logística e operacional, podem obter-se níveis satisfatórios de qualidade de plantio, com baixos custos e alta produtividade.

Se existe uma operação agrícola dentro da cadeia produtiva da cana-de-açúcar que vem sendo aprimorada e reinventada todos os dias na última década, essa operação é o plantio. Tudo começou, vale relembrar, num passado não muito distante, no início da década de 1990, depois de viagens feitas à Austrália, na época, a detentora das mais avançadas tecnologias de plantio mecanizado. Foi importada uma plantadora de fabricação australiana, para se encurtar o tempo de desenvolvimento da tecnologia. Nas duas primeiras áreas de ensaios feitas com a plantadora, os resultados foram desanimadores.

A primeira área foi totalmente prejudicada pela podridão abacaxi, e a segunda teve um grave problema de assoreamento quase total dos sulcos de plantio, resultando em uma brotação próxima de zero. Teria sido isso azar? Não. Descobrimos rapidamente que não se podia achar que o Brasil era a mesma coisa que a Austrália. Lá, o plantio mecanizado recebia um cuidado especial com as gemas e os toletes em relação aos danos mecânicos na colheita da muda, com o uso de colhedora adequada para essa função, e ainda utilizavam, no tratamento químico dos toletes, um fungicida mercurial de alta eficácia, proibido no Brasil, assim não tinham o problema com fungos que causavam a podridão abacaxi.

No caso do assoreamento, constatou-se que o sulcador da plantadora era para plantio em áreas irrigadas na Austrália, que fazia um sulco muito raso para as condições brasileiras, o que facilitou o assoreamento e a perda da área. A partir daí, a maioria já conhece a história da evolução do plantio mecanizado no Brasil até chegar aos dias atuais. Por mais que se tenham feito desenvolvimentos pelas instituições de pesquisa, empresas fabricantes de equipamentos e agroquímicas, sempre houve um gap tecnológico entre as necessidades do plantio mecanizado e a dura realidade.

Isso porque o desenvolvimento do plantio mecanizado não obedeceu a um cronograma planejado estrategicamente. Ele foi fruto da necessidade legal da implantação do sistema de colheita mecanizada de cana crua no Brasil, que arrastou com ele o plantio mecanizado, por inúmeros motivos, técnicos, trabalhistas (como a NR-31), legais e econômicos. Ainda estamos pagando um ônus por essa defasagem, pois o plantio não aceita desaforos, como dizem os mais antigos no setor. 

 
Mas, como nós brasileiros temos uma capacidade muito grande de sobreviver às dificuldades e de aprender com os nossos erros, partiu-se para uma escalada tecnológica de evolução do sistema de plantio mecanizado sem precedentes. Foram abordadas todas as etapas do processo: desenvolvimento de máquinas e equipamentos agrícolas, técnicas agronômicas, de fitossanidade, variedades adequadas, qualidade da muda, logística, entre outras. Dentro desse contexto, a evolução na área de desenvolvimento de equipamentos foi uma das mais acentuadas.

Atualmente, o setor produtivo conta com, pelo menos, quatro grandes empresas fabricantes de plantadoras de cana-de-açúcar, sendo que as novidades mais atuais estão relacionadas ao controle das operações do plantio, como utilização de câmeras em diversos pontos da plantadora, sensores dosadores de insumos, controladores de dispositivos hidráulicos, aferidores de velocidade e georreferenciamento por GPS. As câmeras, inicialmente, foram utilizadas para auxiliar o operador da plantadora durante o trabalho noturno, porém, atualmente, estão sendo empregadas em maior quantidade, com objetivo de substituir o operador da plantadora, restando ao operador do trator controlar essas funções.

Nos equipamentos mais modernos, essas funções já estão totalmente automatizadas. Trata-se de uma tecnologia de ponta, que reduz custo de mão de obra e teve sua eficácia comprovada nas avaliações de plantios. Na prática, costumamos dizer que o melhor plantio mecanizado é aquele que utiliza torta de filtro ou outros compostos orgânicos e sistema de preparo do solo localizado/reduzido. A torta, porque é uma excelente fonte de fósforo e nitrogênio, além de melhorar muito as propriedades físicas do solo, retendo melhor a água e os nutrientes para a planta.

O preparo localizado, porque um dos grandes problemas do plantio mecanizado é o assoreamento dos sulcos de plantio, e esse sistema é muito positivo quanto a esse aspecto. As mudas são o ponto crucial do plantio mecanizado. Além das questões básicas quanto à sua qualidade, sanidade, vigor, etc., o ponto mais importante é que a muda tenha em torno de 8 meses de idade, no máximo 9. Não se deve passar dessa idade, sob pena de até se perder o plantio. Um outro aspecto importante é com relação às condições físicas dessas mudas para a colheita mecânica e o plantio mecanizado comercial.

Estamos priorizando o vigor e a massa vegetal, mas é importante que elas permaneçam eretas e não tombem facilmente com qualquer vento. A localização dos viveiros influencia bastante os rendimentos operacionais dos equipamentos envolvidos no plantio e diretamente nos custos. Lembrando que, além da colheita e do transporte da muda, existe toda uma retaguarda de suporte técnico, vários insumos, etc. O ideal é que se consiga planejar a localização do viveiro diretamente nas áreas de plantio ou o mais próximo possível delas. 

 
Um dos assuntos que estão em evidência no momento é o mapeamento e o restabelecimento das falhas de plantio, além da perspectiva de se poder replantar as falhas do canavial no último corte, ao invés de se fazer a reforma do canavial. Com relação à segunda opção (substituir a reforma), não vou abordar o assunto, porque, atualmente, existem empresas trabalhando nessa alternativa, e não seria muito ético da minha parte. Já o monitoramento e a correção das falhas de plantio são assuntos que trabalhamos nos últimos três anos e com o qual tivemos um excelente aprendizado.

Apesar de todos os pontos positivos do trabalho e do grande potencial do uso de VANTs para o monitoramento e a correção de falhas, ainda continuamos falando e provando que o melhor custo de plantio é o “plantio sem falha”. Daí priorizarmos a evolução do sistema de plantio mecanizado. Já a melhor época para se fazer o plantio mecanizado é um paradoxo. O que é bom para o plantio, que é o solo úmido, não é para a colheita das mudas, que é o solo seco.

Dessa forma, o planejamento do plantio deve acrescentar às demais condições de contorno a limitação da colheita da muda em função de umidade e tipo de solo, como também no plantio, pois os equipamentos são pesados e de tráfego complicado, com excesso de umidade no solo. Estudos mais recentes de dados, aprofundados pela Perti Agri em 2015, mostram que as perdas médias de produtividade que ocorrem no sistema de plantio mecanizado, durante o ciclo de produção da cana-de-açúcar, mesmo em usinas bem administradas, variam de 2% a 12%, com média de 8%. 

 
Só a época de plantio não adequada, forçada pelas características do sistema de plantio mecanizado, e o aumento da duração do plantio, de três meses efetivos (cana de ano e meio) para cinco a sete meses de plantio, são responsáveis por perdas de produtividade que podem chegar até 10%. Dessa forma, o ideal é que pudéssemos, cada vez mais, superar os obstáculos técnicos e concentrar novamente o período de plantio só naquele favorável, como no plantio manual, mas, por enquanto, teremos que conviver com essa situação.
 
Finalizando, a mecanização do plantio envolve diversas variáveis que influenciam no processo, como: topografia semelhante à colheita mecanizada; melhor qualidade de preparo e maior preservação do solo; redução do tráfego e menor pisoteio; layout do talhão; espaçamento entre linhas; logística de abastecimento e controle de dosagem de insumos agrícolas; dosagem de mudas; cobrição da linha de plantio; idade e qualidade da muda; potência dos tratores; treinamento e interação das equipes. Isso evidencia que todo o esforço em pesquisa e desenvolvimento para melhoria desse sistema deverá continuar abrangendo diversas disciplinas, como agronomia, engenharia agrícola, biotecnologia e fitossanidade. A sinergia entre essas áreas será o diferencial para o sucesso dessa tecnologia que vem crescendo de forma exponencial no Brasil.