O Brasil ocupa posição de destaque no cenário mundial quando o assunto é sustentabilidade energética. É uma das únicas grandes economias em que a participação de fontes renováveis atinge patamares elevados – cerca de 50% – há décadas. Isso foi alcançado com o aproveitamento de nossos recursos naturais, como a exploração do potencial hidrelétrico, mas também com o desenvolvimento de tecnologias e a abertura de novos mercados, como o do setor sucro alcooleiro.
O País aplicou ativamente recursos para criar seu mercado interno de etanol. Políticas públicas, como o antigo Proálcool, tiveram papel fundamental para o florescimento desse setor, criando um ecossistema de produtores altamente eficiente e competitivo, além de uma frota de carros bicombustível única no mundo.
A Bunge, por exemplo, iniciou sua história no setor em 2006, negociando açúcar, e, desde então, construiu uma forte posição na comercialização e produção de açúcar, etanol e bioeletricidade. Durante todos esses anos, vimos o setor inteiro passar por uma grande evolução: aumento do uso da tecnologia no campo, maior qualidade de vida para colaboradores, melhorias logísticas e ampliação da produtividade. Tudo isso traz para o País grande competitividade no cenário mundial.
O mercado brasileiro de etanol para transporte é único no mundo, pois atingiu uma maturidade que já pode tirar proveito das chamadas “economias de rede”, quando um produto se torna mais atrativo devido à sua presença massiva no mercado. Isso garante, por exemplo, que seja vantajoso aos consumidores adquirir carros que possam utilizar álcool, pois eles têm a certeza de poder abastecer em qualquer ponto do País a preços competitivos.
Por sua vez, os distribuidores e produtores de combustíveis, cientes do mercado consumidor crescente, investem e disponibilizam, de forma cada vez mais eficiente, o combustível. Tecnologias alternativas, como carros elétricos, mesmo evoluindo rapidamente no mercado mundial, não atingiram esse ponto de maturação.
Ainda não há uma rede de recarregadores de baterias que proporcione segurança a potenciais compradores desses veículos, e isso é um dos principais entraves para a popularização desse produto. Montadoras que apostam nessa tecnologia têm investido pesadamente, por vezes por meio de consórcios, para estabelecerem redes de recarregadores suficientemente extensas, de maneira a aumentarem a atratividade por seus automóveis.
Um ponto que ainda está indefinido e pode retardar a criação de uma rede local de recarga de carros elétricos é a chamada “guerra dos plugs”. Diferentemente do sistema de abastecimento de etanol, que já é universal, hoje existem três modelos de plugs predominantes em diferentes regiões do mundo: Estados Unidos, Europa e Japão, além da China. Cada grupo de fabricantes está redobrando suas apostas no seu próprio modelo, buscando estabelecer o padrão de mercado e, com isso, surfar nas economias de redes resultantes.
O etanol também está no páreo dessa disputa. Recentemente, a Nissan apresentou seu programa de desenvolvimento de um sistema movido por uma Célula de Combustível de Óxido Sólido (SOFC, na sigla em inglês). Nesse sistema, o veículo é abastecido, basicamente, por uma solução de etanol e água que seria convertida em eletricidade por meio de uma reação química na célula, substituindo, assim, as baterias hoje utilizadas pelos veículos elétricos.
Esse sistema tem três grandes vantagens: (1) o tempo de abastecimento seria o mesmo de um carro movido a etanol ou combustível fóssil, via combustão interna; (2) especialmente no Brasil, o sistema já poderia usufruir da ampla capilaridade da distribuição de etanol existente, e talvez a mais relevante, (3) não necessita de metais nobres para a confecção das baterias, barateando o custo do equipamento.
O processo de popularização dos carros elétricos tende a durar anos, e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima que, em 2026, o mercado brasileiro atinja a marca de 100 mil unidades elétricas emplacadas, o que representaria apenas 2,5% do total de veículos.
Contudo é nesse período que os novos padrões serão definidos, e os rumos do mercado serão traçados. Mais uma vez, as políticas públicas terão um papel importante na manutenção do Brasil na vanguarda do mercado de energia sustentável. Políticas mal elaboradas, como o recente controle artificial dos preços dos combustíveis fósseis, podem afetar severamente a sustentabilidade e a capacidade de investimento do setor de energias renováveis.
Todavia há sinais que alimentam otimismo, como a nova Política Nacional de Biocombustíveis: a RenovaBio, sancionada pelo Governo Federal no final do ano passado. O programa implementa um inovador mercado de créditos de carbono para o negócio e tem o mérito de não ser um imposto e sim um incentivo para que as empresas migrem para fontes limpas, gradativamente. Essa iniciativa será especialmente benéfica se a regulamentação, ainda a ser criada, for eficiente.
Mesmo no cenário adverso dos últimos anos, a Bunge e outras empresas do setor mantiveram seus investimentos em inovação, obtendo resultados significativos com iniciativas de mecanização e introdução de novas tecnologias no campo – utilização de GPS, drones, gestão de frotas e uso de informações coletadas por satélite, conservação e sistematização do preparo de solos. Na indústria, também registramos avanços de automação, introdução de novas cepas de leveduras, sistemas on-line de informação de produção, entre muitos outros. Ações que aumentam a rentabilidade e resiliência do negócio.
Nossas perspectivas otimistas para o futuro da produção de etanol não podem nos deixar esquecer de que o caminho a percorrer ainda é longo. Teremos um período de definição de metas de descarbonização e de regulamentação de lei. Essa regulamentação, se mal-feita, pode impactar negativamente toda a iniciativa. Portanto precisaremos estar atentos para garantir a sustentabilidade do País e de nossos negócios. Já no mercado internacional, as novas tecnologias e padrões irão se estabelecer ao longo dos próximos anos, e devemos nos apresentar como mais uma fonte viável, eficiente e sustentável para a nova matriz energética.
Reitero o nosso compromisso de continuar investindo para aumentar a eficiência do setor no Brasil. Sem dúvida, a produção de etanol, com uma plataforma nacional, tem contribuído há anos para a redução do consumo de combustíveis fósseis, além de ter impulsionado o desenvolvimento econômico e social no País, por meio da geração de empregos e da abertura de novas oportunidades de negócios.