Superintendente Administrativo do Grupo Açúcar Guarani
Op-AA-08
Produzir energia sempre foi o grande foco do setor sucroalcooleiro, no entanto, ainda somos conhecidos, por boa parte da sociedade, como produtores de açúcar, ou ainda, usineiros, uma herança dos livros de história, que nada tem a ver com a nossa realidade.
O desenvolvimento de pesquisas e altas tecnologias permitiu que chegássemos a um nível de competitividade, que acabou por despertar, em várias partes do mundo, uma curiosidade sobre o que fizemos para ter sucesso na utilização, em grande escala, de energia alternativa de fonte renovável, tema que vem sendo exaustivamente explorado e discutido, servindo de referência para grupos interessados em programas ou ações de crescimento, a longo prazo, com sustentabilidade.
Ter o domínio da energia significava, num passado não muito longínquo, ter poder. Hoje sabemos que a energia é um bem de extrema necessidade e, em muitas situações, motivo para disputas, que podem causar ganhos ou perdas. A safra de 2005/2006 trouxe à tona uma série de discussões em torno do planejamento da produção em relação à demanda, tanto do açúcar, quanto do álcool, e acabou envolvendo toda a sociedade brasileira, chegando ao ponto de se tornar tão polêmica, que as autoridades governamentais resolveram convocar nossas lideranças na tentativa de equacionar a questão.
O setor já foi totalmente controlado, na época do já extinto IAA. Quando houve a desregulamentação, passamos por uma longa e forte crise. Não estávamos preparados para atuar diretamente no mercado e, com muita persistência, aprendemos que o livre mercado é muito mais forte e saudável que qualquer controle imposto por regras ou decretos. Hoje o setor está em perfeita sintonia e interatividade com as leis naturais de mercado, porém, há sempre uma fase por vir e é necessário se adequar, para não ser atropelado.
Com o programa do álcool combustível, o Brasil evoluiu substancialmente no desenvolvimento da tecnologia de motores, consolidando-se, nos últimos três anos, com a disponibilização dos veículos bicombustíveis, que deverão se tornar, rapidamente, num padrão mundial.
Além disso, a sua inquestionável contribuição ao Protocolo de Kyoto, notadamente junto à Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças no Clima, United Nation Framework Convention for Climate Change - UNFCCC, com as Certificações obtidas por várias Usinas para a emissão do Clean Development Mechanism (CDM) ou Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e a comercialização dos mesmos, chamados de Créditos de Carbono, são provas incontestes dos benefícios que a utilização do álcool como alternativa, em relação aos combustíveis de fontes fósseis, trazem ao Meio Ambiente, assim como a energia elétrica gerada através da biomassa do bagaço da cana.
O tema em debate refere-se à estruturação do estoque estratégico de álcool e o breve histórico acima tem tudo a ver com este assunto, a começar pela sazonalidade da atividade. O setor trabalha durante 8 meses do ano, 24 horas por dia, para processar a cana e produzir o açúcar e o álcool. É nesta época que necessita, intensivamente, de recursos financeiros para suportar os custos de uma produção, que será comercializada em 12 meses, tendo que recorrer a financiamentos junto ao mercado.
O Brasil possui a maior taxa de juros do mundo, totalmente incompatível com as atividades industriais e agroindustriais, sobrecarregando os custos do estoque, formado para atender os 4 meses restantes, na conclusão do ano-safra. Houve uma época em que a Petrobrás adquiria antecipadamente parte da safra de álcool para exercer o papel de reguladora da distribuição, sistema que ficou superado por várias razões de ordem operacionais.
A mobilização em torno do tema acentuou-se nesta última entressafra, pela elevação do preço do álcool nas bombas dos Postos. Muitas dúvidas e perguntas foram levantadas e viraram a bola da vez na mídia local, regional e nacional. Por que será que a demanda do álcool acelerou no segundo semestre do ano de 2005?
Exatamente em razão do preço estar defasado, e muitos proprietários de veículos a gasolina aproveitaram-se da ocasião para misturar mais álcool no seu tanque, o chamado rabo-de-galo, que não constava nas estatísticas de frotas existentes e tampouco nas estimativas de crescimento da frota de veículos a álcool e flexível.
Quando a safra do Centro-Sul já havia encerrado, os estoques existentes estavam mais justos que os esperados, e, naturalmente, a lei de mercado funcionou, ajustando e equilibrando a situação, pelo instrumento do preço. Outras medidas combinadas, como a redução da mistura do álcool anidro à gasolina, de 25% para 20%, foram paliativas, visto que a mistura anterior é muito mais benéfica que esta, e deverá ser recomposta o mais breve possível.
À primeira vista, parece simples discutir ou opinar sobre planejamento de produção e estoque, no entanto, trata-se de um assunto de altíssima complexidade, que envolve a sociedade como um todo, o poder público e o privado, além de uma visão de mercado internacional, que deve ser encarado com a mesma importância que o mercado doméstico.
Certamente, serão necessários vários fóruns de discussões, para reunir um conjunto de conhecimentos suficientes para suportar a tomada de decisões e a criação de instrumentos e ferramentas, que tragam o equilíbrio e estabeleçam melhorias neste programa de utilização de energia alternativa, que já ostenta a grife de Excelência Brasileira.