Consultora de Relações Internacionais
Op-AA-10
O setor sucroalcooleiro no Brasil vem passando por visíveis transformações, principalmente aos olhos dos que, por anos, pensavam estar banidos do nosso país (e até do interesse do mundo): a produção de etanol e o seu uso como combustível. Ambos, no entanto, estiveram presentes entre nós desde os anos 30, tendo sido fortemente estimulados, a partir de meados dos anos 70/início dos 80, pelo Programa Nacional do Álcool, em razão dos primeiros choques do petróleo.
E a atual revolução chega-nos, especialmente consubstanciada nas oportunidades que cada vez mais se abrem para o produto, tanto no mercado interno como no internacional. No caso do açúcar, conta-se, por enquanto, quase que apenas com o crescimento vegetativo da demanda mundial, da ordem de 2-3 milhões de toneladas/ano, dadas as dificuldades para que países em desenvolvimento consigam a abertura de novos mercados, a redução dos apoios domésticos em países desenvolvidos e a eliminação de qualquer forma de subsídios às exportações, por eles concedidos.
Não são outros os resultados que o nosso agronegócio espera da atual rodada de negociações multilaterais da Organização Mundial do Comércio: a Rodada de Doha, a pretendida Rodada do Desenvolvimento, suspensa. Em movimento recente, voltou-se a ver no Brasil investimentos na construção de fábricas - contando-se, hoje, pouco mais de cento e trinta unidades em projeto - com vistas a atender não apenas ao crescimento vegetativo do mercado de açúcar, mas também parte importante de uma esperada demanda adicional de álcool e, quem sabe, a mercados de açúcar que venham a ser liberados, tanto como resultado de negociações bilaterais, regionais ou multilaterais, como do de solução de eventuais controvérsias - como o recente contencioso ganho pelo Brasil, Austrália e Tailândia contra o regime açucareiro da União Européia é o melhor exemplo.
Ainda assim, é de se esperar que não cheguem a ser implantados alguns dos novos projetos, concebidos quando o mercado do açúcar via cotações de até 18 cents/lb, que não se sustentaram. No rastro do crescimento da oferta incentivada do etanol, veio a resposta da indústria automobilística nacional, que passou a oferecer veículos inteiramente movidos ao combustível hidratado, em percentuais que evoluíram dos 28,5% das vendas totais de veículos leves de passageiros em 1980, para 94,4% em 1987, quando atingiram o seu ápice.
No entanto, em 1988, as vendas passaram a declinar, até representarem apenas 0,1% em 1998, chegando a 3,74% em 2002, ou a 3,61% no mesmo ano, considerados os importados. Nos anos de sombra, de demanda decrescente para o álcool hidratado, a mistura combustível do etanol anidro com a gasolina automotiva, em percentuais que podem variar de 20% a 25%, obrigatória desde 1993, por razões de qualidade do meio ambiente, garantiu níveis de consumo que sustentaram, ademais de alguns casos de sucateamento, a indústria brasileira de etanol e, por via de conseqüência, em grande parte a de açúcar, por todo o resto da última década.
Característica dos países grandes produtores de açúcar é a de também terem grandes mercados internos. No caso do etanol combustível, os dois maiores produtores - Brasil e Estados Unidos - são, igualmente, grandes consumidores. E em ambos, os mercados internos têm grandes potenciais de crescimento, tanto quanto as produções locais.
No Brasil, em 2003 foram lançados os veículos leves bicombustível, cujas vendas no mercado interno resultaram, em 2005, em 50,2% dos licenciamentos de automóveis e comerciais leves, nacionais e importados. Até setembro deste ano, a participação atingia 76,8%. Paralelamente, os produtores pleiteiam agora, do Governo, que retorne dos atuais 20% para 25% o volume de álcool na mistura combustível com a gasolina.
Medidas dessa natureza representam importantes estímulos ao consumo do combustível de origem agrícola e, por via de conseqüência, à sua produção. Cresce, assim, a atratividade do nosso mercado interno. Não obstante, o mercado internacional permanece estratégico para a colocação dos excedentes da indústria nacional, que restam depois de assegurado o pleno atendimento da demanda brasileira.
Em 2005/06, o Brasil exportou 17,09 milhões de toneladas de açúcar e 2,48 milhões de m3 de etanol. As exportações de açúcar foram, em grande maioria, de produto bruto (11,4 milhões de toneladas), dadas as características do mercado, que, em parte significativa, o importa para uso como matéria-prima, em suas próprias refinarias.
Esse é o caso dos nossos maiores compradores: Rússia, Nigéria, Canadá, entre outros. Na mesma safra, o país exportou 2,48 milhões de m3 de álcool etílico, tendo os Estados Unidos, o Japão e a Índia, como os principais destinos. Na atual safra (2006/07), o país deverá ofertar 30,5 milhões de toneladas de açúcar e 17,5 milhões de m3 de álcool, obtidos pela moagem de 425 milhões de toneladas de cana. As exportações potenciais estão estimadas em 19,6 milhões de toneladas e 3 milhões de metros cúbicos, de açúcar e álcool, respectivamente.
A redução da oferta de açúcar pela União Européia em outros países, por obrigatoriedade da OMC, representa importante e real possibilidade de abertura de mercado para o nosso açúcar branco. Iniciativas externas firmes de uso de etanol como substituto do combustível fóssil têm sido crescentes, abrindo perspectivas de interesse para os nossos produtores, os mais competitivos em termos de custos de produção em escala. Tais possibilidades, certamente, estão consideradas pelos que agora trazem novos investimentos para o setor. Sempre lembrando que, a consistência de conduta ainda é o grande trunfo para quem parte em busca de novos horizontes no comércio internacional.