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Alexandre Aidar Junior

Diretor da BCD - Business & Commerce Development

Op-AA-29

O resgate dos fundamentos

Vivemos um grande desafio que demanda muita lucidez. Do ponto de vista do trading, os fundamentos da demanda são e continuarão positivos para todos os produtos. Na virada de 2008 para 2009, a população urbana superou a rural no planeta. Esse fato ocorre nos países em desenvolvimento que atravessam esse período de crise, sustentando taxas de crescimento médias 5 a 6 vezes maiores do que as do mundo desenvolvido.

Essas novas sociedades urbanas buscam uma rota de desenvolvimento aparente ditada por padrões de consumo norte-americano, exaustivamente propagado como modelo de sucesso pela indústria do cinema, televisão e internet nos últimos 60 anos.

Obviamente temos ajustes culturais locais, mas é só andarmos pelas grandes cidades da China, Índia, Rússia, Brasil, África do Sul, Malásia, Indonésia, para identificarmos essas assinaturas: alimentos cada vez mais industrializados e distribuídos em crescentes redes de varejo, demanda de eletricidade e combustíveis líquidos fortemente pressionados. O planejamento de obras de infraestrutura desses países também contempla esse modelo.

Esse fato é altamente positivo, tanto para o açúcar – que continua sendo o energético alimentício mais barato –, como para o etanol – a melhor resposta verde conhecida na área dos combustíveis líquidos. Sem falar na eletricidade local para suportar a tendência de crescimento do nosso Brasil.

Modelos de tendência do Mercado de Açúcar Mundial mostram crescimentos vegetativos da ordem de 2,1 a 2,3% ao ano, superando os antigos 1,8 a 2% em função desse deslocamento de eixo econômico. Isso nos levaria a uma demanda mundial aproximada de cerca de 210 milhões de toneladas de açúcar em 2020 contra os 170 atuais.

No mercado interno de etanol, se o Brasil crescer 3% ao ano, e seguindo o modelo tributário atual, em 2020, poderemos enfrentar uma demanda de cerca de 60 bilhões de litros, perto do dobro da atual. Números promissores, não? Teoricamente, há espaço de mercado para dobrarmos em 10 anos. Então, onde está o problema? Por que nosso canavial vem diminuindo ao invés de aumentar? Parecia tão óbvio, tão fácil – era só arrumarmos dinheiro, que a coisa toda cresceria no “automático”! O que houve?

Estamos em um daqueles momentos de inflexão em que precisamos de muita serenidade. Temos que rever nossos modelos e entendermos muito bem o passado para aprendermos o cuidado que devemos ter com essas projeções. Os potenciais existem, mas as velocidades de crescimento podem não corresponder às desejadas.

E, principalmente, não podemos mais perder o foco na importância dos fundamentos reais do agronegócio: produtividade, qualidade, tecnologia, custos, conhecimento dos mercados, logística, clima e experiência. Estamos colhendo as consequências graves de um período de uma euforia insana, ditada pela liquidez farta oriunda de uma emissão sem precedentes de dólares para financiar o rombo das contas americanas.

Surgiram, então, modelos financeiros atrativos de alta agregação aparente de valor, nos quais os fundamentos mais básicos de qualquer mercado pareciam tornar-se irrelevantes. Só que quem não se esqueceu deles sobreviveu e até agregou algum valor. Os demais plantaram um lucro virtual e colheram um prejuízo real.

A retomada da realidade estancou o crescimento projetado do setor e acelerou novas consolidações em detrimento das expansões em curso. Sentimos agora a realidade mais séria da crise financeira, que é a busca de um novo equilíbrio monetário entre as nações produtivas, enquanto o eixo econômico relativo se desloca com velocidade variável.

Coisa para modelarmos em supercomputadores astrofísicos! A sensação atual é de um grande calote nas reservas internacionais de muitos desses países pela desvalorização do dólar.

Explosões de consumo (Brasil incluído) se dão mais pelo endividamento caro (bomba relógio) do que pela conquista real de riqueza. Esse modelo, além de inflacionário, guarda resquícios das “bolhas” que podem gerar crises internas – dores do crescimento ainda sem lastro. O ritmo atual poderá ser comprometido.

Na prática, nosso custo de produção não para de subir (perdemos competitividade), e o clima vem mostrando por que não pode ser desprezado. Nossa infraestrutura de base novamente se afunila em grandes gargalos. Custos logísticos estão abusivos. Hora de ajustarmos nosso modelo, melhorarmos nossa produtividade via tecnologia, priorizarmos a solução da infraestrutura básica, não supérflua, e expandirmos nossa produção com solidez.

Só assim ajustaremos nossa oferta a esses potenciais de demanda de forma mais coerente e possível – devagar e sempre.
Desequilíbrios pontuais se resolvem por importações, paradoxalmente favorecidas pelos mesmos fatores.

Pura arbitragem. Sem traumas. Fizemos isso nos anos 90. O setor é uma parceria de sucesso entre todos os seus players, da produção de cana ao consumidor e ao governo. Há que se reconstruir, finalmente, um modelo tributário mais condizente com a nova escala produtiva do País, desonerando a produção e o consumo. O “Custo Brasil” tem que baixar. Ação conjunta. Mas cada um focado na sua parte.