Presidente da ETH BioEnergia - Grupo Odebrecht
Op-AA-30
Procurei fazer um exercício um pouco diferente: revisitar aquelas questões fundamentais que nós avaliamos lá atrás, quando a Odebrecht tomou a decisão de entrar no setor e verificar se tais condições ainda continuavam válidas hoje. Quero antecipar a resposta, antes de discorrer sobre elas, e dizer que todas as questões fundamentais e estruturantes continuam absolutamente válidas e mais, que elas estão ainda mais claras e evidentes do que naquela época, quando fizemos a avaliação. Vamos a elas.
Existe uma grande pressão internacional por segurança energética e pela busca da descarbonização da economia. O custo de petróleo continua crescendo, a dificuldade para encontrar novas reservas se confirma, os recentes eventos políticos nos países árabes fazem o petróleo aumentar a volatilidade e a imprevisibilidade de preço, a discussão sobre a redução de emissão de CO2 e das mudanças climáticas continua.
O segundo ponto a enfatizar é o mercado brasileiro. Todo setor que tem o mercado desse tamanho, com essa taxa de crescimento, com essa previsão de futuro e ainda com a perspectiva de abertura de mercados internacionais não pode ser ignorado por nenhuma estratégia de empresas locais ou internacionais. Não é por acaso que muitas empresas novas estão chegando com muito apetite, dispostas a colocar muito dinheiro no negócio.
Uma questão importante na redução dos custos de produção de etanol e de açúcar é a cogeração de energia elétrica utilizando o bagaço de cana. Todas as unidades da ETH estão integradas nesse processo. A capacidade de geração de caixa dessa atividade modifica essencialmente a competitividade do açúcar e do etanol. Existem ainda algumas coisas muito relevantes pela frente.
Primeiro, a competitividade do etanol vis-à-vis ao petróleo, em todos os cenários que avaliamos e atualizamos com frequência. Podemos discutir a velocidade e o patamar, mas todas as análises levam ao aumento importante do custo de petróleo, ao passo que, em todas as análises dos produtos da cana-de-açúcar, temos uma perspectiva de curva declinante, por questão de ruptura na área tecnológica, por melhoria da produtividade com as canas transgênicas e outras variedades, através de processos fermentativos mais sofisticados que, certamente, vão mudar a economia e a rentabilidade desse negócio.
Estamos em um setor em transformação, em consolidação, na busca da excelência operacional, tanto nas atividades agricolas como nas industriais, na busca do ganho de escala, com claras e otimistas tendências. Temos condições fenomenais para acreditar e investir no setor. O mercado brasileiro dobrou de tamanho nos últimos cinco anos e tem potencial para dobrar de tamanho novamente nos próximos cinco.
Tudo vai depender da nossa capacidade de produzir esse etanol. Com relação ao mercado externo, temos agora uma possibilidade concreta de abertura dos mercados internacionais. O americano, já no curto prazo; o europeu vai demorar um pouco; os asiáticos – Japão e China – começam a dar demonstrações claras de que vão integrar o etanol em suas matrizes de combustíveis líquidos.
Outro ponto importante é a questão da energia elétrica. O governo mostra uma estimativa de crescimento da demanda de energia elétrica no Brasil, e investimentos terão que ser feitos para fornecer essa energia. Fato é que o Brasil vai crescer de 500 TWh/ano para quase 900 nos próximos 10 anos.
Desses, 200 já foram contratados com projetos hídrico, nuclear, eólico, térmico, energia de reserva, mas temos ainda 200 TWh/ano de necessidade não contratada. Evidentemente, gostaríamos que a biomassa tivesse um tratamento diferenciado, o que não deve acontecer no curto prazo. Tivemos uma grande frustração no último leilão. Esperávamos um preço na casa dos R$ 140 por MWh e tivemos apenas R$ 103, para quem teve a ousadia de vender nesse preço.
Mas vimos venda de energia eólica a R$ 99/MGh em condições rentáveis e competitivas. Isso é um fato: o setor da eólica está sendo mais competente do que nós para reduzir custo de investimento e encontrar formas mais atrativas de financiamento.
Existe um terreno importante que não exploramos ainda, que é a expansão internacional. O tema central desse fórum é a inserção do etanol na matriz energética global, e eu estou absolutamente convencido de que, sem a internacionalização das bases de produção, na África e na América Latina, teremos grande dificuldade de convencer a maior parte dos países do mundo a inserir o etanol de maneira estruturada nas suas matrizes energéticas.
A mudança da estrutura da matriz energética de um país é uma atitude de imenso risco político. É um trabalho de longo prazo, que exige uma coordenação eficiente. Na América Latina, a ETH já está trabalhando na Colômbia e analisando oportunidades no México. Na África, existe um potencial enorme de transformação, já estamos trabalhando em Angola e Moçambique – que têm um potencial agrícola importantíssimo. Temos que investir de maneira estratégica e estruturada nos mercados internacionais.
Quanto à expansão da capacidade de produção, temos a necessidade de investimento da ordem de R$ 80 bilhões, aumento da área plantada em mais 4,5 milhões de hectares, para que possamos produzir mais 400 milhões de toneladas de cana. Os investimentos terão que ser feito de maneira responsável, com uma estrutura de capital sólido o suficiente para que não tenhamos soluços de fragilidades.
Se considerarmos uma estrutura de 40% de capital próprio, 60% de dívida, significa que vamos ter que disponibilizar caixa da ordem de R$ 30 bilhões nos próximos sete anos e encontrar linhas de financiamento da ordem de R$ 50 bilhões para viabilizar esse plano.
É ousado, mas fizemos isso no passado, não perdemos a receita e podemos fazer de novo.
Com relação à competitividade, o que aprendi é que, quando o preço de venda não pode subir, os custos têm que baixar. Trabalhamos dia e noite para reduzir nossos custos. Ainda que a política de precificação da gasolina no mercado interno seja irracional, ela é real, e temos que conviver com isso. Temos que encontrar mecanismos diferentes para melhorar a nossa competitividade. Não podemos ter retrocesso. Precisamos combinar competitividade de custo com alta sustentabilidade.
No que diz respeito à mão de obra, estamos batendo no limite da capacidade de formação e de preparação de gente para acompanhar esse processo de crescimento. Todas as empresas que têm procurado crescer têm tido dificuldade de encontrar pessoal qualificado; preparado, então, nem se fala.
Quero ter a ousadia, com todo risco que isso representa, de falar sobre a minha visão de nossa Agenda Estratégica. O primeiro ponto é que precisamos resgatar o papel da bioenergia, do etanol, da energia elétrica da biomassa e do açúcar dentro da política estratégica brasileira. Se não estiver claro para quem faz política pública que isso está no coração da agenda política estratégica nacional, todas as discussões serão frustradas.
Acho que perdemos e estamos com dificuldade de reencontrar uma interlocução no nível do que representa a oportunidade do setor da agroenergia para o Brasil e a inserção do Brasil em regiões como África e América Latina e, no segundo momento, nos países desenvolvidos.
O segundo ponto tem a ver com a plataforma competitiva de tecnologia e de inovação. Há, nesse momento, uma crise de identidade dentro dos desenvolvedores de tecnologia no Brasil. O CTC passa por um momento de introspecção e de reflexão estratégica, mas certamente vai voltar a ser a locomotiva de pesquisa e desenvolvimento do Brasil.
O fato é que os americanos e os europeus têm avançado em uma velocidade maior, e temos perdido o papel de liderança que sempre tivemos na questão da agricultura da cana e do desenvolvimento de processos fermentativos.
É necessário dar maior atenção a um programa estruturado nacional e setorialmente para a formação de pessoas na quantidade e na qualidade necessárias. Temos tido dificuldade para encontrar pessoal, treiná-lo, inseri-lo no mercado de trabalho e retê-lo, porque o mercado está extremamente aquecido, e, sem profissional competente, é impossível conseguir se destacar e se diferenciar.
Também é preciso assegurar a crescente competitividade da indústria nacional de bens de capital. Esse é um dos poucos setores que dominam todo o ciclo do negócio, e acho que o governo e o BNDES devem se fazer presentes no reforço da estrutura de capital, porque o setor vai precisar tê-los como aliados importantes nessa questão.
Temos que voltar a ser competitivos na questão do investimento, que, por tonelada de cana, já chega a US$ 150, 50% mais caro do que há 4 anos. Alguma coisa está fundamentalmente errada e vai ser uma trava para o crescimento. Concluo observando que, apesar do potencial interno, apesar das dificuldades, temos que continuar trabalhando de maneira quase obsessiva para a abertura dos mercados internacionais.
Não podemos pensar no etanol como produto global, sem convencer o mundo de que ele é um produto com grande contribuição econômica, social e ambiental, e que o Brasil vai ser, seguramente, um país produtor e exportador. Que Deus nos ajude e que nos dê boas ideias.