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Cláudio Mariano Vaz

Diretor da Engenho Novo Tecnologia

Op-AA-27

Água versus efluente

Não obstante os esforços atualmente empreendidos, a indústria de açúcar e álcool ainda carrega consigo o estigma de grande poluidora e consumidora de água. Em grande parte, isso se deve às próprias especificidades da matéria-prima (grande quantidade de impurezas e de água agregada à cana) e de seu processo (grande necessidade de troca térmica de refrigeração).

Com essas desvantagens naturais e frente às crescentes exigências ambientais, o setor precisa investir rapidamente no desenvolvimento e adaptação de tecnologias de conservação que sejam específicas para as suas condições e, dessa forma, manter-se em sintonia com os demais setores fabris.

A racionalização do consumo de águas deve, obrigatoriamente, considerar os aspectos técnico-econômicos relativos ao tratamento dos efluentes aquosos gerados fechando, dessa forma, o balanço hídrico da indústria (entradas e saídas). Desse balanço depende muito a viabilidade das alternativas disponíveis.

Na busca de soluções mais apropriadas, deve-se ter em mente que a redução do consumo de água nova permite, além da redução dos custos de captação, uma redução nos custos necessários para o enquadramento dos efluentes lançados – reduzindo-se o volume –, reduzindo-se a capacidade de tratamento. Nessa busca, devem ser consideradas em conjunto três metodologias principais:

1. redução do desperdício de água, considerando-se o processo corrente;
2. redução do consumo de água mediante modificações no processo;
3. tratamento e reúso dos efluentes tratados.

Das três metodologias, a primeira é a mais barata e de resultados mais imediatos, devendo ser priorizada. Contra a sua implementação, no entanto, existe a resistência cultural e natural do ser humano, o que demanda um grande esforço de conscientização. A segunda metodologia é, em geral, de custo elevado, e, por isso, sua viabilização depende de oportunidades especiais, como ganhos extras à própria economia, obtida diretamente com a redução da água.

Complementarmente, por levar a alterações no processo, essa metodologia pode interferir nas demais etapas de produção e requerer adaptações complicadas. Por exemplo: a limpeza da cana a seco introduziu grande quantidade de terra e areia no processo, prejudicando desde o tratamento do caldo até o tratamento da água de lavagem dos gases das caldeiras (final da linha).

Na terceira metodologia, é necessário contar com uma etapa de tratamento adicional, a fim de se compatibilizar a qualidade do efluente a ser reusado com a qualidade requerida para o seu reúso. Enquanto as duas metodologias anteriores reduzem a quantidade de água nova alimentada à planta e, consequentemente, a quantidade de efluente gerado, na terceira metodologia o reúso permite ainda que se utilize uma grande vazão de água em circuito fechado – o que é muito conveniente para algumas etapas do processo.

Como exemplo, as novas Estações de Tratamento de Água de Lavagem de Gases de Caldeira (Fuligem) permitem o contínuo reciclo de mais de um milhão de litros/hora, com reposição de apenas 2 a 5% da água perdida na fumaça e junto aos sólidos descartados. A introdução dessa tecnologia propiciou ao setor uma das reduções mais significativas no consumo de águas e na poluição ambiental (nas caldeiras de bagaço são produzidos de 5 a 10 kg de matéria seca/tonelada de vapor gerado, que antes eram lançados no ar ou nos rios).

Para o balizamento de estudos visando à racionalização do balanço de águas e efluentes, algumas considerações gerais podem ser feitas:

1. para facilitar seu tratamento e reúso, os efluentes devem ser segregados conforme o tipo e o grau de contaminação, separando-se águas oleosas, águas açucaradas, águas de fuligem e águas de refrigeração. Por exemplo: águas oleosas dificultam significativamente processos de tratamento biológico, enquanto podem ser facilmente tratadas por flotação,o que permite, inclusive, o seu reúso. Ainda, açúcares residuais nas águas de lavagem de gases propiciam a queda do pH e a fermentação do meio, com geração de efluentes incompatíveis com o processo de decantação de fuligem.

2. a intensidade do tratamento necessária para o reúso do efluente em sua própria aplicação de origem é, geralmente, inferior à necessária para o seu descarte, reduzindo, dessa forma, o custo total de tratamento.

3. efluentes açucarados correspondem, geralmente, a grandes vazões com baixa concentração de açúcares, condições incompatíveis com as técnicas modernas e compactas de tratamento biológico. Complementarmente, a etapa biológica deve ser precedida por um tratamento para remoção de sólidos  – necessário também para evitar assoreamento.

Uma alternativa interessante para esse caso consiste na clarificação e reúso de parte dos efluentes açucarados em lavagens em geral, com consequente redução do volume final a ser descartado e aumento da concentração dos açúcares residuais, tornando-o mais compatível com a etapa biológica posterior.

O enquadramento do setor de açúcar, álcool e bioeletricidade às normas ambientais requer um re-estudo dos conceitos fabris à luz das novas tecnologias de tratamento e de reúso de efluentes já disponíveis no mercado. Projetos de expansão da produção e a implantação de novas unidades industriais constituem excelentes oportunidades para compatibilizar o setor com os conceitos mais modernos de integração indústria-meio ambiente.