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Hélvio Neves Guerra

Superintendente de Concessões e Geração da ANEEL

Op-AA-15

Cana-de-açúcar: opção energética e maior competitividade na geração de energia

Colaboração: Alessandro Henrique da Silva

Dentre as fontes energéticas consideradas como biomassa, o bagaço de cana-de-açúcar tem demonstrado um grande potencial como fonte renovável de energia e com participação superior a 74%, em comparação com outros produtos que geram energia a partir da combustão de material orgânico, como a palha de arroz. O bagaço ainda tem a seu favor o fato de ser resíduo de um produto amplamente utilizado no país: a cana-de-açúcar, que se transforma em álcool e açúcar.

O custo da produção também passa a ser favorável, quando comparado, por exemplo, ao óleo diesel, fonte altamente poluidora e não-renovável. Há várias projeções sobre o potencial de geração de eletricidade a partir de bagaço e uma delas aponta que há condições de agregar, imediatamente, ao parque gerador nacional, cerca de 4.000 MW.

Isso com a utilização apenas das instalações atualmente existentes nas usinas de açúcar e álcool, sem exigir investimentos significativos. E esse número pode elevar-se a mais de 9.000 MW, caso elas sejam modernizadas. A realidade mostra que o potencial de geração de energia, via bagaço, permanece latente e como uma receptiva e bem-vinda promessa de que possa representar uma alternativa importante para a diversificação da matriz energética nacional.

E com a qualidade fundamental ao desenvolvimento sustentável: é renovável e reduz a quantidade de resíduo descartado pela maioria das usinas de álcool e açúcar. Entretanto, tal potencial não se materializa em MW à disposição do Sistema Interligado Nacional. Nos últimos três anos, foram outorgadas concessões para 27 novas usinas geradoras, que utilizam o bagaço de cana-de-açúcar. Essas usinas adicionaram cerca de 348 MW ao parque gerador – o que representa pouco mais de 116 MW ao ano.

A participação do estado de São Paulo nesse crescimento correspondeu a aproximadamente 60% do total. O restante ficou dividido entre os estados de Goiás (11 %), Alagoas (10 %), Paraná (9 %), Minas Gerais (7 %), Pernambuco (2 %) e Mato Grosso do Sul (1 %). Ao longo do ano de 2007, foram três as oportunidades que esse potencial viabilizou: o leilão de fontes alternativas, o leilão A-3 e o leilão A-5.

A tabela em destaque apresenta, apenas para essa fonte, o potencial habilitado pela Empresa de Pesquisa Energética - EPE, e passível de ser instalado, desde que haja a comercialização nos leilões. Entretanto, o resultado está longe de provocar entusiasmo. Algumas razões poderiam ser consideradas para o insucesso da biomassa. Para isso, é necessário esclarecer que a regulação do setor elétrico considera ser atribuição do próprio agente de geração a construção, operação e manutenção da interligação da central geradora ao ponto de conexão com a rede de distribuição ou de transmissão.

Primeira razão: a vocação dos empreendedores, já que o core business do setor é a produção de açúcar e álcool e não a geração de eletricidade.

Segunda: a distância entre o ponto gerador e a rede elétrica. Embora haja alocação de risco apropriadamente, esse fato traz certa distorção, no caso particular das usinas de açúcar e álcool. Em alguns casos, essa distância é o fator determinante na decisão de instalar ou ampliar centrais geradoras.

Ela torna o investimento pouco atraente, e até mesmo a geração desvantajosa – ao menos para o mercado regulado – quando compete com as fontes que, embora com custos de geração mais elevados, têm maior flexibilidade de escolha do local para suas instalações e, assim, menor custo de escoamento. A variável distância da rede não é, no caso das usinas de açúcar e álcool, gerenciável pelo empreendedor, uma vez que as centrais de geração elétrica precisam estar próximas do local de produção do bagaço, sob risco de se tornarem menos competitivas ainda.

Não é por outra razão que a participação das usinas localizadas no estado de São Paulo, na oferta de energia oriunda desse tipo de central, é maior que nos demais. Isso decorre da existência de infra-estrutura de rede melhor consolidada naquele estado.

Entre gerar energia elétrica, com a obrigação de assumir a operação e manutenção de longos trechos de linhas de transmissão, ou manter o foco no atraente retorno do negócio principal, a decisão tende a recair sobre a segunda alternativa. Os fatos têm comprovado esse efeito. Atenta a isso, a regulação do setor elétrico tem procurado cumprir sua função de simular um mercado que se aproxime da perfeita competitividade, formulando instrumentos regulatórios mais adequados.

Como exemplo, temos: formular a regulamentação que reduziu as Tarifas de Uso de Sistemas de Transmissão - TUST, e Distribuição - TUSD, para essa fonte, que as liberou de investimentos em programas de Pesquisa e Desenvolvimento, e na regulamentação de programas como o Proinfa; embora tais medidas ainda não tenham sido suficientes para atrair os investimentos necessários para viabilizar o aproveitamento desse potencial.

Diante da evidência de que a distância da rede elétrica impede que a geração a bagaço de cana-de-açúcar torne-se competitiva, essa restrição deve ser retirada. Como não é possível aproximar a usina da rede elétrica, que se aproxime a rede da usina. Atualmente, está em discussão norma proposta pela Aneel, visando afastar essa restrição à competição, por meio da construção de instalações coletoras, localizadas em um ponto intermediário entre as usinas e a rede elétrica.

O local dessas coletoras deverá ser estrategicamente escolhido, de tal sorte que facilitem o escoamento da energia gerada. A expectativa é que, inicialmente em Goiás e no Mato Grosso do Sul, o potencial disponível seja, finalmente, materializado em kWh injetados nas redes de distribuição e transmissão. Não obstante, é sempre prudente lembrar que a norma proposta pela Aneel possibilitará que se materialize a geração de eletricidade, a partir do bagaço de cana-de-açúcar, com adequada alocação de risco entre geradores e consumidores.