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Ivan Chaves de Sousa

Diretor da Chaves Planejamento e Consultoria

Op-AA-44

É tempo de reagir

Neste nobre espaço, nos proporemos a examinar algumas estatísticas, buscando resposta a uma indagação: a crise pela qual passa o setor agroindustrial canavieiro é real? Tal crise estaria assentada em fatos bem fundamentados? Ou seria apenas fruto do pessimismo que assola o País na atual conjuntura? Cremos que um exame de custos e de preços vivenciados pelo setor poderá nos trazer algumas luzes na busca de resposta a essas indagações.

Concentraremos nossas análises na produção canavieira, em consonância com a pauta definida na edição e o artigo solicitado pelo editor-chefe da Revista Opiniões. Apreciaremos, incialmente, algumas informações sobre os preços percebidos por esse segmento. Trabalho facilitado, porquanto nosso setor é extremamente organizado. Sim, o sistema Consecana atrela, inteligentemente, o preço a ser pago à tonelada de cana produzida à remuneração percebida pelas agroindústrias na venda de seus produtos finais, açúcar e etanol, derivando daí o valor do kg de ATR médio ponderado.

Dispondo-se desse valor, basta considerar o teor de ATR contido naquela matéria-prima industrializada para se chegar ao valor da tonelada de cana. Em São Paulo, por exemplo, consultando as circulares Consecana 1712, 1813 e 1714, podemos constatar que os preços médios do kg de ATR de fechamento dos últimos três anos-safras (2012/13, 2013/14 e 2014/15) foram, respectivamente, iguais a R$ 0,4728, R$ 0,4572 e 0,4763. E, assim, surge a primeira constatação: foram três períodos consecutivos de preços decepcionantes. Por que decepcionantes?

Segundo nossas pesquisas, que realizamos com o apoio de quatro dezenas de usinas localizadas na região Centro-Sudeste, observamos que os teores de ATR, demonstrados em kg por tonelada de cana, encontrados em suas produções de cana própria, se situaram nos patamares de 134,22 kg (safra 2012/13), 131,60 kg (safra 2013/14) e 132,71 kg (safra 2014/15). Importante destacar: a cana adquirida de terceiros não mostrou algo muito diferente quanto a esses números.

Daí concluímos, facilmente, que o valor da tonelada de cana própria (se fosse objeto de venda) teria correspondido a R$ 63,46 em 2012/13, R$ 60,17 em 2013/14 e, finalmente, R$ 63,21 no último ano-safra (2014/15). Preços muito aquém do desejável, ratificando nossa afirmação anterior. Alguém duvida dessa nossa afirmativa (que os preços estão baixos)? Então, este é o momento adequado para redirecionarmos o nosso foco, passando agora ao exame dos custos de produção, ressaltando que as nossas citadas pesquisas centram-se, primordialmente, nesses indicadores.


Tomemos os dados apurados no último ano-safra e vamos examiná-los de forma estratificada: isolaremos os resultados médios de um grupo de 25 usinas localizadas no estado de São Paulo e os de um segundo grupo de 18 usinas situadas em outros estados da região Centro-Sudeste (GO, MG, MS e PR).

Encontramos, para as usinas paulistas pesquisadas por nós, um custo de formação dos canaviais equivalente a R$ 6.982,00/hectare, ao passo que, nos demais estados, esse custo correspondeu, em média, a R$ 7.328,00/hectare, este, portanto, algo mais oneroso.

No referente aos tratos culturais de soqueiras, os custos médios dos dois estratos se apresentaram muito próximos entre si: R$ 1.562,00/hectare em SP e R$ 1.638,00/hectare nos demais estados pesquisados. Quanto à colheita e ao transporte, hoje predominantemente do tipo mecanizado, novamente o par de valores situou-se quase no mesmo patamar de custo: R$ 31,10/tonelada para SP e R$ 31,71/tonelada como média dos demais estados.

Finalmente, temos que acrescentar o custo do fator terra, item no qual os demais estados demonstram nítida vantagem sobre a produção paulista: R$ 790,00 por hectare/ano, enquanto, em SP, tal custo correspondeu a R$ 1.128,00 por hectare/ano. Considerando a vida útil dos canaviais de ambas as regiões como equivalente a cinco cortes para fins de cálculo do custo relativo à depreciação derivada do investimento correspondente à formação dessas lavouras e tomando as áreas e as produtividades dos canaviais exatamente como encontradas em situação real de campo – posição 2014/15 –, calculamos o custo unitário para cada estrato.

Antecipamos que há uma variável que afetou drasticamente os resultados de custos da produção paulista nesta safra 2014/15: baixíssima produtividade (apenas 71,0 t/ha-corte) causada pelo severo déficit hídrico que afetou as suas lavouras ao longo de 2014. Essas 25 usinas demonstraram uma quebra de 13% de produtividade em relação ao apurado em 2013/14, donde seu custo unitário final ficou num patamar que poderíamos considerar inadmissível: R$ 84,79 por tonelada.

Nos demais estados, a produtividade média (ressalte-se “média” porque a região é vasta, com várias peculiaridades) não sofreu tanto como em SP, e seu índice resultou igual a 77,2 t/ha-corte. São números melhores que os paulistas, mas também longe de serem considerados adequados. Tanto é fato que o custo de produção unitário final desse estrato, utilizando os mesmos procedimentos metodológicos, resultou em R$ 78,55/tonelada.

Seria recomendável, agora, elaborarmos uma síntese dessas estatísticas, a fim de que o leitor possa visualizar bem o desbalanceamento entre custos e preços citados. Em São Paulo, por exemplo, numa suposição de que essas usinas estivessem vendendo a sua produção de cana própria, receberiam um preço equivalente a R$ 63,64/tonelada (seu teor de ART equivaleu a 133,62 kg/tc), enquanto seu custo médio, segundo nossos cálculos, correspondeu aos citados R$ 84,79/tonelada. Resultado negativo correspondente a R$ 21,15 por tonelada produzida, algo como 33% daquele preço.

Decepcionante, para dizer o mínimo. Nos demais estados, embora menos acentuada, a distância entre preço e custo unitário também assusta o analista. Para um preço próximo a R$ 63,00/tonelada (teor de ATR igual a 131,45 kg/tc), o custo resultou nos já comentados R$ 78,55/tonelada. Portanto resultado negativo superando os R$ 15,00 por tonelada, ou cerca de 24% daquele preço unitário. Teria sido o clima adverso de 2014/15 o fator preponderante para explicar tais números tão decepcionantes?

Infelizmente, não. Um exame dos resultados proporcionados por nossa mesma linha de estudos, dessa feita com referência à safra anterior, 2013/14, demonstrou cenário não muito diferente, infelizmente. Vejamos os números básicos daquele período anterior. Tomando a região Centro-Sudeste como um todo, qual foi a produtividade agrícola naquela safra? Encontramos uma média modesta, equivalente a tão somente 75,6 toneladas por ha-corte. E o teor de ATR? Não alcançou 132 kg/t cana (apenas 131,60 kg/t cana, para ser mais exato). Custo de produção? Apuramos como igual a R$ 75,50 por tonelada de cana.

Se tomássemos por base o preço Consecana-SP daquele ano-safra (R$ 0,4572/kg ATR) e considerando esse teor de ATR, a cana dessas usinas da região Centro-Sudeste, em média, seria valorizada à razão de tão somente R$ 60,17 por tonelada. Ou seja, novamente um resultado negativo correspondente a mais de R$ 15,00 por tonelada. Em suma, com números tão adversos, absolutamente não há tempo a perder se, realmente, nossa agroindústria canavieira quer reagir e sobreviver a estes tempos difíceis.

Ações a tomar? Várias são as frentes de trabalho: empreender o máximo dos esforços para retornar aos bons e indispensáveis níveis de produtividade e maturação de seus canaviais; buscar inteligentemente redução de custos de suas várias etapas operacionais, mas cuidando para não acarretar prejuízos para a produtividade; alocar os seus fatores de produção, perseguindo sempre máxima eficiência; aumentar o faturamento da empresa, aproveitando a palha dos campos recém-colhidos para mais cogeração e exportação de energia; e outras nessa linha de fortalecimento da empresa.  O tempo urge, portanto. Mãos à obra, eis que a situação exige, com urgência, muito trabalho, dedicação, perseverança, criatividade... e torcendo para que nossas autoridades federais não nos atrapalhem.