As mudanças climáticas configuram-se como um dos maiores desafios para produção agrícola ao longo do século XXI. Essas alterações nas condições de tempo e clima já estão apresentando severos impactos na segurança alimentar, nos desastres naturais e na sustentabilidade da agricultura. Nesse contexto, a comunidade científica mundial vem realizando contínuos esforços voltados à mitigação e ao combate desse fenômeno adverso.
Um ponto fundamental dessas ações é a descrição histórica das condições (agro)meteorológicas observadas em uma região. Essa análise aprofunda o entendimento das mudanças que estão ocorrendo nos padrões atmosféricos, permitindo situar atuais eventos extremos em um contexto histórico mais abrangente.
Entre os resultados mais marcantes dessas descrições está a elevação nos valores de temperatura do ar observada em praticamente todas as regiões do planeta. Segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), o aquecimento do sistema climático global em superfície é inequívoco, e essa afirmação é também verdadeira para diversas regiões do Brasil, tais como o Estado de São Paulo.
A figura 1 expõe a EVOLUÇÃO TEMPORAL DAS TEMPERATURAS NO ESTADO DE SÃO PAULO MÁXIMAS (ESQUERDA) E MÍNIMAS (DIREITA), elaborada a partir de dados do Physical Sciences Laboratory (PSL) do National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), demonstra de forma também inequívoca que as médias anuais das temperaturas mínimas e máximas de virtualmente todas as regiões do Estado de São Paulo, têm-se elevado sucessivamente desde a década de 1980. Nesse ponto, é importante ressaltar que temperatura máxima e temperatura mínima referem-se, respectivamente, ao maior e menor valor desse elemento meteorológico observado ao longo de um dia.
Em uma análise histórica ainda mais longa, conforme mostra na figura 2, os DADOS ANUAIS DE TEMPERATURAS MÍNIMAS (LINHA AZUL) E MÁXIMAS (LINHA VERMELHA), baseada em dados da estação meteorológica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC/APTA/SAA-SP), nota-se que essa mudança para uma condição atmosférica de temperaturas mais elevadas parece estar presente desde a segunda década do século XX. Essa afirmação é particularmente verdadeira para os dados de temperatura mínima do ar, ao passo que a temperatura máxima mostra marcante elevação desde 2010.
Além da temperatura do ar, as mudanças climáticas estão afetando a frequência e a intensidade dos eventos de seca em praticamente todo planeta, incluindo o Brasil. Essa intensificação é, naturalmente, objeto de grande preocupação da comunidade científica mundial tendo em vista que essa adversidade ambiental pode resultar em importantes quebras de produtividades agrícolas, danos ecológicos severos e, naturalmente, dificuldades na manutenção das seguranças alimentares, energéticas e econômicas.
A figura 3 demonstra as VARIAÇÕES PERCENTUAIS NA FREQUÊNCIA ESPERADA DE EVENTOS DE SECA NO BRASIL (1980-2024), resultante de estudos do Instituto Agronômico de Campinas, demonstra que nas estações do verão, outono, inverno e primavera, aproximadamente 51, 46, 35 e 49% de todo território nacional foi submetido a elevações na frequência de secas severas a extremas, respectivamente. Esse fato é consistente com a ocorrência generalizada dessa adversidade ambiental no país desde 2000.
Destaca-se que, dentre todas as macrorregiões brasileiras, o Centro-Oeste apresenta-se como a mais afetada por essa mudança nos padrões climáticos. Essa afirmação é particularmente notável durante o verão, em que praticamente todo Centro-Oeste brasileiro esteve submetido a elevações na frequência de secas severas a extremas.
Em conclusão, os resultados apresentados nas figuras 1 a 3 deste artigo, somados a diversos trabalhos científicos realizados em todo o planeta, indicam que as mudanças climáticas são, de fato, um dos maiores desafios que a humanidade terá de enfrentar ao longo do século XXI. Em relação ao nosso país, devemos lembrar a posição de liderança ocupada pelo Brasil na produção mundial de commodities-chave como soja, café, carne, citros e cana-de-açúcar, entre outros.
Consequentemente, quebras de safra em nossa produção ameaçam a segurança alimentar de todo o planeta, com especial preocupação para as populações mais pobres. Reduções em exportações de produtos agrícolas usualmente elevam o preço dos alimentos.
Nesse contexto, instituições como o IAC já possuem resultados aplicados de pesquisa capazes de minimizar o impacto agrícola das mudanças climáticas, promovendo o uso racional da água na agricultura, a segurança alimentar, a geração de emprego e renda com responsabilidade ambiental. Essa instituição demonstra que o investimento em pesquisa é a única estratégia existente capaz de gerar inovações que mitigam os efeitos de adversidades ambientais na produção agropecuária, mantendo assim o Brasil como um dos (ou talvez o mais) importantes países agrícolas do planeta.
Na figura 3, as tonalidades em vermelho indicam que a frequência esperada de eventos severos a extremos em 2024 aumentou em relação à frequência que seria observada sem a presença de alterações nos padrões de chuva.