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Luciana Castellani

Gerente do Programa de Melhoramento Genético do CTC-Centro de Tecnologia Canavieira

AsAA25

A jornada da cana-de-açúcar frente às mudanças climáticas
As mudanças climáticas deixaram de ser previsões científicas distantes para se tornarem fatores estruturais da economia atual. O planeta já vive uma nova era de extremos: ondas de calor recordes, secas prolongadas, enchentes e tempestades intensas. No Brasil, o ano de 2024 foi um alerta, o País enfrentou a maior onda de calor já registrada, com impactos diretos sobre produtividade agrícola. Ao mesmo tempo, eventos como enchentes no Sul, estiagens prolongadas no Centro-Oeste e tempestades no Sudeste evidenciaram a vulnerabilidade das cadeias produtivas.

Observa-se uma tendência forte de maiores amplitudes climáticas, com eventos mais extremos, oscilando entre anos-safra muito favoráveis e outros desafiadores. Um exemplo claro ocorre na cana-de-açúcar: após uma supersafra em 2023/24, sucedeu-se a safra 2024/25, marcada pelo maior déficit hídrico desde o ano 2000.

Esses fenômenos cada vez mais frequentes e intensos desafiam as empresas a repensar sua forma de operar e inovar. Resiliência climática passou a significar muito mais do que adotar práticas sustentáveis; trata-se de preparar sistemas produtivos, logísticos e energéticos para funcionarem sob estresse ambiental. 

O agronegócio brasileiro desempenha papel estratégico na transição para uma economia de baixo carbono. Segundo estudo da FGV, a adoção intensiva de tecnologias de alta produtividade na cadeia da cana-de-açúcar pode elevar as emissões evitadas para 178,6 milhões de toneladas de CO2 por ano até 2042, um aumento de 129% em relação aos níveis atuais, consolidando o Brasil como referência global em descarbonização.

Para as empresas, adaptar-se a esse novo cenário exige planejamento, investimento em inovação e modelos de governança que incorporem risco climático em suas estratégias. Organizações que antecipam cenários de escassez hídrica, transição energética e impactos sobre cadeias produtivas estão construindo vantagem competitiva de longo prazo e os maiores pilares da sustentabilidade agrícola são a ciência e a inovação. 

Os programas de melhoramento genético da cana-de-açúcar, liderados por organizações como o CTC, IAC e a Ridesa, desempenham um papel fundamental na inovação do setor sucroenergético brasileiro. Esses centros são motores de inovação, responsáveis pelo desenvolvimento de novas variedades que apresentam maior produtividade e sanidade, maior tolerância ao estresse hídrico e resiliência superior frente às mudanças climáticas.

Como exemplo dessa inovação, posso falar com propriedade do nosso programa, que já utiliza ferramentas de melhoramento de precisão apoiadas por Inteligência Artificial, acelerando a identificação e seleção de genótipos superiores, consolidando ganhos de eficiência e sustentabilidade para toda a cadeia.

Apesar dos avanços científicos e tecnológicos promovidos pelo melhoramento genético, a adoção de variedades modernas no campo ainda ocorre de forma lenta. O cenário dos censos dos anos 2000 e 2005 demonstra que apenas 10 variedades dominavam mais de 90% das áreas cultivadas. Já entre 2020 e 2024, observou-se uma evolução no cenário, com o aumento para 23 variedades predominantes; porém, a maior parte dessas variedades ainda corresponde a lançamentos das décadas de 1980, 1990 e 2000.

A limitada adoção demonstra que, embora haja disponibilidade de materiais  superiores, a transição para um portfólio mais diversificado e moderno de variedades ainda enfrenta obstáculos, como fatores agronômicos, econômicos e culturais dentro do setor produtivo.
 
A adoção de genéticas modernas, integrando biotecnologia, é essencial para garantir eficiência produtiva diante dos desafios climáticos crescentes. Além de proporcionar variedades mais resistentes e produtivas, capazes de suportar condições ambientais adversas e manter elevados índices de ganho genético, essas tecnologias trazem benefícios diretos ao manejo agrícola.

Além da adoção de genéticas avançadas, a diversificação das variedades cultivadas consolida-se como uma estratégia crítica para a competitividade do setor. A seleção de materiais adaptados às condições ambientais e às práticas de manejo específicas de cada região produtora fortalece a resiliência e assegura respostas mais eficientes às particularidades locais. Com a evolução das ferramentas e tecnologias, essa abordagem tende a se tornar cada vez mais customizada, posicionando o setor para enfrentar desafios crescentes e capturar oportunidades de forma sustentável.