O Programa Nacional do Álcool - Proálcool – foi criado em 1975 por razões basicamente econômicas. Os preços do petróleo atingiram US$ 100/barril na ocasião, o que teria consequências importantes na situação econômica do País caso o Proálcool não tivesse sido implementado.
A mistura de etanol anidro na gasolina, e os automóveis usando álcool hidratado em 1979, foram as ações então tomadas pelo Governo Federal para garantir a oferta de combustíveis para o setor de transporte do País. Mais tarde, com as questões de sustentabilidade cada vez mais presentes no mundo, em particular a necessidade de combater o aquecimento global, passaram a ser relevantes os benefícios ambientais do etanol de cana como substituto da gasolina.
A proposta de carro elétrico, atualmente em discussão, só será uma alternativa à mitigação das emissões de carbono se a matriz elétrica do País for renovável. É sempre importante lembrar que o aquecimento global é um fenômeno mundial e o balanço das emissões de carbono deve ser sempre realizado usando a metodologia de análise de ciclo de vida, o que torna fundamental a matriz elétrica do País.
Se a eletricidade for produzida em termoelétricas a carvão, o ciclo de vida do carro elétrico terá resultados impactantes pelas emissões de carbono na geração de eletricidade. A redução expressiva no consumo de água na produção industrial de etanol (reduzida de 5m3/tc [tc = tonelada de cana moída] para 0,65 m3/tc em 2013), a redução no uso de fertilizantes pelo uso da torta de filtro e da vinhaça na fertirrigação – não mais descartada em corpos d’água, a eliminação das queimadas da cana e o uso de tecnologias eficientes para a queima do bagaço de cana nos sistemas de cogeração são alguns dos avanços importantes desde então ocorridos.
Assim, um dos principais motivos da menor pegada de carbono do etanol de cana é o fato de não haver consumo de fóssil nas caldeiras, diferentemente do etanol de milho e de trigo nos outros países. Também a expansão da cultura de cana em regiões de pastagens degradadas apresenta impactos ambientais positivos, como mostra a recente tese premiada na Universidade de São Paulo (Cherubin, M.R).
O etanol de cana do Brasil apresenta um elevado balanço energético (8-9 unidades de etanol produzidas para cada unidade de combustível fóssil consumido no processo) e, consequentemente, a possibilidade de redução em até 89% das emissões de carbono na substituição da gasolina. Esse fato permitiu que o etanol do Brasil fosse considerado um “combustível avançado” pelas agências ambientais americanas, abrindo um mercado importante para exportação.
Em momentos de instabilidade do setor, a opção do mercado de exportação pode ser interessante. Por outro lado, há perspectivas significativas de aumentar ainda mais a sustentabilidade do etanol de cana, como a introdução em larga escala da biodigestão de vinhaça para produção de biogás, com os usos já conhecidos.
A geração de eletricidade com biogás para venda à rede ou a produção de biometano para substituição do óleo diesel na fase agrícola são perspectivas importantes que dependem apenas de um ambiente regulatório adequado, bem como de um comportamento mais proativo dos atores envolvidos.
Há, no momento, iniciativas importantes, como as plantas da GEO Energética, no PR, a planta piloto do Grupo São Martinho em Iracemápolis e a futura planta da Raizen na Usina Bonfim. Estudos preliminares do GBIO, no âmbito do Research Center on Gas Innovation (RCGI/USP/Fapesp/Shell), indicam um potencial de quase 500 MW se toda a vinhaça produzida no estado passasse pelo processo de biodigestão e o biogás fosse usado para geração de eletricidade.
A substituição do óleo diesel pelo biometano produzido a partir da biodigestão da vinhaça é uma opção fundamental, não apenas em termos econômicos, eliminando a necessidade de compra do óleo, mas também em termos ambientais, pois reduz as emissões de carbono do diesel.
Além disso, há a opção de captura de CO2 emitido nos processos, particularmente na fermentação e na produção do biometano – gás metano obtido através do processo de upgrade do biogás (produto da biodigestão da vinhaça); uma usina média (moendo 300 tc/h) pode gerar mais de 40.000 toneladas de CO2 por ano, para comercialização. Essa opção, em termos parciais, já começa a ocorrer em São Paulo. A substituição do óleo diesel pelo biometano nas máquinas agrícolas irá contribuir para aumentar ainda mais o balanço energético do etanol.
Além disso, considerando a captura do CO2 para diferentes usos, (deslocando o CO2 de origem fóssil), será possível uma diminuição das suas emissões de carbono, já reduzidas (pegada de carbono), e que poderiam até mesmo ficar negativas, aumentando suas perspectivas no mercado internacional.
Além das iniciativas no setor, há também pesquisas em andamento, como as atualmente em desenvolvimento no RCGI, visando eliminar os gargalos ainda existentes no processo de produção de biogás e biometano a partir da vinhaça, e que certamente irão contribuir para atingir esses objetivos. De fato, é fundamental garantir que o etanol brasileiro continue sendo, cada vez mais, uma opção para a mitigação das emissões de gases efeito estufa.