Presidente da Cosan
Op-AA-30
No cenário em que nosso setor está inserido, muitos dizem que estamos na suíte presidencial do Titanic. Já é dado como certo que os Estados Unidos vão ter uma oscilação muito grande na economia, e as taxas do Japão vão subir por um período mais longo, fazendo o país pagar uma dívida gigantesca.
A dúvida dos economistas é a Europa: se correr bem, ela apenas não vai crescer, mas existe um grande risco de que haja uma ruptura de crédito, numa situação muito pior que em 2008, pois, dessa vez, quem vai quebrar são os Bancos Centrais. Cada alemão, do recém-nascido ao idoso, já pagou 8 mil euros para a Grécia.
Até o próximo ano, de eleição, provavelmente sejam uns 12 mil euros. Na hora em que o trabalhador que acorda cedo, trabalha o dia inteiro, não tem um décimo dos benefícios que os gregos têm perceber que pagou 12 mil euros para o grego, um potencial problema político se instalou. No dia em que a Alemanha disser “eu não pago essa conta”, o problema já está instalado.
Por isso precisamos ficar atentos. O governo brasileiro está atento e preocupado, como tem que estar. E ainda temos a China, que está andando um pouco pela lateral, voltada para esses mercados, que vão fazê-la desacelerar e tentar procurar mercados como o nosso.
O cenário é complicado: os problemas de crédito nesses países de primeiro mundo, onde as pessoas investiam o dinheiro e as reservas, vão gerar uma pressão por entrada em países como o nosso, produtores de commodities, provocando um cenário de câmbios, provavelmente, bastante deflacionados, baratos, gerando crise para a manufatura brasileira. Hoje, a fabricante de brinquedos no Brasil já virou distribuidora de brinquedos.
Praticamente, todos os setores de manufatura intensiva no País estão se transformando em importadores. Esse é um cenário grave. Por mais que tenhamos um mercado doméstico, passamos a ter problemas cambiais. Vamos ter um choque de demanda, e alguns poucos setores vão ter mercado para crescer. O nosso é um deles.
Poucos setores que empregam, que aquecem a economia, que fazem acontecer têm o mercado que nós temos. Porque, mesmo acontecendo tudo isso com China, Estados Unidos, Europa, ainda teremos um mercado de etanol relevante, dentro e fora do País; um mercado externo quase dependente do nosso açúcar. A questão é quanto a mais ou quanto a menos.
O tema “petróleo” para uma economia mundial do tamanho que é hoje se resume a até quando o petróleo deixar de estar disponível ou ser o grande supridor de energia do mundo, ou, no mínimo, chegar a custos estratosféricos. A idade da pedra não acabou por falta de pedra. Então, não é preciso imaginar que vai acabar o petróleo, por isso vamos ter um período de biocombustível mais forte, e isso é bastante claro.
A composição dos negócios da Cosan, atualmente, é a seguinte: A Cosan Açúcar e Álcool, com todas as suas plantas, tornou-se a Raizen Energia, responsável pela produção agrícola, açúcar, etanol e energia. A Raizen Combustíveis é a fusão da Esso e Shell, que, no Brasil, ao longo do tempo, permanecerá apenas com marca Shell. A Cosan Alimentos é um negócio de varejo, é um reprocessador de açúcar, empacotamento e distribuição.
A Rumo é o braço de toda a operação de logística do grupo. A Radar é a administradora de terras de diversas culturas, das quais 30% são terra com cana. E a Cosan Lubrificantes, a marca Mobil, que neste negócio tem a associação com a Amyris.
Entrando no assunto do etanol, começando pelo tamanho do mercado, para registro de comparação, o crescimento da demanda mundial por etanol, de 2003 para 2011, foi de praticamente três vezes mais. Juntos, Brasil e EUA consomem 77% de todo a produção mundial de etanol, que hoje representa um volume de mais de 100 bilhões de litros, dos quais 49% são oriundos de milho e 28%, de cana.
Na produção mundial de etanol, o Brasil teve uma participação importante no crescimento, mas a produção dos Estados Unidos explodiu de novo, um país com planejamento estratégico bastante definido, com um programa nacional que arrumou a vida do produtor de milho americano que não tinha o que fazer com o milho. Construíram um parque fabril gigantesco, estabilizaram-se como o grande exportador do mundo, desbancando o Brasil da posição.
Mas o Brasil também cresceu, mesmo considerando as nossas dificuldades de licença ambiental, financiamentos, etc., também tivemos uma explosão de crescimento, para nossos padrões, e chegamos a dobrar a capacidade de produção nesse período. Nos dados da moagem de cana-de-açúcar no Brasil, boa parte desse crescimento foi orientado pelo etanol. O açúcar tem o crescimento mais estável – apesar das oscilações de preço, a oscilação de demanda é quase inexistente. O etanol foi o grande vetor de crescimento do parque.
Na safra chuvosa 2009-10, houve uma volta do mix para o açúcar e também uma dificuldade de moagem, muita cana bisada para o outro ano, etc. O fato é que houve um crescimento muito forte no País, que atacou o balanço médio das companhias, o endividamento do setor aumentou muito e tivemos prejuízos em boa parte das companhias, especialmente nas que estavam mais expostas ao etanol quando os preços do açúcar subiram e elas não puderam aproveitar-se do bom preço do açúcar para pagar suas dívidas.
Houve um grande declínio dos projetos em decorrência de todo mundo ter ficado sem oxigênio. E, quando falta caixa, diminui-se brutalmente a capacidade de planejar e passa-se a fazer o que dá para fazer e não o que se quer fazer.
Para termos uma ideia do nível de preços que estamos vivendo hoje, devemos observar que, anos antes, era um momento de um setor menos alavancado, pronto para crescer e que tinha um alinhamento em relação à parte regulatória. Não existiam grandes dúvidas a respeito do que acontecia, de qual seria a regra do jogo. E, então, veio o boom que criou um mercado irreal, porque eu não acho que o etanol é produto correto para se queimar em qualquer lugar.
Ele tem alguns mercados, ele é complementar à gasolina. Agora, o etanol hidratado é um produto que tem alguns mercados a que ele precisa atender. Quando se tem excesso de oferta, entra-se em outros mercados. Já vivemos isso e já reclamamos do preço por causa disso. O preço baixo trazia um mercado adicional. Temos um potencial de queima de quase 3 bilhões de litros todo ano.
Então, é necessário ter um nível de preço correto, sem esquecer o Plano Governamental. É preciso haver uma meta para ajustar a quantidade de combustível fóssil versus combustível renovável que se quer no País no longo prazo. Se o governo desejar ter uma participação maior de renováveis na matriz energética, existe uma vontade muito maior do empresariado, hoje capitalizado e estruturado, para fazer grandes investimentos. Vai existir uma vontade muito maior para pisar no acelerador.
O importante é saber quais são os planos do governo, precisamos entendê-los e planejar em cima deles, senão acaba o oxigênio, senão, no meio do caminho, nós começamos a sair do processo, dos planejamentos e a fazer as coisas que dão para fazer e não as que devem ser feitas.
No final da história, temos a exportação e o consumo interno. O Brasil montou um esquema fantástico, que não existe em nenhum lugar do mundo, que consegue ajustar oferta e demanda, com mecanismos dignos de mercado de preço, sem desabastecimento, sem grandes rupturas. Se tiver planejamento, vão acabar as oscilações maiores.
Nosso sistema é muito inteligente, é absolutamente flexível, do produtor até o consumidor final, passando pela logística, pela distribuição, pelo dono do posto, por tudo. Nenhum outro país do mundo tem essa capacidade. Muitos países têm desejo de colocar um programa de biocombustível mais forte, os próprios EUA quiseram colocar o E-85 e, até hoje, têm uma fração mínima de sistema logístico para oferecer um segundo combustível ao cidadão americano, apesar de eles já terem mais carros flex que o Brasil.
Acabamos nos estruturando por diversos percursos, com o Proálcool, segundo choque, etc, e, hoje, o País tem uma matriz que consegue se adaptar a essas volatilidades, sem desabastecer e dando duas opções ao consumidor, uma alternativa mais barata, que representou alguns bilhões de reais para o seu bolso, além das externalidades que o combustível verde traz.
Quando se volta a níveis normais de consumo, aí sim temos, a partir deste ano, um crescimento de 2 bilhões de litros – que é quase só o estado de São Paulo –, com a renovação de frota. A esse sim vai ser difícil não atender. Embora o cenário de futuro seja difícil para o País, para o setor é muito promissor.
O setor dará ao País a oportunidade de conseguir ter um bolsão de crescimento, geração de empregos, etc., porque, mesmo com a demanda do jeito que vai estar nos tempos futuros, os grandes grupos estão absolutamente estruturados para replantar os canaviais e retomar o crescimento. Isso significa entender o que vai ser o marco regulatório ou a alteração que efetivamente acontecerá.
Se apenas houver horizonte e prazos, teremos o cenário para que possamos voltar a crescer, porque acho que o resto nós temos, praticamente tudo.