Presidente da Maubisa - Maurilio Biagi Consultoria & Negócios
Op-AA-25
Um dos mais abalados pela crise financeira mundial, o setor sucroalcooleiro passou por grande turbulência nos últimos 24 meses, mas não há como negar que as perspectivas continuam muito boas – talvez até melhores do que antes, se levarmos em conta a intensidade das mudanças climáticas e o acirramento da competição global.
Não fosse a mais competitiva do mundo, nossa agroindústria canavieira não teria atraído alguns dos maiores investidores globais, cuja visão estratégica deve servir de lição a todos nós, que acompanhamos os altos e baixos do setor, durante as últimas décadas. Quando o Proálcool foi criado, em 1975, analistas e pesquisadores de diversos países estiveram aqui, e a maioria fez mais questionamentos do que elogios ao programa.
Durante vários e vários anos, dizia-se que os canaviais cresceriam ocupando áreas de lavouras alimentícias. Passadas mais de três décadas, a cana ocupa quase 9 milhões de hectares, mais de 200% acima do patamar de 1975. Com uma expansão baseada principalmente na ocupação de pastagens (e não de grãos), a agroindústria canavieira produz o açúcar e o etanol mais baratos do mundo.
No mesmo período, a agricultura e a pecuária do Brasil aumentaram sua produção de forma espetacular, estabilizando a oferta interna de alimentos e gerando um grande saldo na balança comercial. Tanto na lavoura canavieira quanto na indústria de açúcar e álcool, somos tão eficientes que poderíamos até descansar, como fez o coelho na fábula sobre a corrida com a tartaruga. É aí que mora o perigo.
Em 2011, pela primeira vez após dez anos de crescimento ininterrupto, a produção de cana será menor do que a da safra anterior. Bom momento para um balanço desapaixonado da situação, agora que cerca de metade do processamento de cana está nas mãos de grandes players mundiais de commodities alimentícias e energéticas. Essas empresas estudam muito para entrar num setor novo. Suas decisões são técnicas.
Antes de investir na Usina Guarani, a francesa Tereos levou seus parceiros cooperativos a diversos países do mundo durante cinco anos. Processo semelhante de decisão aconteceu com a ADM, Cargill, Dreyfus, Odebrecht, Petrobras, Shell e a própria Cosan, cuja origem é canavieira. Um executivo do porte de Pedro Parente não aceitaria presidir a Bunge se não concordasse com o plano de negócios de longo prazo da companhia.
Por tudo isso, não tenho dúvida de que nossa agroindústria sucroenergética entrou num processo irreversível de globalização. O que é muito bom para o Brasil. Temos, porém, um longo caminho para aprender a administrar de forma equilibrada essa nossa emergente e revolucionária mercadoria híbrida – de origem agrícola e fins energéticos –, ofertada a quatro grandes grupos de demanda.
O mais antigo consumidor de etanol é a indústria brasileira; o mais novo, o mercado internacional, crescentemente explorado por tradings que, nos últimos anos, tomaram posse de diversas usinas e destilarias, numa ação positiva sob todos os pontos de vista. As outras duas formas de consumo – o álcool anidro adicionado à gasolina e o etanol hidratado, responsáveis pelo desaparecimento de cerca de dois terços da produção – estão sujeitas a diversas oscilações.
Entre elas, destacam-se a cotação internacional do açúcar e o preço da gasolina, que permanece, há vários anos, no mesmo patamar no mercado interno, independentemente das enormes variações do custo do petróleo no mercado mundial. O futuro do etanol está garantido por parcerias extremamente confiáveis e eficazes com a engenharia agronômica, a indústria de equipamentos de processamento de cana, o setor de petróleo e a engenharia de motores, mas precisamos superar deficiências na logística de abastecimento do etanol no território brasileiro.
Falta uma política de armazenagem capaz de ajudar na estabilização dos preços, que se elevam nas entressafras e baixam durante as safras. Ainda podemos melhorar nosso status nos aspectos ambiental, agrícola, energético e industrial, mas, de imediato, o item mais promissor é o potencial de cogeração de eletricidade a partir do melhor aproveitamento do bagaço e da utilização da palha da cana, hoje queimada ou deixada no campo.
Ficam, para um futuro mais distante, os derivados canavieiros de nova geração, como o diesel, o querosene e o plástico biodegradável, entre outros. Todos dependem de grandes investimentos em pesquisas, pois ainda são mais caros do que os derivados do petróleo. Por enquanto, está fora do nosso alcance saber quando os fósseis serão substituídos pelos renováveis, mas parece claro que logo a sustentabilidade do planeta vai exigir a supremacia do ambiental sobre a economia.