A produção de etanol de milho evoluiu rapidamente no Brasil, passando de apenas 37 milhões de litros na safra 2013/14, para estimados 8,1 bilhões de litros até o final da safra 2024/25, e projetados 10,0 bilhões de litros em 2025/26. Em 2024/25, o etanol de milho gerado em 24 plantas já representou 22,1% da produção total de etanol de cana e milho, e, levando-se em conta os 12 projetos em diferentes etapas de implementação e projetados até 2033/34, a produção de etanol de milho deverá atingir 18,65 bilhões de litros, ou 37,9% da produção total de etanol estimados nessa data. Portanto, o etanol de milho é uma realidade indiscutível, que tem crescido em expressão graças à sua competitividade e complementariedades com outras cadeias produtivas.
Em 2024/25, 23,2% do consumo doméstico total de milho, de 93,94 milhões de toneladas, foi direcionada para a produção de etanol. O etanol tem sido o grande impulsionador do aumento no consumo doméstico do cereal, que era de 74,02 milhões de toneladas em 2020/21. Isso porque, entre 2020/21 e 2024/25, o uso de milho para etanol passou de 8,22 para 21,79 milhões de toneladas. Em comparação, no mesmo período, o uso direto de milho para ração cresceu a um ritmo bem menor, de 53,5 para 59,5 milhões de toneladas.
O crescimento do consumo total tem impulsionado a produção, que passou de 87,72 milhões de toneladas em 2020/21 para estimados 125,67 milhões de toneladas em 2024/25. Isso ocorre porque a industrialização do milho para etanol e as receitas geradas com a venda de farelo e óleo têm ajudado a impulsionar o preço do milho produzido principalmente como safra de inverno (segunda safra) em regiões com logística de custo elevado para a exportação. A industrialização do milho para etanol, farelo e óleo tornou-se elemento fundamental para a formação do preço do cereal no norte do Mato Grosso, onde se concentra a atividade atualmente.
Com o milho sendo processado para etanol, em 2024/25 foram gerados 6,3 milhões de toneladas de farelo de milho, também denominado DDG/DDGS, ou Distillers Dried Grains e Distillers Dried Grains & Solubles, e 381 milhões de litros de óleo de milho, usados também como ingredientes para ração animal. A produção desses coprodutos é fundamental para a economicidade e competitividade do etanol de milho, gerando créditos que abatem o seu custo de produção, e têm sido utilizados com grande sucesso na produção de proteínas animais: bovina, suína, aves e ovos.
O etanol de milho produzido no Brasil se distingue em relação ao produzido nos Estados Unidos por utilizar biomassa renovável, principalmente cavaco de eucalipto, como fonte de energia na sua industrialização. Nos EUA, é utilizado principalmente o gás natural fóssil, o que torna o produto nacional muito mais eficiente para a descarbonização.
A rapidez com que tem expandido a produção de etanol de milho tem gerado um aumento igualmente veloz no consumo de biomassa, fazendo com que o seu preço de mercado se tenha multiplicado por quatro nos últimos seis anos. Isso tem levado muitos produtores de etanol de milho a investirem em produção própria de biomassa e à diversificação com outras fontes de energia. O
mais interessante é que novos projetos têm sido planejados e instalados em regiões onde existe potencial, mas ainda não se materializou a produção de milho necessária. Nesse sentido, a indústria de etanol de milho está caminhando à frente da produção de milho em estados como Maranhão, Bahia, Tocantins e Piauí, incentivando a expansão da produção do grão nesses estados.
Estes projetos nascem na esteira da estratégia de grupos produtores em atender a um mercado deficitário de etanol, que é a região Norte-Nordeste. Segundo estimativa da Datagro, a região Norte-Nordeste deve registrar déficit de 3,85 bilhões de litros de etanol na safra 2024/25 (set/ago). Com esses investimentos, um pouco mais de 80% desse déficit deverá ser atendido quando todas as plantas de etanol de milho, em construção ou em fase de projeto, entrarem em operação na região.
A região Norte-Nordeste deverá contar com 12 unidades de etanol de milho até 2029/30, com capacidade combinada de produção de 3,16 bilhões de litros ao ano, ou 82% do déficit estimado para atual temporada na região. Dessas 12 plantas, destaque para as duas unidades em construção da empresa Inpasa, sendo erguidas em Luís Eduardo Magalhães (BA) e em Balsas (MA), com capacidade para produzir 460 e 450 milhões de litros de etanol ao ano, respectivamente. A Bahia é o estado que deverá contar com mais plantas de etanol de milho, 4 unidades, na região Norte-Nordeste.
Um outro fenômeno tem sido a expansão da oferta de farelo de milho, utilizado com grande vantagem econômica e interesse em confinamentos de bovinos de corte e de leite. Novamente, o forte ritmo de expansão da oferta de farelo tem resultado em preços de DDG e DDGS que não têm acompanhado a evolução do preço do milho, estimulando produtores a encontrarem novos mercados no exterior para escoar parte da oferta. Esse efeito tem reduzido as margens dos produtores de etanol de milho, apesar de preços mais vigorosos de etanol no mercado interno na safra 2024/25.
Vemos que o etanol de milho no Brasil veio para ficar, basicamente pela integração das cadeias produtivas que ocorrem à sua volta: ao estimular a expansão da produção de milho de segunda safra através de preços mais elevados para o grão; ao gerar coprodutos que intensificam a pecuária bovina; ao liberar áreas de pastagens para expansão de lavouras; ao estimular a produção de biomassa e o aproveitamento de vários resíduos orgânicos.
A produção de etanol de milho também tem ocorrido em usinas de cana-de-açúcar, aproveitando sinergias e complementariedades. As usinas de cana dispõem de bagaço excedente, instalações já existentes para a geração de vapor, sistemas de tratamento e descarte de efluentes, purificação de água utilizada em processo, dornas de fermentação, colunas de destilação, tanques de armazenamento e muitos outros.
Nesses casos, o milho funciona como uma matéria-prima considerada quase-cana, que se compra e não se produz, que permite a realização de operações de hedge antecipado e que permite a extensão do período de safra otimizando a utilização de capacidade já instalada. Claramente, essa integração requer desafios a serem superados, a nível de operação industrial, planejamento e necessidade de capital de giro, e instalações para o armazenamento de milho. Mas esse é mais um desafio no processo de diversificação da indústria sucroenergética.
Na medida em que contratos de cogeração de energia de longo prazo do Proinfa são encerrados sem renovação, usinas estarão diante de um cenário em que muitas serão levadas a vender excedentes de energia no mercado livre, a tarifas mais baixas. Como a oferta de energia tem sido abundante graças à expansão da geração eólica e solar oferecidas a preços competitivos, a disponibilidade de bagaço poderá ser um atrativo adicional para a instalação de projetos de produção integrada cana-milho em usinas de cana instaladas em regiões com logística favorável à originação do cereal.
A produção de etanol sustentável, certificado com atribuição individual de intensidade de carbono, é uma grande vantagem para o uso do etanol, de cana e de milho, em aplicações tradicionais e em novas aplicações para a produção de combustível sustentável de aviação (SAF), substituição de bunker-fuel em navegação, reforma para a geração de hidrogênio verde e a produção de plásticos. O etanol de milho integrado ao etanol de cana veio para complementar de forma virtuosa a oferta total do produto em todas essas aplicações.