Presidente da Copercana e da Sicoob Cocred
Op-AA-33
Segundo a enciclopédia livre Wikipédia, virtudes são todos os hábitos constantes que levam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie; quer pessoalmente, quer coletivamente. Abastecer o veículo com etanol atualmente no Brasil está sendo muito mais uma questão de virtude do consumidor do que economicamente viável. O etanol perdeu competitividade e não dá para manter uma economia ou um determinado setor na base de virtudes, é preciso que o produto seja competitivo.
Quando nos referimos a virtudes, estamos mencionando os consumidores que abastecem com etanol pelas vantagens ambientais e sociais que esse combustível apresenta: é produzido através de fontes renováveis, polui muito menos que os combustíveis de origens fósseis e, dessa forma, contribui para a diminuição da geração dos gases de efeito estufa. Além disso, gera emprego e renda para os brasileiros, amenizando os problemas sociais do País.
Então, nos perguntamos, se o Programa de Energias Renováveis do Brasil é tão bom e visto com bons “olhos” pelo mundo inteiro, por que o etanol está vivendo uma crise?
E chegamos à conclusão de que a falta de políticas públicas e de investimentos no setor sucroenergético está, simplesmente, jogando no lixo toda a tecnologia que foi desenvolvida até hoje para o etanol e, junto com ela, o trabalho de milhões de brasileiros que não mediram esforços para criar um combustível com as vantagens ambientais e sociais que já citei neste artigo.
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o complexo sucroalcooleiro (açúcar e etanol) é o segundo maior contribuidor das exportações do agronegócio na balança comercial, ficando atrás apenas do complexo soja. Mas o governo não dá a importância devida a esse setor e já errou tanto, que criou uma situação impossível de ser compreendida, em que o Brasil importa gasolina com prejuízos para a Petrobras.
Só em 2012, de janeiro a junho, a empresa já teve prejuízos na ordem de R$ 750 milhões. Por que isso acontece? A Petrobras importa gasolina a um determinado preço e repassa aos consumidores mais barato do que comprou. Recentemente, o governo reduziu a zero a CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, que, em 2002, representava 25% do preço da gasolina.
Isso é ótimo para os consumidores de gasolina, que não sentem no bolso o aumento de preços, mas por que os mesmos procedimentos não são adotados no caso do etanol? Afinal, estamos falando de um combustível limpo e renovável, com resposta positiva ao apelo mundial na redução de emissão de gases causadores do efeito estufa.
Na safra passada, houve uma quebra de produção de cana-de-açúcar por fatores, principalmente, climáticos – seca, geada e florescimento. Os empresários tentaram se precaver para não deixar faltar etanol para abastecer o mercado interno. Fecharam contratos e importaram etanol de milho dos Estados Unidos. Daí o governo brasileiro – que tinha prometido não mexer na mistura do etanol na gasolina (25%) – surpreendeu a todos e, em meados de setembro, reduziu a mistura.
Ou seja, os empresários ficaram com estoque de etanol, e os preços foram jogados para baixo, destruindo a indústria sucroenergética, que foi construída com muito esforço. O setor está sem horizonte, e os investidores só aplicam dinheiro em produtos que possam ter mercado garantido. O governo precisa ter uma definição clara de qual deve ser a participação do etanol na matriz energética de combustíveis, pois, do jeito como está, o setor está sendo asfixiado.
Em 2012, existe uma “janela” de oportunidade para o etanol brasileiro. O preço do milho nos Estados Unidos disparou. As lavouras estão sendo afetadas por uma onda de calor, resultando em seca e muita perda de umidade do solo. Essa situação climática já começa a interferir na produção do cereal e, consequentemente, na cotação em Chicago. Assim, é provável que os americanos precisem importar etanol, e o nosso etanol de cana pode ser a alternativa para garantir o abastecimento nos EUA.
Podemos e devemos dobrar a produção de cana até 2020, chegando a uma produção de 1,2 bilhão de toneladas. Isso significa geração de empregos e melhoria de renda para a população, aumento de receitas para o nosso país. Mas o governo precisa decidir se é isso que quer, já que ainda não enxergou que a ampliação da oferta de energia é um grande desafio mundial. À medida que o mundo cresce, os países têm de buscar meios para fazer frente ao aumento da demanda, e essa não é uma tarefa simples.
São projetos demorados, já que dependem de licenciamento ambiental e altos investimentos e devem ter o menor impacto possível ao meio ambiente. Assim, se os países não tiverem um mínimo planejamento, correm o risco de travar o crescimento de suas economias. Isso está acontecendo no Brasil quando o assunto é justamente o setor sucroenergético, que produz energia limpa.
Outra coisa: os nossos canaviais estão velhos e precisam ser renovados. Por problemas climáticos e falta de recursos, os produtores deixaram de investir nas lavouras de cana. E, se o campo produz menos, todos os demais setores depois da “porteira” também devem sofrer as consequências. Menos insumos, menor uso de fertilizantes, queda nas vendas de máquinas, menos postos de trabalho. A crise do campo já está chegando às cidades, mas parece não ter batido ainda à porta do governo federal.
Não adianta os bancos colocarem dinheiro à disposição se os produtores estão endividados e sem garantias nem condições de contrair financiamento, em meio a uma crise que só piora com o passar das safras. O que o governo precisa criar para os produtores de cana é uma política de juros e prazos condizentes com o setor, como faz com outros segmentos do agronegócio.
E se, de um lado, o produtor não tem dinheiro para investir no seu negócio, deve no banco e está desestimulado, de outro, a arrecadação do governo só cresce. É até um fato curioso: se um setor tão importante está em crise e a atividade industrial está em queda, como a Receita Federal consegue arrecadar mais a cada ano? É simples: o governo está cobrando cada vez mais impostos do cidadão.
Estamos cumprindo nossos deveres, mas já está na hora de o governo olhar para os setores da economia que têm condições de crescer e investir em segmentos que possam garantir um futuro promissor para o Brasil, como é o caso do nosso etanol de cana. Aí, sim, todos nós, brasileiros, poderemos praticar virtudes que, somadas aos benefícios ambientais, sociais e econômicos, mudarão os rumos da nossa economia.