Neste texto, serão abordados os efeitos do clima para as operações industriais do setor sucroenergético, sendo mais específico para riscos, cada vez maiores, em decorrência da falta de água. Isso, através de uma abordagem objetiva e prática, de como devemos gerenciar nossos recursos hídricos, de forma que sejam, de fato, sustentáveis, através de mais estudos técnicos e ferramentas com previsibilidades cada vez mais rápidas/digitais e confiáveis para tomadas de decisão.
Pois bem, para as operações industriais de usinas, contamos com recursos hídricos naturais e diferentes formas de armazenamentos, através de barramentos com lagos artificiais ou mesmo naturais, que são alimentados por rios e nascentes, e estes, pelas águas subterrâneas, e estas, pelas águas meteóricas/chuvas, que, por sua vez, são condicionadas pelos fatores climáticos, que estão em constantes mudanças.
Para se ter o direito do uso desses recursos hídricos, temos que respeitar os processos legais para a obtenção de outorgas que, quando concedidas pelos departamentos estaduais ou federais, devem também obedecer aos critérios e limites para a exploração, sejam em captações superficiais, diretamente nos rios ou barramentos e das águas subterrâneas, através de poços instalados em aquíferos livres/freáticos ou confinados.
A indisponibilidade hídrica está ligada a dois fatores principais: 1) os reabastecimentos (a partir do clima/chuvas) e 2) às explorações não oficiais de poços. Como sabemos, são as chuvas que reabastecem nossos sistemas, mais diretamente os rios e lagos, e as águas subterrâneas. Aqui, temos diferenças importantes que merecem atenção, pois as chuvas recarregam os rios e lagos mais rapidamente do que recarregam os aquíferos, com tempos de residência muito menores.
Em relação às águas subterrâneas, os tempos de residência são infinitamente maiores, especialmente nos aquíferos confinados, como é o caso do aquífero Guarani. Já os aquíferos livres/freáticos, que são condicionados pela força da gravidade, os tempos de residência são menores em relação aos confinados, porém maiores que os rios e lagos.
Para se ter uma ideia da importância desses aquíferos, quando falamos da idade das águas subterrâneas, a exemplo do aquífero Guarani, temos tempos de formação de 5 mil anos na região de Bebedouro, 500 mil anos na região de Araçatuba e até 800 mil anos na região de Lins. A taxa de renovação desse aquífero é lenta, e a área de recarga do Guarani é de apenas 10% (Prof. Dr. Didier Gastmans). Por isso é tão fundamental um cuidado na exploração desse aquífero. O conhecimento técnico e a gestão dos parâmetros hidrológicos, hidrogeológicos e hidroquímicos da região de uma unidade industrial não devem ser negligenciados, sob o risco da falta de água para as operações, no médio prazo.
Há pontos importantes sobre o manejo adequado dessas fontes de água, em relação às captações, sendo:
1) Em barramentos: o monitoramento da qualidade da água, em função das atividades antrópicas existentes à montante, como esgotos ou efluentes não tratados de outras atividades, medição da vazão, sistema de segurança com vertedouros e drenos de fundo e estabilidade geotécnica do barramento.
2) Em poços de águas subterrâneas: o monitoramento de qualidade da água; o conhecimento de possíveis fontes de contaminação da água subterrânea na zona de influência da captação dos poços, a limpeza química e física a cada 2 anos, medição dos níveis estáticos e dinâmicos da água subterrânea ao longo do tempo.
Estima-se que há, no Brasil, mais de 2,5 milhões de poços tubulares profundos, conhecidos popularmente como poços “artesianos” e “semiartesianos”, sendo que 88% deles não estão cadastrados oficialmente (Prof. Dr. Ricardo Hirata). Os departamentos estaduais são os gestores que devem autorizar a instalação e exploração das águas subterrâneas. Esses órgãos não têm como avaliar com precisão as reais condições hidrogeológicas e hidráulicas numa determinada bacia hidrográfica, em função da clandestinidade. Dessa forma, fica difícil uma unidade industrial saber, de fato, quais são as condições ideais e limites para a exploração, além daquelas autorizadas pelos órgãos.
Cabe aqui o alerta para o risco de indisponibilidade de águas de poços, com a redução gradativa das vazões, como já se tem observado em diversos poços monitorados por pesquisadores, setor público ou pelo próprio setor privado.