Ao entrarmos o segundo semestre de 2023, assentadas as principais dúvidas sobre como seria a transição política no Brasil, e eventuais repercussões com temas como a política de preços a ser adotada pela Petrobras no novo governo, além dos desafios da transição energética em nosso País, é chegada a hora de nos debruçarmos sobre quais são nossas perspectivas e que, as mesmas, em alguma proporção, possam nortear, de certa forma, as políticas públicas que envolvem nosso pujante setor bioenergético.
Em paralelo a todo o contexto interno brasileiro, o mundo caminha a passos largos dentro de seus desafios de mitigação de emissões de gases de efeito estufa, talvez não na velocidade com que os ambientalistas mais radicais gostariam, mas, de forma regular, indicando uma predileção, que parece ter sido adotada por uma boa parcela dos países mais desenvolvidos: o da eletrificação dos motores, em detrimento dos motores à combustão.
Nesse contexto, temos duas alternativas complementares e que, se bem aplicadas por nossas lideranças, poderão alçar o Brasil a protagonista de uma nova era, ou, apenas, a coadjuvante e mero expectador das mudanças mundiais. Há décadas o Brasil tem se mostrado uma referência quando o tema é matriz energética limpa.
Até mesmo nossa metrópole São Paulo, comparada com outras megacidades do mundo, esbanja ter um dos ares mais limpos do planeta, em proporção de população e veículos automotores per capita. Isso se deve, em grande parte, à rota escolhida no Brasil, desde a década de 1970, de promover um biocombustível limpo, renovável e de baixa emissão de carbono: o etanol.
Sendo assim, quais são nossos desafios no futuro próximo? Penso que o etanol é um grande divisor de águas para o processo de transição energética atual no Brasil e no mundo. Quer como aditivo a gasolina; quer como fonte de célula de combustível; e até na matéria-prima do hidrogênio verde, tão bem estudado hoje como solução ambiental e sustentável.
As rotas de eletrificação baseadas no conceito do poço à roda mostram nossa eficiência energética muito superior às adotadas em países da Europa, por exemplo, onde a fonte da energia que abastecerá os automóveis, ou mesmo os veículos de mobilidade coletiva, são fósseis e poluídoras.
Mostrar ao mundo nosso protagonismo se tornou, agora, o principal dever de casa. O processo de transição da mobilidade levará, seguramente, mais algumas décadas, até ser concluído por completo, e, até lá, qual será a rota a ser adotada?
A Índia, por exemplo, gigante asiática de dimensões quase continentais, já encontrou no etanol sua “alternativa” neste processo de descarbonização. Mesmo caminhando para a eletrificação, também, o governo indiano determinou o aumento da mistura de etanol em sua gasolina, a exemplo do que faz o Brasil há décadas, e, por conseguinte, colherá resultados muito positivos na redução de suas emissões.
Outros países também têm adotado esta estratégia de migração, até a completa eletrificação. Mas devemos nos antecipar e estar um passo adiante nestas estratégias, mostrando, também, que o uso do etanol não deve ser interpretado, apenas, como estratégico no processo de mudança dos motores de combustão para os elétricos.
“Vender” as tecnologias dos motores híbridos flex é nosso dever como Estado e nossa obrigação enquanto amantes da bioenergia. Não podemos assistir, de camarote, ao mundo caminhando para um processo de eletrificação que apenas transfira as emissões dos escapamentos para as usinas a carvão, sem, com isso, resolver os graves problemas do aquecimento global.
Ao longo de mais de 100 anos na história do automóvel, muitas foram as “soluções” tecnológicas que desenvolveram o atual estágio da eficiência energética, das emissões de poluentes e da segurança veicular. Nesse contexto, hoje, se faz mais do que primordial, que o tema seja analisado sob a ótica da sustentabilidade, da economia de baixo carbono e da segurança energética, com uma visão global que considere as soluções locais muito características de cada nação.
Neste ínterim, inclusive, e, ainda, dentro do tripé do ESG, temos que considerar nesta equação o caráter social e econômico de nossa cadeia bioenergética, responsável, hoje, por boa parte do PIB do agronegócio brasileiro e geradora de milhões de postos de trabalho digno. Esse olhar macro, pode nos revelar qual deve ser a velocidade e a implementação das tendências a serem adotadas. Mister se faz, no entanto, um papel de protagonismo do Brasil, na participação em fóruns mundiais sobre o tema e a exposição de nossos resultados, e de nossa visão, para o futuro da transição energética global.
Não podemos, apenas, nos sentar sobre os excelentes números nacionais, como o privilégio de termos 80% de nossa matriz energética de fontes renováveis (hidráulica, biomassa, eólica e solar), e observar o restante do mundo, com 73% de energias não renováveis, oriundas de gás natural, derivados de petróleo, de carvão e nuclear, caminhando para o que acham ser uma “alternativa” eficaz, mas que, já se mostrou, imprudente, pois apenas transfere a fonte de emissão.
A pergunta que se faz é simples, novamente: seremos protagonistas ou meros expectadores? Com a palavra nossos representantes políticos...