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Gustavo Diniz Junqueira

Presidente da SRB - Sociedade Rural Brasileira

Op-AA-39

Um agenda para o agronegócio

O agronegócio ganhou os holofotes da política brasileira. O resultado econômico que o setor tem proporcionado ao País nas últimas décadas – com efeitos sociais latentes em geração de novas oportunidades de negócios, emprego e renda – catapultou-o para o centro das atenções do debate político que antecede as eleições de outubro. Trata-se de um momento singular na história do Brasil, bem diferente do início do século XX. Hoje, o agronegócio está espalhado pelo nosso território e é protagonista no desenvolvimento do País.

O setor abriga milhões de produtores e trabalhadores rurais por meio de cadeias produtivas que integram uma multidão de fornecedores da indústria e de serviços – não se restringindo apenas a uma elite –, sendo o motor que movimenta centenas de economias regionais conectadas aos mercados internacionais.

Produzindo volume e diversidade, o setor – impulsionado pela aplicação direta de ciência, pesquisa, tecnologia e, claro, clima, recursos naturais e vocação – obteve reconhecimento inédito, o que lhe traz novas oportunidades e desafios. Toda conquista vem acompanhada de benefícios, mas também de obrigações, e é neste último que reside o maior desafio do agronegócio de agora em diante. Na verdade, um chamamento: se o setor é o mais bem-sucedido do País e a percepção da sociedade em relação a isso avançou, está mais do que na hora de o agronegócio acentuar a sua participação nas discussões dos mais relevantes temas da agenda pública nacional.

É mais do que evidente que infraestrutura logística, seguro rural, o Código Florestal, defesa agropecuária, política agrícola, entre tantos outros itens de interesse direto para a produção de alimentos, são assuntos-chave e prioritários. As mazelas que acometem essas questões influenciam diretamente a competitividade e, consequentemente, as entregas do setor.

No setor sucroenergético, destacado fator de interiorização da riqueza pelo Brasil, o alto custo do transporte da cana-de-açúcar e do produto final está encarecendo demais o custo de produção do açúcar na safra 2013/2014. Há um desequilíbrio muito grande entre a produtividade da cana, que foi recuperada nesse ciclo e está em 75 toneladas por hectare (acima da média histórica) e o preço para fabricar o produto. De acordo com a Consultoria Datagro, transportar açúcar ficou mais caro no Brasil. Entre Ribeirão Preto-SP e o Porto de Santos, o frete saltou de R$ 68,00 por tonelada em 2012/2013 para R$ 95,00 por tonelada nesta safra. Em Goiás, esse custo, na última safra, era de R$ 110,00 por tonelada e, atualmente, está em R$ 180,00 por tonelada.

A crônica falta de investimentos em logística, aliada à Lei da Balança, que limita a 75 toneladas o transporte de cargas por veículo, incluindo a tara, e a Lei de Descanso dos Caminhoneiros, que tirou da atividade mais de quinhentos profissionais, são os responsáveis por esse quadro.

No caso do etanol, o crescente consumo no Norte e no Nordeste levou as usinas do Centro-Sul a enviarem 16,6% a mais do combustível do que foi enviado no ano passado, chegando a 1,4 bilhão de litros do biocombustível. Pode parecer absurdo, mas, em razão da complicada logística brasileira, é mais simples importar etanol dos Estados Unidos do que transportar até essas regiões.

A safra de cana recorde deste ano e os bons resultados do lado da produção não se traduzem em retorno para os produtores. Nos últimos três anos, o preço médio pago pelo etanol na usina é decrescente, enquanto os custos estruturais e conjunturais da produção têm aumentado sem parar.

Precisamos, portanto, que ocorra a retomada da competitividade e do crescimento sustentado do setor, como o desenvolvimento de um melhor planejamento estratégico da matriz energética brasileira, por meio da instituição de regras claras e de políticas públicas – especialmente tributárias – que reconheçam os benefícios ambientais e sociais do etanol e da bioeletricidade. O governo não tem sido capaz de implementar essas ações por falta de visão estratégica e desconhecimento sistêmico da importância tecnológica, econômica, ambiental e política do setor sucroenergético.

Além desses temas, a pauta do agronegócio é tomada também por indefinições acerca de segurança jurídica, legislação trabalhista, negociações internacionais, reforma tributária, meio ambiente e assim por diante. Isso sem contar as abordagens sobre a política econômica em geral, em especial câmbio e juros. Mas será que é só isso? Será que o setor não pode [e deve] aprofundar-se em outros temas cruciais – verdadeiros pilares – para o nosso futuro?

Segurança pública, saúde, educação, combate à corrupção, mobilidade urbana e equidade social. O agronegócio precisa posicionar-se de modo mais agudo no debate dessas questões. Não se trata de presunção, e sim de necessidade. Os mesmos problemas – senão piores – que atingem “as cidades” também atingem o “campo”. O setor não pode abster-se ou ficar aquém do papel que lhe cumpre na discussão desses assuntos.

O agronegócio pode e deve contribuir como um importante agente transformador. E por quê? Se a corrupção fosse menor, o gargalo logístico seria atenuado. Se o saneamento básico fosse “menos pior”, a saúde nas grandes metrópoles e no interior seria melhor, e o meio ambiente, cuidado de maneira mais sustentável. Se a educação fosse prioridade, o apagão de mão de obra qualificada no setor produtivo rural também seria menor.

Melhor segurança pública acarreta menor risco sistêmico e redução de custos ligados à segurança privada – na cidade e no campo. Mobilidade urbana eficiente a custos acessíveis acarreta melhor distribuição dos alimentos. A equidade social promove justiça na repartição das riquezas, incorporando ao mercado de trabalho qualificado e à cidadania plena setores até então marginalizados, que consumirão mais alimentos e demais produtos do campo.

Se esses desafios macroestruturais forem trabalhados, os resultados serão observados a longo prazo, mas serão muito mais duradouros e consistentes. No âmbito das inúmeras reformas de que o Brasil precisa, a política também é uma em que o agronegócio pouco ou nada opina. Um grave erro estratégico, já que, lá na ponta final, um sistema eleitoral menos complexo, ágil e transparente faria muito bem ao dia a dia de nossos produtores e agroempresários.

O Brasil não tem um projeto claro para o País e sofre do mal da procrastinação, seja por culpa ou dolo. Vivemos, neste ano eleitoral, um período delicado. A retomada do crescimento exige estabilidade econômica, planejamento e excelência em execução. A correção de rota não passa pela negação, e sim pela afirmação de nossas instituições. O que está errado é a condução delas. A Rural está preparada e vai participar desse debate, com foco na construção do nosso amanhã.