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Manoel Carlos de Azevedo Ortolan

Presidente da Orplana

Op-AA-40

Real cenário do setor sucroenergético

Pela primeira vez na história da cultura canavieira, representantes da academia e importantes formadores de opinião saem em defesa dos benefícios sociais, econômicos e ambientais dos seus produtos, com ênfase ao etanol e à bioeletricidade. Tudo leva a crer que os produtores foram bem-sucedidos na construção da imagem real e positiva que a cana traz e dos seus efeitos multiplicadores, notadamente nos polos agrícolas do interior brasileiro.

Não é de hoje que se reconhece que, aonde chega, a cana traz consigo a alavancagem da criação de empregos qualificados, distribuição de renda e prosperidade. As regiões de Ribeirão Preto – em São Paulo, de Maringá – no Paraná, do Triângulo Mineiro, de Dourados – no Mato Grosso do Sul, e Quirinópolis – em Goiás são alguns dos bons exemplos desse motor que propulsiona o crescimento e o desenvolvimento. Os fundamentos da cadeia produtiva sucroenergética são inquestionáveis, positivos e promissores.

Senão, vejamos: a indústria de base nacional desenvolveu tecnologia 100% “verde-amarela”, e independemos de importações para atendermos às demandas dos processos agrícola, industrial e de logística. Ao contrário, pois as exportações da nossa indústria de bens de capital atendem a, praticamente, todos os países produtores de cana-de-açúcar. Mais, nossos centros de pesquisas e desenvolvimento são referência mundial. Até 2020, existe demanda para dobrarmos os atuais níveis de produção de etanol, isso sem considerar o mercado externo.

A crise de energia, que apenas está no seu início, sinaliza para a valorização da bioeletricidade, e, também aí, somos campeões. Como na sua maioria agricultores familiares, os fornecedores de cana – 16 mil associados à Orplana (Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul) e 60 mil ao todo no País – atravessam o seu pior momento, convivendo com os preços baixos e inferiores aos seus custos e a inadimplência das usinas.

Essa situação tem provocado um forte movimento de saída da atividade, ao mesmo tempo em que se verifica o aumento da concentração das usinas. Então, o que é que está faltando? A crise que o setor sucroenergético atravessa, com dezenas de usinas desativadas, outras tantas em regime de recuperação judicial, 100 mil postos de trabalho extintos, inadimplência crescente, que traz reflexos na economia, principalmente no comércio e junto aos prestadores de serviços, remete ao Pacto de Moncloa, reunião ocorrida em outubro de 1977, na Espanha.

Vale lembrar que o General Franco (ditador espanhol) tinha morrido em 1975, e essa reunião definiu um acordo amplo de reforma da economia espanhola, em razão do total descontrole governamental. Situação e oposição, ao lado de lideranças da sociedade civil, decidiram dialogar e buscar o consenso para os problemas que atingiam a todos.

A forte adesão às criações das “Frentes Parlamentares em Defesa do Setor Sucroenergético” confirma que há ambiente favorável para um amplo diálogo com os setores governamentais. E o lançamento da “Frente Popular”, com o objetivo de engajar os 2,5 milhões de trabalhadores que dependem do setor, reforça essa tese. Em 1999, trabalhadores e fornecedores de cana foram às ruas para chamar a atenção da opinião pública e do governo.

O resultado foi a criação de um ciclo virtuoso que provocou a implantação de cerca de 100 novas usinas, reformas importantes em praticamente todas as outras e a duplicação dos níveis de moagem da cana-de-açúcar. O anúncio de que grupos de investidores estrangeiros colocaram seus ativos de usinas à venda e a difícil situação das unidades industriais – os prejuízos nos balanços confirmam isso  – acabam se capilarizando em toda a cadeia produtiva.

Apenas um amplo programa de refinanciamento de dívidas (Refis) com o mercado e também com o próprio governo pode resolver essa questão. Ao mesmo tempo, o governo precisa rever a sua política de preços predatórios impostos à Petrobras, a falta de critérios regionais e por tipo de fontes de geração nos leilões de compra de energia. Há de se convir que ninguém ganha nada com essa situação.

A mecanização da colheita da cana-de-açúcar provocou o aumento dos custos de capacitação profissional e a queda de produtividade e perdas retidas no campo. Variedades inadequadas e o aumento descontrolado de pragas, antes insignificantes, aumentam os custos de produção e baixam a produtividade. Esse tem sido o preço da implantação de uma nova tecnologia e assumido pelos produtores, já que os preços do açúcar, do etanol e da bioeletricidade são fixados, não por quem produz, mas pelo mercado, que, muitas vezes, pode ser e é manipulado.

Não é justo que agentes públicos, que deveriam estar comprometidos com um setor da envergadura e da importância do sucroenergético, insistam no falso argumento de que há de se reduzir custos e que este tem sido o pecado capital do setor. O produtor ou o empresário que não estiver focado em produzir com custos menores não sobrevive, isso todos sabemos.

E o setor tem dado sua contribuição, através de investimentos em logística (alcooldutos, tancagem portuária, modais de embarque de açúcar) e até no desenvolvimento de novas tecnologias (uso de palha junto com o bagaço da cana para a bioeletricidade e etanol de 2ª geração). É evidente que o contraponto ao aumento dos custos dos encargos trabalhistas, das nossas matérias-primas, da pesada carga tributária e até da contratação de advogados, para defesa em processos que nos impõem a insegurança jurídica, não pode ser a política de importação de combustíveis vendidos a preços inferiores aos da compra. E nem o custo exagerado das termelétricas poluentes, em detrimento da energia limpa e renovável da bioeletricidade.