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Otávio Lage de Siqueira Filho

Presidente da Jalles Machado

Op-AA-46

A viabilidade da palha
O etanol e o açúcar foram, por muito tempo, os principais produtos da indústria da cana. Mas, nos últimos anos, principalmente devido à crise enfrentada pelo setor sucroenergético, as usinas passaram a buscar outras alternativas e a apostar em novas tecnologias, com uso mais eficiente dos resíduos da produção, como o bagaço, a palha e a vinhaça. O bagaço da cana, que, antes, sobrava nas usinas, era vendido a preços baixos, ou utilizado apenas para cogeração de energia elétrica para consumo próprio, hoje tem grande importância.

As usinas conseguiram agregar valor ao transformar o bagaço em energia para exportar para o Sistema Interligado Nacional e em etanol de segunda geração. Impulsionada pela crise energética nacional, a cogeração de energia elétrica proveniente da biomassa da cana tem ganho notoriedade, por proporcionar ganhos econômicos e ambientais, e se tornou uma alternativa viável para as usinas. É uma energia limpa e renovável, que gera créditos de carbono. Pode estruturar um Projeto de Redução de Gases do Efeito Estufa (GEE), enquadrado nas normas do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), integrado ao Protocolo de Kyoto, o qual segue a Metodologia Consolidada para a Geração de Eletricidade Conectada à Rede a partir de Resíduos de Biomassa - ACM0006. 

 
Essa atividade de projeto consiste em aumentar a eficiência no sistema de cogeração a partir do bagaço de cana-de-açúcar. É considerada uma tecnologia limpa, que emite menos gases causadores do efeito estufa quando comparada às termoelétricas a gás natural ou a óleo. Essa redução pode ser mensurada, e, a cada tonelada de CO2 que deixa de ser emitida, gera-se um crédito de carbono que pode ser comercializado com países que tenham atividades mais poluentes.
 
Pela implementação desse projeto, a usina aumenta a quantia de eletricidade gerada e pode vender eletricidade à grade energética do Brasil, evitando o despacho de uma quantia igual de energia produzida por outras fontes, como as derivadas do petróleo. A iniciativa evita emissões de CO2 e contribui para o desenvolvimento sustentável regional, nacional e global.
 
Além dos ganhos ambientais, a cogeração gera uma receita adicional para as empresas e tem se apresentado como uma solução viável para as usinas, principalmente nesse período de crise econômica. A Jalles Machado e a Unidade Otávio Lage têm conseguido alcançar preços compatíveis nos leilões de energia, e isso nos estimulou a investir mais na cogeração, mesmo na crise. 
 
Para incrementar a geração de energia, apostamos na palha da cana, cujo potencial energético é elevado, com grande capacidade térmica, de 1,86 vezes maior que o bagaço. Após estudos de viabilidade técnica e econômica, realizamos investimentos da ordem de R$ 7.170.700,00 em equipamentos, para possibilitar o recolhimento da palha, o transporte para a indústria e a sua adição ao bagaço no processo de cogeração. 
 
O projeto entrou em operação no início desta safra na Unidade Otávio Lage e gera 54 empregos diretos. As operações de enleiramento e enfardamento são executadas em dois turnos (das 9h às 22h), pois a umidade da madrugada impossibilidade a atividade. Já o transporte de fardos e a trituração são operados 24 horas por dia. Recolhemos 60% da palha que fica no solo em 30% da nossa área total. Uma tonelada de palha gera 0,93 MW (considerando a palha como energia adicional, gerando somente em turbina de condensação). A nossa expectativa é de recolher 40 mil toneladas de palha por ano, que irão gerar mais 37.200 MW.
 
A sazonalidade da retirada de palha não é a mesma da colheita de cana. Nos meses mais úmidos (abril, outubro e novembro), evita-se o recolhimento, porque a palha retém mais umidade, há maior compactação do solo e aumenta o nível de impurezas minerais. 
Com o início do recolhimento de palha, observamos os seguintes pontos positivos: melhorias na brotação da soqueira, redução de pragas, principalmente das “cigarrinhas” e diminuição do risco de incêndios no campo. 
 
A atividade também apresentou alguns aspectos negativos, como a redução da proteção do solo contra a erosão, o aumento da temperatura do solo em função da radiação solar, o aumento da evaporação no solo e a redução da atividade biológica (fertilização natural). Com esse novo processo, é preciso estar atento aos seguintes aspectos e desafios:
 
  • maior desgaste na caldeira em função da queima de biomassa com maior concentração de enxofre, cloro e impurezas minerais;
  • variação da produtividade nas áreas coletadas;
  • problemas com pisoteio do solo, em função do aumento no número de máquinas operando no campo;
  • maior necessidade de irrigação nas áreas com palha coletada.
Apesar de existirem projetos mais completos e tecnicamente mais apurados, optamos por uma implementação mais rápida e simples para aproveitar o bom momento de preços da energia elétrica, visando a um maior retorno do investimento. Mas, com certeza, teremos que aprimorar o nosso projeto ao longo do tempo, para corrigir as deficiências que encontramos no primeiro ano de operação. Serão feitos alguns investimentos para reter a poeira gerada no processo de trituração e para automação da alimentação do triturador. Em relação ao pisoteio, vamos acompanhar o impacto que irá trazer para o canavial nos próximos anos e, se necessário, estudar medidas para diminuí-lo.
 
A utilização da palha na cogeração ainda é um processo novo, em desenvolvimento, que pode ser aprimorado e ter custos de produção reduzidos. É importante fazer um estudo técnico observando as particularidades da cultura da cana na região a ser implantado, para se definir a quantidade de palha a ser retirada. O processo apresenta inúmeras oportunidades de melhorias e requer novas tecnologias, sendo um campo vasto para pesquisadores da área de cana e também fornecedores de máquinas e equipamentos.
 
O governo pode incentivar as usinas a investirem no recolhimento de palha para cogeração, com regras estáveis, preços de energia compatíveis e linha de crédito específica para esse tipo de atividade. É mais barato e traz mais vantagens ambientais apoiar a geração de eletricidade através da biomassa do que, por exemplo, ligar as termoelétricas movidas a diesel. O desafio do setor sucroenergético nos próximos anos é conseguir fazer a ampliação do parque industrial e a expansão da cogeração com projetos tecnicamente mais eficientes e que consumam o excesso de bagaço produzido pelas usinas.