Por causa da sua grande importância econômica, o controle de pragas da cana deve ser considerado durante todo o ciclo de desenvolvimento, pois as principais pragas podem causar prejuízos na produtividade da ordem de 30% ou mais. O controle biológico é uma das mais importantes ferramentas para o manejo de pragas da cana-de-açúcar, por isso essa cultura suporta os maiores programas de controle biológico em termos de área aplicada e de quantidade de bioinseticidas utilizados, ou mesmo com liberação de parasitoides, como a Cotesia flavipes e Trichogramma galloi.
A broca-da-cana, Diatraea saccharalis, é a mais importante da América Latina, sendo a mais amplamente distribuída em todo o País, causando grandes danos econômicos inclusive a outras culturas. As mariposas dessa espécie depositam os ovos em grupos, e, quando eclodem, as lagartas iniciam a alimentação nas folhas da cana por dois instares e migram para a região do colmo, onde perfuram e fazem uma galeria de onde se alimentam até a fase de pupa, causando danos físicos e permitindo a entrada de fungos que contaminam o colmo, diminuindo a produção de açúcar.
A broca-da-cana tem sido mantida sob controle através da liberação da vespinha Cotesia flavipes. Nos últimos anos, esse parasitoide reduziu perdas de até US$ 100 milhões por ano, sendo US$ 20 milhões em São Paulo, reduzindo a infestação da praga de 10% para 2%.
O parasitoide de ovos Trichogramma galloi também tem sido usado no controle da broca, podendo chegar a 60% de controle quando associado à C. flavipes. Nas áreas de expansão da lavoura de cana, o fungo Beauveria bassiana pode ser utilizado para o controle de lagartas da broca-da-cana no primeiro instar, devendo ser pulverizado na dosagem de 6x1012 conídios/hectare pelo menos.
As cigarrinhas-da-raiz da cana, Mahanarva spp., tornaram-se um sério problema para a cultura da cana-de-açúcar em todo o Brasil, onde a maioria da cana já é colhida mecanicamente, pois, não havendo queima da palhada, ocorre um acúmulo desse material no solo e um aumento da umidade, facilitando, assim, o crescimento e a disseminação da cigarrinha-da-raiz da cana.
E, considerando que, com a nova legislação ambiental, em São Paulo, que proibiu a queimada da cana, ocorreu um aumento significativo na população de M. fimbriolata, causando sérios prejuízos para as usinas e fornecedores, além do aumento de custos para o controle dessa praga.
As cigarrinhas-da-raiz possuem ninfas especificamente radicícolas e se desenvolvem sobre as raízes superficiais ou raízes adventícias inferiores das gramíneas hospedeiras. Sugam a seiva segundo a sua idade, envolvendo-se numa espuma branca, espessa e que serve como proteção a inimigos naturais. Os adultos são de hábitos crepusculares-noturnos, ficando escondidos dentro das olhaduras ou no enviés das folhas durante o dia.
O dano mais importante que as cigarrinhas causam é a “queima da cana”, sendo consequência direta ao ataque das folhas, devido à injeção de substâncias tóxicas da saliva da cigarrinha, além de diminuir o teor de sacarose. Causam também a redução no tamanho e na grossura dos entrenós da cana grande e a morte de rebentos jovens, chegando a causar prejuízos de até 60% em grandes infestações.
A estratégia de controle das cigarrinhas-da-raiz inicia-se com o monitoramento da praga, que deverá ser realizado no início do período chuvoso e durante todo o período de infestação, para que se possa acompanhar a evolução ou o controle da praga. O monitoramento é imprescindível para decidir sobre a estratégia de controle da praga, sendo que a detecção da primeira geração permite um controle mais eficiente, principalmente através do fungo Metarhizium anisopliae. A aplicação do fungo M. anisopliae tem sido realizada, no estado de São Paulo, em aproximadamente 400.000 ha, com eficiência média de 60% de controle, permitindo que os produtores de cana possam conviver com a praga.
No Brasil, essa área chega a 1,5 milhão de hectare. A recomendação de aplicação desse fungo é de 5x1012 conídios/ha, sendo lavado e a suspensão, pulverizada na proximidade das raízes da cana, com vazão de 300 L/ha ou por via aérea com vazão de 30 L/ha.
Sphenophorus levis já é considerada uma das mais importantes pragas dos canaviais. As larvas desse inseto destroem o rizoma da planta, causando prejuízos da ordem de 30 toneladas de cana por hectare, além de reduzir a longevidade do canavial. Esse inseto encontra-se espalhado por praticamente todas as áreas de cana-de-açúcar, principalmente em São Paulo, causando prejuízos de até 60% de perdas em toneladas de cana por hectare, causando a morte de perfilho.
Os danos são causados pelas larvas, que se abrigam no interior do rizoma e danificam os tecidos. Com isso, pode ocorrer a morte da planta e falhas nas brotações das soqueiras, com perdas de até 30 toneladas de cana/ha/ano. Os seguidos ataques nas áreas de soqueiras e a consequente redução do stand da cultura ocasionam perdas cumulativas nos cortes, obrigando a reformas precoces do canavial, que, muitas vezes, não passam do segundo corte.
O controle dessa praga ainda é complicado, pois necessita de várias práticas que permitam que se consiga um equilíbrio da população da praga, visto que não será mais possível eliminar esse inseto da lavoura. Portanto a prevenção, através de vistoria das mudas de cana antes do plantio, bem como o conhecimento da procedência dessas mudas, de uma área não infestada, é fundamental para se evitar a propagação desse inseto.
Os principais métodos de controle, assim que se tem conhecimento da praga na lavoura, são: destruição de soqueiras, controle biológico e controle químico com iscas tóxicas. A reflexão que podemos fazer sobre a aplicação contínua de inseticidas químicos, sendo que, basicamente, são três moléculas tóxicas que se têm usado para o controle desses insetos, é que, além de causar contaminações ambientais e ao homem, gera populações das pragas resistentes a essas moléculas, causando prejuízos ainda maiores.
Por outro lado, o uso de técnicas biológicas depende de produtos disponíveis no mercado em condições de atender a essa demanda. Atualmente, são 55 empresas que produzem fungos entomopatogênicos e aproximadamente 20 empresas que produzem parasitoides para a cana, sendo necessário mais. Porém é preciso que as empresas e o governo estimulem inovações nessa área, tanto para pesquisa como para comercialização e aplicação.
Novas moléculas químicas e outros sistemas de controle também são importantes para a sustentabilidade da produção de cana-de-açúcar em São Paulo e no Brasil. O controle microbiano na América Latina possui as mesmas necessidades do controle biológico de pragas em geral, pois, apesar da alta biodiversidade, do solo e dos climas favoráveis de modo geral, ainda são necessários estudos de biodiveridade de organismos entomopatogênicos, visando conhecer novas espécies ou mesmo maior variedade de isolados para pesquisas com seleção de isolados virulentos para as pragas da cana-de-açúcar, principalmente Sphenophorus levis e Migdolus fryanus no Brasil.
A manutenção de coleções de agentes entomopatógenos é de extrema necessidade para o desenvolvimento de bioinseticidas e é outro desafio nesse processo, pois está envolvido um importante fator legislativo. A maior parte das biofábricas na América Latina são artesanais, pois dependem diretamente de mão de obra nem sempre qualificada, o que encarece o processo, e não usam tecnologias envolvidas em boas práticas de fabricação, tornando-as menos competitivas.
As análises qualitativas e quantitativas, relacionadas à concentração, à viabilidade, à pureza e à virulência ou à potência para entompatógenos ainda não estão padronizadas talvez para bactérias entompatogênicas; tem-se algum avanço, mas, para os demais agentes, não se tem conceitos definidos quanto a esses parâmetros.
A legislação tornou-se um desafio para o desenvolvimento de bioinseticidas à base de entomopatógenos, principalmente no Brasil, por causa da inexistência de uma legislação própria, tanto na parte de registros como no que se refere ao uso de isolados desses agentes entomopatogênicos, por causa da proteção do patrimônio genético nacional, que regula inclusive a anuência e a repartição de benefícios com os “proprietários” da cepa, como no caso do Brasil, que possui uma legislação específica para o uso de patrimônio genético no País, segundo o Protocolo de Nagoya.