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Eduardo Pereira de Carvalho

Diretor de Relações Institucionais da ETH BioEnergia - Grupo Odebrecht

Op-AA-11

Etanol: quanto mais, melhor

A recente divulgação do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), das Nações Unidas, reforçou o sinal de alerta que vem sendo dado por cientistas sérios, há vários anos. O texto afirma que há uma “enorme probabilidade” de que o aquecimento se deva à ação humana, sendo a queima de combustíveis fósseis sua principal causa.

A previsão é de aumento de temperatura de 0,2% por década, resultando em chuvas fortes, derretimento de geleiras, secas e calor, não estando descartado o degelo do pólo Norte. Esse quadro assustador é um chamado à consciência, uma vez que as conseqüências são planetárias e duradouras. Também torna imperativo o investimento na produção e na adoção de energias renováveis, bem como no desenvolvimento de novas tecnologias, que permitam uma virada definitiva na página da Era do Petróleo.

E é aí que algumas dificuldades tornam-se patentes. O século do uso intensivo das fontes renováveis de energia, como seguramente o século XXI será conhecido, começa com um ranço do século XIX – o protecionismo. É um verdadeiro absurdo que se pretenda inaugurar uma nova era com os vícios antigos.

Afinal, o protecionismo agrícola só começou a ser combatido, em termos internacionais, a pouco mais de 20 anos, durante da Rodada Uruguai do Gatt (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), que antecedeu a criação da OMC (Organização Mundial do Comércio). Esse ranço protecionista acaba por contaminar a energia renovável de origem vegetal. Vivemos uma situação absurda em que o petróleo entra nos Estados Unidos livre de impostos – isso independentemente de sua origem ser de país que o governo norte-americano tenha relações menos que amigáveis.

No entanto, qualquer etanol importado, à exceção do produto comprado nos termos da CBI (Caribbean Basin Initiative), paga uma taxa de US$ 0,54 o galão (US$ 0,14 o litro), mais tarifa ad valorem de 2,5%. Na União Européia, a tarifa praticamente inviabiliza a importação: 0,921 Euros, por litro. Este é um cenário preocupante, especialmente porque nos deixa a anos-luz da colaboração global, para a inevitável substituição do petróleo. Essa cooperação torna-se cada vez mais necessária, uma vez que a troca de informações poderia resultar em um maior número de países adotando os biocombustíveis.

O que se vê, ao contrário, são iniciativas isoladas. Além da produção brasileira de etanol de cana, existem programas de álcool de milho nos Estados Unidos, e de biodiesel, produzido a partir da colza, na União Européia, principalmente na Alemanha. As boas intenções, patentes nos discursos oficiais, esbarram nas barreiras protecionistas, que dificultam o acesso a mercados.

Não há esforço comum para enfrentar o desafio da substituição do petróleo, cujo consumo continua a crescer, principalmente em países populosos, como China e Índia. Nesses países, o crescimento econômico tem resultado na motorização acelerada de suas cidades, com o conseqüente aumento da poluição atmosférica. Enquanto isso, 70% dos depósitos de petróleo encontram-se nas mãos de poucos países, em áreas marcadas por conflitos.

Qualquer atentado contra um oleoduto no Iraque, qualquer greve em países exportadores, como aconteceu recentemente na Nigéria e no Equador, é o suficiente para provocar altas no preço do petróleo. Na área da agroenergia, as informações, preciosas, existem para serem compartilhadas. Há anos, o governo e a iniciativa privada têm divulgado a experiência brasileira com o etanol combustível, em todos os cantos do mundo.

Não se passa uma semana, sem que a Unica – União da Indústria de Cana-de-Açúcar, não receba uma missão estrangeira, interessada, justamente, nesta experiência. E não nos fazemos de rogados, estamos de portas abertas para divulgar essa tecnologia. Também temos clareza de que a produção de etanol é uma solução local para muitos países. Afinal, quem está disposto a trocar uma dependência por outra? E o etanol de cana é a nossa solução local consolidada.

O foco dos investimentos do setor, que têm crescido em termos agrícola e industrial, é o mercado interno. A nossa prioridade é que os donos dos carros flex-fuel, que já representam a maioria dos carros novos no país, prefiram o etanol à gasolina. Portanto, o preço do etanol precisa ser competitivo. O aumento das exportações é um desdobramento natural desse processo.

A nossa expectativa é que em seis ou sete anos o consumo de etanol no Brasil vai triplicar. Isso torna indispensável um investimento maior em tecnologia, como a de álcool de celulose, que poderia aumentar a produção, do equivalente atual de 80-85 litros por hectare de cana, para 150-160 litros por hectare.

Mais: o etanol de celulose poderia levar a produção a países de clima temperado, que não dispõem de matérias-primas mais eficientes, como a cana-de-açúcar – restrita às áreas tropicais do planeta, mas contam com resíduos florestais e outros produtos de espécies vegetais. O etanol é uma solução local, que necessita de políticas públicas para florescer. Em contrapartida, a auto-suficiência será inviável. É preciso lembrar que se trata de um produto agrícola sujeito ao clima – justamente um dos pontos mais sensíveis da atualidade.

A segurança do mercado de biocombustíveis virá da diversificação da produção. Mais e mais países produzirão etanol, e esse aumento de oferta constituirá o mercado e assim será, enfim, uma commodity. Não haverá uma Arábia Saudita do etanol, até porque sua produção será uma tecnologia ao alcance de todos. E esta é a beleza da agroenergia.