Diretor do Departamento de Desenvolvimento Rural Sustentável do MMA
Op-AA-14
A princípio, fiquei surpreso com o convite para que o Ministério do Meio Ambiente participasse deste evento, pois é comum se ver tratar o agronegócio, e mais especificamente o setor sucroalcooleiro, como bandido, e colocar o setor ambiental como mocinho da história. Porém, esse comportamento em nada contribui. Nós, como governo, temos como sentido de missão promover o desenvolvimento sustentável desse setor, e motivados por essa intenção, com esse espírito, com o desejo de aferirmos nossas posições, que participamos deste Fórum.
A Ministra Marina Silva, nesse segundo mandato, promoveu a reestruturação do Ministério do Meio Ambiente, criando algumas novas secretarias, como a Secretaria de Mudança Climática e Qualidade Ambiental e a Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável, da qual faço parte. Esta secretaria é dividida em três departamentos:
Também temos as autarquias, vinculadas ao Ministério, como o Ibama, a ANA - Agência Nacional das Águas, o Instituto Chico Mendes e o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico, do Rio de Janeiro. No relacionamento mais direto com o setor, no licenciamento ambiental, estão os Órgãos estaduais de Meio Ambiente. Como vemos o contexto do setor sucroalcooleiro?
Vou apresentar algumas questões, onde, talvez, tenhamos alguns conflitos de entendimento, mas achamos que aferir estas questões é exatamente a proposta do Fórum. Vale a pena observar que não estamos aqui de forma preconceituosa, preestabelecendo quem é certo e quem é errado. Nosso desejo real, de fato, é conhecer mais o setor sucroalcooleiro, para avançarmos no processo de controle ambiental.
O setor é bastante dinâmico e inovador e o governo precisa estar preparado para acompanhar as inovações tecnológicas, que são colocadas no seu dia-a-dia. Há uma expansão muito grande da produção e um grande número de empresas sendo licenciadas, o que faz com que seja necessário que estejamos preparados para atender a esta demanda.
Há um insuficiente ordenamento territorial no país e não estão definidas, de forma clara, quais seriam as áreas onde poderia haver, ou não, expansão. Com isso, evitaríamos as acusações, feitas pelos países desenvolvidos, de que a produção sucroalcooleira no Brasil compromete a produção de alimentos. O ordenamento ambiental é que vai, de fato, dar clareza ao que está acontecendo no território brasileiro, inclusive a pressão sobre a ocupação de novas áreas e sobre o desmatamento.
Com relação às barreiras ambientais, todos os dias ouvimos novas alegações, como a feita pelo OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, afirmando que os biocombustíveis podem acabar sendo um remédio pior do que a doença. O Governo brasileiro precisa estar ciente do que está acontecendo e também aliado ao setor produtivo, para que tenham respostas claras sobre as acusações feitas e não serem surpreendidos.
Hoje, cada vez mais, a preocupação com o meio ambiente firma-se, não só nos países ditos desenvolvidos, mas no nosso próprio país. As pesquisas mostram que a questão climática é uma das maiores preocupações da população brasileira. Essa é mais uma motivação para buscarmos alternativas de solução. Há uma disparidade muito grande ao longo da cadeia produtiva.
Nós sabemos de empresas que são extremamente eficientes, do ponto de vista ambiental e outras que ainda adotam tecnologias ultrapassadas, que poderiam ter uma grande melhora. E agora, nesse processo de amplitude de novas áreas, instalação de novos empreendimentos, é recomendável que se use a melhor tecnologia, principalmente, em relação ao meio ambiente.
Então, quais são os desafios em relação à questão ambiental, para o setor sucroalcooleiro? Não quero, simplesmente, taxar como problemas ou soluções, ou dizer que o problema é do setor produtivo e a solução é do governo. Estamos nos colocando aqui, como parceiros do processo, que é de interesse nacional, para buscarmos exatamente estas soluções.
Primeiro, é a questão do zoneamento. Essa é uma necessidade que esclarecerá para onde o setor deve expandir. É óbvio que essa resposta não deve ser dada apenas pelo governo, mas pela sociedade brasileira como um todo. São vários interesses colocados em questão. É importante que se esclareça exatamente onde se pensa fazer essa expansão.
Essa decisão não pode ser tecnocrática, de cima para baixo, centralizada em Brasília. É considerável que a sociedade evolua, que o Estado brasileiro democratize-se e que possa abrir toda a discussão, em relação a esse zoneamento. Algo que também deve ser considerado é a questão da variabilidade climática, que favorece a expansão da cultura. Ela pode entrar em todos os biomas brasileiros, já tendo sido mostrada pelo Presidente Lula sua preocupação em relação à Amazônia e ao Pantanal.
Então, nós vamos estabelecer esse acordo na sociedade para dizer quais são as áreas adequadas para essa expansão, visto que, do ponto de vista agronômico, a cana, praticamente, não tem tanta limitação. Há uma pressão sobre a produção de alimentos. É uma questão para ser esclarecida. Para onde está ocorrendo a expansão da produção da cana? É para áreas de pecuária?
Para aquela pecuária degradada que deve realmente ser substituída por atividades mais rentáveis? Ou é, de fato, para áreas de soja ou de milho? Possivelmente, isso não ocorra agora, porque há uma valorização maior do mercado da soja e de milho, mas é uma questão que precisa ser esclarecida, e o zoneamento é um instrumento adequado para tratar dessa questão.
Com relação à regulação da evolução espacial, temos observado várias iniciativas dispersas e conflitantes do legislativo e do executivo, no âmbito estadual e municipal. Estabeleceu-se, em alguns municípios, um limite para a cultura de cana e isso gera, por um lado, um fator positivo, mas, por outro, conflito, insegurança e intranqüilidade ao setor, que fica sem saber qual é a regra que está valendo.
Os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente fizeram uma parceria, para estabelecer o zoneamento agrícola e conteúdos ambientais para o país. Já foi anunciado pelo Ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e até o final do próximo ano isso deve estar finalizado. Com relação à Área de Preservação Permanente, APP, e a Reserva Legal, RL, existem ações produtivas, desenvolvidas pelo setor, e é possível e necessário que isso seja reconhecido.
Um exemplo positivo deste fato é o Sindicato Sucroalcooleiro da Paraíba, que desenvolveu, recentemente, um evento chamado “Diálogos Florestais”, que busca estabelecer corredores ecológicos, ligando as RPPNs de cada usina, para aumentar o seu serviço ambiental. Outro exemplo: no Mato Grosso do Sul, há o interesse de se fazer o mesmo em uma região, na bacia hidrográfica do rio Vacaria.
De toda forma, está comprovado que existe, nessas áreas, um passivo ambiental. Há um descumprimento de legislação em alguns locais, mas não quero taxar todo mundo como ilegal. Nós sabemos que existem usinas que são campeãs em produção de mudas de espécies nativas, e estão, de fato, recuperando suas APPs, mas existem outras que precisam melhorar nessa área.
Há um reconhecimento do próprio setor, na relação do serviço ambiental, que as APPs e RLs prestam para a produção da melhoria da qualidade ambiental e, conseqüentemente, dos fatores de produção das suas áreas. Existem iniciativas de recomposição, limitadas ainda, mas que nos animam para utilizar como exemplo positivo. Há uma necessidade de ação, ao longo da própria cadeia, para diminuir essas diferenças que existem, em relação às questões das APPs e das RLs, e há, hoje, vários mecanismos de intensificação do sistema de monitoramento.
A Embrapa e o INPE têm sistemas sofisticados, que estão sendo desenvolvidos com a participação do setor sucroalcooleiro. Um exemplo disto são os Indicadores de Sustentabilidade, desenvolvidos pela Embrapa Monitoramento de Satélite. O Ministério de Meio Ambiente vai participar também desse processo. Apesar de muito conflitiva, há uma luz no fim do túnel, em relação a essa questão.
Com relação às queimadas, temos uma preocupação com os assuntos que envolvem esta questão. Existe um aumento progressivo da colheita mecanizada, especialmente em São Paulo, e isso gera também uma pressão social. Nós precisamos achar uma solução, pois esse é um problema da sociedade brasileira como um todo. Se por um lado, a colheita mecânica é uma boa alternativa ao processo de queima, é importante que se ache uma solução para a questão dos postos de trabalho que serão perdidos.
Com relação à questão da conversão da biomassa, existe muita inovação tecnológica no setor, que acaba valorizando a palha e o bagaço da cana, criando alternativas rentáveis e sustentáveis, para esta atividade. Com relação aos agrotóxicos e à destinação das embalagens, esta é uma questão já encaminhada pelo setor sucroalcooleiro.
O setor deu um exemplo para o país, sendo o primeiro a iniciar o processo de recolhimento e destino correto das embalagens de agrotóxicos, o que não deixa de demonstrar a preocupação com os processos de aplicação, principalmente, os aéreos. Um bom exemplo que gostaria de destacar, é a questão dos recursos hídricos. O gasto entre as Unidades produtoras é muito discrepante.
Hoje, unidades industriais bastante avançadas já não usam água para limpeza da cana e executam o processo de forma mecânica. Outras, ainda usam água, porém, através de circuitos fechados. O Governo e os órgãos ambientais, em parceria com o setor sucroalcooleiro, como um todo, precisam construir indicadores, para saber qual é o consumo ideal, o ponto ótimo no consumo de água no processo, para assim orientar os próximos processos de licenciamentos.
Com relação à vinhaça, existem atitudes positivas, como a impermeabilização. Porém, a solução de fertirrigação ainda é paliativa, que pode gerar problemas, como a questão da saturação do potássio e o risco aos Aqüíferos. É uma boa solução, mas que ainda precisa de refinamentos. Acredito que o estudo contratado no estado do Paraná seja muito positivo, muito importante, muito bem-vindo.
A questão dos resíduos sólidos e da cogeração é uma melhoria muito positiva. Os avanços tecnológicos da segunda e terceira geração certamente ajudarão esse processo e também auxiliarão a redução da queimada. Para finalizar, há a questão do licenciamento ambiental. Há, realmente, uma discrepância muito grande entre os OEMAs - Órgãos Estaduais de Licenciamento Ambiental.
O Ministério do Meio Ambiente está aberto a esse processo de diálogo com o setor, para buscar, de fato, as melhores formas de se promover o licenciamento, tanto no prazo, quanto nas exigências, desenvolvendo o trabalho de uma forma coordenada, com os demais órgãos estaduais. Dentro do processo de licencia-mento, é importante ter uma visão do todo, em uma avaliação estratégica do setor, onde temos que compatibilizar as áreas econômica, social, ambiental e institucional.
Nós, dos órgãos licenciadores, não podemos olhar as atividades só do ponto de vista ambiental, nem preferencialmente. Precisamos valorizar o ponto de vista econômico, da geração de emprego, da importância da atividade para o país, assim como, das demais questões sociais e institucionais. A missão que a Ministra Marina Silva determinou para a nossa Secretaria é que abramos um diálogo produtivo com o setor do agronegócio. Utilizamos, assim, este Fórum Internacional sobre o Futuro do Álcool, para inaugurar, de fato, este canal de comunicação com o setor sucroalcooleiro.