Gerente de Marketing da DMB
Op-AA-41
Como na maioria das tecnologias da cultura da cana-de-açúcar, o plantio mecanizado no Brasil começou na década de 1970, oriundo da Austrália. Nessa época, ficou restrito mais no campo da curiosidade do que como uma necessidade, uma vez que era farta a disponibilidade de mão de obra braçal, principalmente para a colheita da cana. Como era prudente manter essa mão de obra empregada na entressafra, utilizava-se esse contingente para o plantio da cana, principalmente o de 18 meses.
Dessa forma, o plantio mecanizado de cana no Brasil ficou restrito a áreas experimentais, e, quando os gestores da época tinham algum contato com esse sistema de plantio, a primeira reação era a de torcer o nariz para a tecnologia. Afinal, isso era coisa para os australianos, onde as áreas de plantio são muito menores que as nossas e, geralmente, o próprio dono do negócio é quem faz o serviço.
Porém, como diz um empresário com quem tive o prazer de trabalhar, “o tempo passa e as coisas mudam”: com as implantações de normas regulamentadoras e ambientais, as queimadas de cana para colheita foram diminuindo e, proporcionalmente, a colheita mecanizada da cana começou a crescer. Essa mudança trouxe reflexos sociais nas populações das pequenas cidades das áreas produtoras de cana-de-açúcar, onde o principal horizonte dos jovens das famílias era o corte da cana junto com os pais, que começaram a se preocupar em proporcionar alguma outra alternativa de trabalho para seus filhos quando crescessem, porque, até lá, ele mesmo poderia estar sem o trabalho no corte da cana.
Como toda nova tecnologia, a colheita mecanizada foi até rejeitada ou pouco aceita no início, mas, depois, foi crescendo e caindo no gosto dos gestores e usuários, principalmente devido ao alto rendimento por máquina e à queda no custo da tonelada de cana colhida. Esse crescimento gradativo foi deslocando a mão de obra braçal para outras atividades, inclusive fora do ambiente natural da cana-de-açúcar, e, por volta da safra 2003/2004, quando houve o boom da cana e muitas usinas resolveram expandir suas áreas e capacidade de industrialização, somado aos novos aventureiros oportunistas que apostaram todas as fichas no setor, se deparou com a escassez de mão de obra para se plantar toda a cana necessária.
Essa necessidade fez com que o uso das plantadoras, naquela época, fosse engolido a seco, e, mesmo com a indigestão gerada pela pouca credibilidade na tecnologia, o plantio mecanizado começou a ocupar cada vez mais espaço na cultura da cana. Como o sistema não dependia, como não depende até os dias atuais, exclusivamente da plantadora, mas sim de um conjunto de fatores que compõem o preparo de solo bem feito, produção e colheita das mudas com boa qualidade, pessoal envolvido no processo conscientizado e preparado para fazer um bom trabalho, não tardou para que os primeiros problemas apresentados fossem creditados à plantadora.
E o patinho feio do negócio passou a ser a vilã para a justificativa de resultados negativos oriundos da pressa e da má gestão dos condutores do desenvolvimento do setor. Não houve tempo para se conhecer o sistema na sua profundidade, nem para o embasamento necessário de pessoas e máquinas para se implantar a tecnologia da maneira mais adequada.
E o aprendizado foi acontecendo por tentativa e erro e se ajustando às necessidades de cada usuário e do seu grau de envolvimento em aprender e aperfeiçoar o sistema. Nos dias atuais, o plantio mecanizado da cana é uma realidade e um caminho sem volta, porém ainda há um grande espaço para melhorias e aperfeiçoamentos da tecnologia, seja no campo da mecanização, produção e colheita de mudas, insumos e do modus operandis de todas as práticas envolvidas no processo.
Desde que começou a ser utilizado de forma mais significativa, o plantio mecanizado foi apresentando consequências oriundas de diversas variáveis, porém uma passou a ser a constante mais observada na grande maioria dos casos – a quantidade de muda utilizada no plantio. Como todas as etapas do processo são mecanizadas, a possibilidade de dano nas gemas aumenta, o que exige, na mesma proporção, um aumento na quantidade de cana usada para compensar os danos.
E isso se tornou regra: no plantio mecanizado, o consumo de mudas é maior. A própria orientação dos líderes de plantio para os operadores de plantadoras passou a ser: “na dúvida, põe mais cana”. E este, preocupado em não ser o responsável por um plantio mal feito, sempre colocou mais cana que o necessário nas esteiras das plantadoras, sem mesmo saber que o excesso de cana no sulco de plantio, ao invés de garantir um bom resultado, pode prejudicar muito a brotação uniforme das gemas, devido a um menor contato dos rebolos com a terra.
Até os dias atuais, é comum ouvir, nas palestras dos seminários, ou ler nas matérias das revistas do setor, que o consumo de mudas no plantio mecanizado é muito elevado, estando na faixa de 18 a 20 toneladas por hectare e, não raramente, superando a casa das 22 toneladas por hectare. Por mais que invistamos no treinamento dos operadores que vão trabalhar com nossas plantadoras, visando orientar a maneira correta de operar a condução dos rebolos na posição adequada das esteiras da plantadora, para se evitar o consumo exagerado de mudas, sempre nos frustramos em atingir nosso objetivo, uma vez que o consumo exagerado de mudas já é costumeiro, desde que o plantio mecanizado tornou-se prática usual na cultura da cana.
Preocupados em resolver esse problema, investimos no desenvolvimento de um novo projeto de plantadora que pudesse funcionar dentro dos parâmetros ideais do plantio mecanizado da cana, sem a influência do operador. Assim, depois de vários anos de pesquisa sobre a viabilidade do projeto e de duas safras de desenvolvimento do protótipo a campo, o que era futuro tornou-se presente: a plantadora de cana totalmente automatizada.
Três objetivos básicos nortearam o desenvolvimento desse novo projeto:
1. Diminuir o consumo de mudas;
2. Funcionar eficientemente sem operador;
3. Não transferir os comandos da plantadora para o tratorista, mesmo com o uso de piloto automático.
Visando ao primeiro objetivo, para diminuir o consumo de mudas, a plantadora foi equipada com uma esteira com ângulo invertido e com um encoder instalado em seu eixo, que permite calibrar a velocidade da esteira em RPM. Com isso, a plantadora devolve para a caçamba o excesso de mudas da esteira, fazendo com que apenas os rebolos presentes nas taliscas sejam distribuídos no sulco de plantio.
Dessa maneira, para cada variável, como variedade da cana, idade da muda, tamanho do rebolo e dano nas gemas na colheita, é possível calibrar a esteira para distribuir o número necessário de gemas por metro linear de sulco e, consequentemente, aferir-se a quantidade de mudas consumida em toneladas por hectare. Em atenção ao segundo objetivo, de funcionar eficientemente sem operador, a plantadora conta com um Centro Lógico Programável (CLP) onde todas as operações da máquina são programadas eletronicamente e são “ligadas” através de um simples toque na tela touch screen de uma Interface Homem Máquina (IHM) instalada na cabine do trator.
Assim, quando o tratorista alinha o conjunto e abaixa o sulcador da plantadora, para iniciar o plantio, o circuito eletrônico é fechado, e todas as operações da plantadora começam a funcionar de acordo com as calibragens das dosagens previamente realizadas. Conforme as esteiras vão distribuindo os rebolos nos sulcos de plantio, para manter o fluxo dos mesmos na altura ideal das esteiras para serem transportados até as bicas, a plantadora possui sensores que acionam eletronicamente os empurradores traseiros, mantendo as esteiras abastecidas até o término da carga de rebolos.
Dessa forma, o terceiro objetivo foi atendido, ou seja, o tratorista não precisa operar nenhum controle da plantadora, apenas dar o start no sistema com apenas um toque na IHM, para a plantadora realizar todo o processo automaticamente. O monitoramento de todas as operações é feito através de um monitor instalado à frente do tratorista, que recebe as imagens de câmeras de alta definição instaladas na plantadora.
Durante todo o período do desenvolvimento do protótipo no campo, várias outras melhorias foram inseridas no projeto. Todas as áreas foram plantadas e monitoradas com quantidades menores de mudas, chegando até o mínimo de 7 toneladas por hectare, com brotação e perfilhamento uniformes, sem apresentar falhas no canavial.
Entendemos que, de início, os clientes não irão aceitar uma redução tão acentuada na quantidade de mudas, aliás, as unidades já comercializadas mostram essa tendência, mas um consumo de mudas na faixa de 12 a 14 toneladas por hectare já promove um ganho altamente significativo no custo de implantação do canavial. Acreditamos que as plantadoras automatizadas serão um marco divisório no sistema de plantio mecanizado da cana-de-açúcar. Afinal, o plantio da cana é realizado para produzir vários anos, o que requer maiores cuidados no planejamento e execução de todas suas etapas, do contrário, será difícil ganhar um bom dinheiro com a atividade.