Capitão de Mar e Guerra da Marinha Brasileira e Membro da Secretaria Executiva da CCA-IMO
A International Maritime Organization (IMO), criada em 1948, é a agência especializada das Nações Unidas para tratar dos assuntos afetos à navegação comercial marítima internacional, que dizem respeito à salvaguarda da vida humana no mar, segurança do tráfego aquaviário e proteção do meio ambiente marinho. Hoje, possui 176 Estados-Membros e muitas organizações intergovernamentais e não governamentais, algumas delas possuindo status consultivo.
A IMO está situada em Londres, Reino Unido, e o seu arcabouço regulatório é elaborado por meio de cinco comitês e sete subcomitês que se reúnem regularmente ao longo do ano em sessões híbridas, virtuais e em grupos de correspondência.
A IMO não possui ingerência sobre a soberania dos Estados-Membros, porém a navegação internacional marítima, que transporta mais de 80% de todas as cargas que se movimentam no mundo, não é possível sem a observância de suas orientações, diretrizes, códigos e convenções.
O Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho (MEPC) regula todos os aspectos, provenientes de navios, que possam impactar o meio ambiente marinho, dentre eles as emissões de gases que contribuem para o efeito estufa (GHG, sigla para Greenhouse Gases), basicamente dióxido de carbono (CO2), metano (CH3) e óxido de nitrogênio (N2O).
O Acordo de Paris concentra os esforços mundiais para a redução de emissões de GHG, mas por meio do Protocolo de Kyoto foram transferidas as responsabilidades de descarbonização do setor marítimo para a IMO e do setor aeroviário para a International Civil Aviation Organization (ICAO).
A partir desta delegação de competência, a IMO passou a empreender ações no sentido de reduzir as emissões GHG das embarcações e aprovou, em 2018, a estratégia inicial para o setor marítimo, composta por níveis de ambição (metas) e medidas de curto (até o ano de 2023), médio (2023 a 2030) e longo prazos (a partir de 2030).
As medidas de curto prazo disseram respeito à abordagem técnica e operacional das embarcações, exigindo projetos e construções menos emissivas e operações otimizadas, que implicaram, inclusive, em redução da velocidade média de cruzeiro das embarcações.
Todas essas medidas resultaram em redução da intensidade de carbono do setor diminuindo a emissão por tonelada milha transportada, mas não as emissões totais que hoje implicam em cerca de 3% de todos os GHG que são lançados na atmosfera.
Para a redução das emissões absolutas, a IMO aprovou, em 07 de julho de 2023, a resolução MEPC-377(80), que estabeleceu metas de redução de emissões totais líquidas, o que implica em contabilizar o upstream e o downstream, levando em consideração o que foi liberado na produção e distribuição dos combustíveis, bem como o que foi emitido a bordo.
O nível de ambição mais elevado é o que fixou para 2050 o prazo para que as emissões líquidas totais sejam zero. As novas metas vão exigir um grande esforço da frota mundial, bem como trarão altos custos a serem pagos pela tecnologia menos emissiva e combustíveis de zero ou quase zero carbono em sua composição.
Diante desta conjuntura, ganhou importância uma avaliação prévia do impacto sobre os países decorrente das medidas de mitigação a serem implementadas pela IMO a partir do ano de 2027, de forma que sejam privilegiadas as medidas que impliquem nas maiores reduções de emissões aliadas aos menores impactos sobre a população mundial.
Outro aspecto que se tornou relevante foi o denominado de food security, pois algumas rotas que transportem alimentos ou seus insumos podem ser desproporcionalmente prejudicadas em termos de custos e trazer sérias consequências para a alimentação das populações dos portos de destino.
A sessão 83 do MEPC, agendada para o início de abril de 2025, será decisiva para que todos os aspectos das medidas voltadas à consecução das metas da estratégia da IMO sejam aprovados e adotados antes do fim daquele ano de forma a poder entrar em vigor no ano de 2027.
A delegação brasileira vem empenhando um importante papel no sentido de contribuir para que o conteúdo das providências necessárias à descarbonização do setor marítimo internacional seja suficiente para o atingimento das metas e constitua o menor prejuízo para os países.
Levou também para os debates a nossa expertise na produção, distribuição e regulação dos biocombustíveis que deverá integrar o portifólio de energia sustentável, implicando em pouco retrofit da frota hoje em operação, o que contribui para minimizar os elevados custos que o setor deverá pagar para conseguir a sua descarbonização.
Finalmente, mas não menos importante, é de se destacar o apelo que a IMO faz aos países para que invistam na infraestrutura dos seus portos de forma a não prejudicar a eficiência energética dos navios, por meio de atrasos nas autorizações de entrada e saída de navios, bem como para reduzir os períodos necessários à carga e descarga.
Com todas estas ações, a IMO vem dando um grande exemplo de eficiência nas ações voltadas a reduzir o aquecimento global decorrente das ações humanas e cumpre com louvor a missão a ela atribuída pelo Protocolo de Kyoto.