Presidente do Sindaçúcar - AL
Op-AA-08
A necessidade ou não da formação de um estoque estratégico de álcool combustível e a sua influência na estabilidade da oferta e na redução da volatilidade do preço ao consumidor brasileiro devem ser precedidas de reflexões, a partir da gênese introdutória do álcool como combustível em nosso país. Pela urgência na implantação dessa oferta alternativa de combustível, o consumidor brasileiro foi agraciado por políticas públicas que, não só tabelavam o preço do álcool, mas também o favorecia, frente ao preço da gasolina, mantendo a cadência da oferta oficialmente controlada, equilibrando-a sempre com a procura.
Tudo isso recepcionado, harmonicamente, pelo cenário dos choques internacionais do preço do petróleo dos anos 70. O Brasil demonstrou a possibilidade imediata de implantação de um programa de combustível alternativo para oferta aos brasileiros, bem como, ao longo dos anos, a sua capacidade de manutenção.
Nos momentos iniciais dessa atitude, que para muitos parecia uma aventura, a dinâmica da economia nacional e internacional não conhecia os ditames do que viria a ser a regra de convivência entre os agentes econômicos, a partir dos anos 90, a chamada onda da internacionalização da economia, trazendo consigo, dentre outros fundamentos, o esforço do Estado em intervir menos na economia e a substituição acelerada das políticas públicas, pelas regras ditadas pelos mercados.
No caso brasileiro, essa onda surfou na mesma ocasião em que as pranchas do erário fiscal começaram a dar sinais de fadiga e a administração do processo inflacionário doméstico desconsiderava custos para fixação de preços dos combustíveis, inclusive os dos derivados de petróleo, quando referenciados a preços internacionais. Por opção, sonegava-se ao consumidor a influência da menor ou maior oferta da safra para o álcool e, muito menos, eventuais influências sobre o seu preço.
A regra de mercado, para o setor sucroalcooleiro, expôs, de forma inexorável, aspectos da dinâmica setorial, nunca antes explicitados, como a sazonalidade da oferta; a influência climática, cada vez mais errática, na formação do volume anual da cana-de-açúcar para a fabricação do álcool e os seus efeitos nos preços; a sensibilidade ao volume de demanda requerida, em função do maior ou menor crescimento do PIB e seus efeitos sobre a renda e a oferta de veículos; a estratégia das empresas, frente às oportunidades para a sua consolidação, ou mesmo expansão pelas imposições mercadológicas; e os impactantes picos de demanda internos ou externos, que, de forma surpreendente, porém, alvissareira, ficam à margem do planejamento empresarial, possível para aquele período de produção.
Logo, a partir destas situações, deve-se avaliar a necessidade da existência de um estoque estratégico ou regulador de álcool combustível, considerando a realidade brasileira de não existência de recursos públicos para tal, e a pouca disponibilidade de poupança privada ou de fontes de recursos para fazê-lo, como ação de mercado e não como política pública.
E sobre outro ângulo, como conciliar a segregação para estoques de parte de uma produção menor, para cobrir a dinâmica da demanda maior que se apresenta. Planejar a conjuntura atual sucroalcooleira, considerando o amplo noticiário deflagrado, por ocasião da última entressafra, força-nos a desenvolver e analisar estratégias, com o seguinte contexto:
a. os ocasionais estreitamentos de oferta, por razões sazonais e adversidades climáticas e suas repercussões no preço;
b. as reduções ou cancelamentos de contratos de exportação podem acentuar as incertezas de países importadores, nesse momento em que governo e iniciativa privada desenvolvem uma verdadeira cruzada para oportunizar a presença competitiva legítima do Brasil nessa atividade;
c. no que diz respeito ao atendimento para o consumidor nacional, não haverão mais paralisações por falta de combustível, pois a indústria automobilística nacional passou a disponibilizar veículos flexíveis a álcool ou a gasolina, elemento de grande importância nessa transição, para que os projetos em curso do parque alcooleiro nacional ofertem um volume de álcool suficiente para toda a frota circulante de veículos leves.
Assim, a formação de estoques, dentro da dinâmica regular da produção, do consumo e das exportações de produtos sucroalcooleiros para os novos mercados conquistados pela competência advinda da nossa melhor competitividade econômica, será a conseqüência, não de um programa ou política pública, mas, do esforço e das estratégias de mercado, inerentes a todos os elos da cadeia produtiva, utilizando, para tal, estratégias de escoamento, antecipações de safra, quando possível, mutação do regime spot de comercialização doméstica de álcool para negócios futuros, em regime de contratos, linearização das saídas externas, através de financiamentos com funding da própria venda, etc.
Enfim, estoques, antes de serem um amontoado de volume dentro de tanques, podem ser, em termos da realidade desse nosso mercado, a convergência desses mecanismos. Lembrando-se que, atualmente, encontram-se em expansão, não necessariamente com simetria, a oferta da produção nacional e a demanda requerida pelos carros flexíveis e pela ocupação do Brasil no mercado internacional do etanol, a partir da vigência do Protocolo de Kyoto e pelas sinalizações altistas do finito petróleo. Estamos pagando as contas momentâneas de um surto de sucesso, conseqüente dos esforços públicos e privados. O setor está maduro para superar, como vem superando, com a sua expertise, vocação para parcerias com o governo e demonstração de sua responsabilidade perante a nação.