Me chame no WhatsApp Agora!

Oswaldo Godoy Neto

Gerente de Pesquisa Tecnológica do CTC

Op-AA-32

Tecnologias industriais consolidam vantagem agrícola

A liderança do CTC - Centro de Tecnologia Canavieira, em pesquisa e desenvolvimento no setor sucroalcooleiro, conquistada ao longo de mais de 40 anos de dedicação ao setor, exige uma postura constante: manter-se sempre atento às novas tecnologias disruptivas disponíveis em todo o mundo, exatamente aquelas que provocam melhoria do rendimento, de modo a aumentar a produtividade industrial.

Essa responsabilidade se torna maior pelo fato de vivermos em um país que almeja a liderança no aproveitamento integral da biomassa e que conta com um ambiente adequado ao seu objetivo: a maior biodiversidade do planeta, irradiação solar e água em abundância. Por último, mas não menos importante, o País é pioneiro na produção em escala de biocombustível da cana.

Para implementar as tecnologias inovadoras e que incrementam a produção, há necessidade cada vez maior de pesquisas e conhecimento técnico especializado, que exigem grandes investimentos. Áreas diretamente ligadas à indústria, como o processamento bioquímico, termoquímico e a biorrefinaria, contam também com estratégia de apoio técnico de novos sistemas, como o de recolhimento e aproveitamento da palha.

Também existe a possibilidade de utilizar algas nesse processo, para evitar o desperdício do dióxido de carbono que exala da fermentação, aumentando o potencial de geração de biomassa utilizável. Esse universo rico de possibilidades técnicas, com potencial significativo, nos remete à necessidade de mais dedicação e esforço conjunto de áreas especializadas da ciência de ponta, que aprofunda o legado da Revolução Industrial do século XIX, incorporando inovações surpreendentes do século passado, já antevendo o salto de qualidade que nos prometem as próximas décadas.

Na área de Pesquisa e Desenvolvimento do CTC, existe consenso de que, com a aplicação de novas tecnologias disruptivas, poderemos até triplicar a taxa de inovação do setor sucroalcooleiro. Hoje, por exemplo, temos uma produtividade de etanol de 7 mil litros por hectare por ano. Com a aplicação de novas tecnologias industriais, poderemos incrementar em até quatro vezes a produtividade industrial. A previsão é atingir, em 15 anos, a produção em torno de 28 mil litros por hectare.

Nesse caso, ficamos na dependência da disponibilidade da biomassa em quantidade significativa, sempre lembrando que o bom resultado final é consequência de uma conjugação de tecnologias aplicadas nas áreas agrícola e industrial. Temos algumas vantagens, como excelente potencial de produção de biomassa, clima, sol, água em quantidade e terras férteis, além de uma agroindústria experiente e produtiva, que nos facilita a liderança nesse setor: quase 30% da matriz energética já vêm desses recursos renováveis.

Estamos com o foco voltado para o uso de novas tecnologias, de modo a aumentar significativamente a produtividade industrial. Não se deve ignorar que essa biomassa à base de lignocelulose é a única fonte de carbono que pode, a longo prazo, substituir fontes fósseis como o petróleo.

Mas esse processo de substituição da indústria baseada em matérias-primas fósseis pela indústria química orgânica, com o uso da biomassa, é demorado: os materiais lignocelulósicos têm composição complexa e precisam ser desconstruídos através da rota bioquímica ou da rota termoquímica. Toda biomassa é composta de celulose, hemicelulose e lignina, e nosso empenho é trabalhar a sua decomposição. Duas rotas são muito promissoras.

Na rota bioquímica, são usadas leveduras e outros micro-organismos que metabolizam e transformam a biomassa em outros produtos químicos. Da cana-de-açúcar se extrai, por exemplo, a sacarose, usando uma levedura que se chama Saccharomyces cerevisiae – cujo genoma já foi sequenciado –, que transforma o açúcar em etanol. No processamento bioquímico, existe a possibilidade do uso de novas tecnologias disruptivas, por exemplo na produção de biodiesel à base de leveduras geneticamente modificadas.

Na fabricação do etanol de segunda geração, a celulose é decomposta via enzimas, produzindo hexoses e pentoses (C5 e C6 - açúcares com cinco ou seis carbonos), que fermentam e produzem etanol. Pelo potencial existente para a fabricação de etanol de segunda geração, a previsão é praticamente dobrar a produção de etanol por tonelada de cana em vinte anos.

A eficiência industrial, por tudo isso, precisa aumentar significativamente através da rota bioquímica, na qual se usam micro-organismos que metabolizam o açúcar da biomassa. Estamos bastante avançados e prontos para construir uma planta de demonstração de etanol celulósico, acoplada a uma usina tradicional.

Já na chamada rota termoquímica, a gaseificação  houve relativa perda de terreno nos últimos anos, em função do reduzido número de projetos desenvolvidos. Mas, em minha opinião, essa rota tem grande futuro. Já pela rota termoquímica, ocorre uma queima da biomassa controlada para depois recompô-la. É uma área com tradição e uma tecnologia já reconhecida no setor de carvão, petróleo e gás, mas que pode ser usada também na área de biomassa.

Só que a biomassa é mais complexa, pois apresenta problema de heterogeneidades, baixa densidade e altos custos logísticos. Esse desafio, se vencido, poderá dar grande impulso ao setor, já que tem potencial de aumento da exportação de eletricidade da ordem de 100%. A gaseificação ocorre quando a biomassa reage com água e oxigênio e produz um gás que precisa de limpeza e tratamento catalítico.

Feito isso, poderão ser utilizados outros processos conhecidos, como a síntese de Fischer Tropsch e a síntese de Metanol, porém sempre de olho no grande desafio: o processamento e o manejo dessa biomassa.

Ainda dentro do nosso foco atual, que é o aumento da produtividade industrial, teremos que nos empenhar na montagem da biorrefinaria, considerada a usina do futuro, para substituir produtos e processos baseados em fontes de matérias-primas não renováveis, sobretudo o petróleo, por produtos de maior valor agregado e processos que utilizem a biomassa como matéria-prima. Nunca escondemos que o lado forte do CTC é o poder de integração de novas tecnologias.

Existem outras tecnologias disruptivas cuja eventual utilização, como o uso de CO2 (dióxido de carbono) da fermentação, que hoje é desperdiçado, estamos analisando. Esse produto químico alimenta micro-organismos como algas, que podem, teoricamente, gerar óleo diesel, proteínas e carboidratos aproveitáveis. Com essa tecnologia, a previsão é de aumento de 30 a 50% a mais de litros de álcool por tonelada de cana equivalente.

Outra rota de pesquisa do CTC é maximizar a biomassa disponível, utilizando a palha que está no campo. Com a mecanização, uma vez que se prevê o fim da queima da cana até 2017, o Brasil pode gerar 13 mil MW a mais de energia, mais de 10% do que o País inteiro consome. Ou o equivalente à produção de energia de três usinas de Belo Monte. Com as melhorias pretendidas, a biomassa será economicamente viável, melhor e mais eficiente do que o petróleo. O que ainda não é.

Em geral, quero dizer que P&D industrial precisa de grande suporte financeiro, mesmo porque precisamos de plantas de demonstração, que são muito caras. Depois da bancada do laboratório de pesquisa industrial, se monta uma planta de desenvolvimento de processo, que, em outra escala, precisa demonstrar as diferentes formulações do processo.

Só então é que se vai para a planta piloto – um centésimo de uma planta industrial –, antes da planta de demonstração, onde o novo processo é exibido, já com o equipamento industrial. O custo desses novos processos se reduz após as primeiras aprendizagens. Esse é o desafio que estamos enfrentando e entendemos que é a forma ideal para obter, com menor custo e menos  tempo, as inovações tecnológicas, que produzem impacto significativo não só no setor, mas também na economia e no desenvolvimento social do País.