Consultor da Delfini Consultoria e Projetos Industriais
Op-AA-37
O processo de extração do caldo exige níveis elevados de desempenho para torná-lo técnica e economicamente viável no contexto de toda a cadeia produtiva. Atualmente, existem apenas dois processos de extração do caldo da cana utilizados comercialmente, o processo de moagem e o processo de difusão. Por motivos diversos, o desenvolvimento de um ou outro processo ocorreu de forma diferenciada nos países tecnologicamente mais avançados na agroindústria da cana-de-açúcar.
Na primeira metade da década de 70, o Brasil iniciou o desenvolvimento de sua tecnologia de extração, com foco essencialmente na capacidade de processamento. Esse desenvolvimento foi direcionado ao processo de extração por moagem, uma vez que o Brasil já possuía, naquela época, uma considerável quantidade de usinas, todas com moendas.
O principal responsável por esse desenvolvimento foi o Centro de Tecnologia Coopersucar - CTC, que, com o apoio de uma consultoria da África do Sul, a Deon Hullet do Brasil, soube agregar o que de melhor existia nas tecnologias da Austrália e da África do Sul. Convém notar a presença, em todas as situações, de um centro de tecnologia no desenvolvimento bem-sucedido da tecnologia aplicada aos processos específicos da agroindústria canavieira, como o Sugar Research Institute - SRI, na Austrália, o Sugar Manufacturing Research Institute - SMRI, na África do Sul, e o CTC, no Brasil.
Basicamente, essa tecnologia de extração pelo processo de moagem consistia na instalação do rolo de pressão ou 4º rolo, no sistema de alimentação por gravidade utilizando calhas de alimentação Donnelly, nos frisos com passos e ângulos adequados ao melhor preparo da cana dos desfibradores, nas soldas especiais aplicadas aos frisos das moendas e no sistema de embebição composta para uma diluição mais eficiente do caldo. Uma diferença significativa em relação às tecnologias da África do Sul e da Austrália foi a utilização de velocidades de operação mais elevadas.
Ao contrário do que se esperava, tanto a capacidade como a extração sofreram significativas melhoras. Nessa primeira etapa, incrementos da capacidade de 45 a 50% e de até 3 a 4 pontos percentuais na extração em relação à condição anterior foram atingidos. Exemplificando, uma moenda de 78” que operava com capacidade em torno de 6.600 t/dia teve sua capacidade aumentada para 10.000 t/dia, com aumento da extração de, no máximo 92% para 95%.
Isso foi conseguido com investimentos relativamente baixos no parque de moendas existente na época, viabilizando os demais investimentos necessários à ampliação da produção de açúcar e, principalmente, de etanol. Ao longo das décadas de 80 e 90, devido ao melhor domínio das condições operacionais, à melhor qualificação e treinamento dos operadores, à introdução e ao aumento da automação nas moendas, das condições de soldagem das moendas e a diversas melhorias mecânicas adicionais nos componentes e equipamentos do processo de moagem, a extração pôde atingir níveis muito próximos aos dos melhores do mundo açucareiro, chegando a valores de 97 a 97,5% e, usando novamente a moenda do exemplo, sua capacidade foi alterada para 11.000 t/dia.
No final da década de 90, mais uma vez os técnicos do setor encontraram soluções que permitiram novos incrementos significativos da capacidade, com investimento relativamente reduzido. Essas soluções contemplavam a alteração da geometria e o aumento do diâmetro dos rolos das moendas convencionais, sem alteração da sua bitola.
Foi o advento das moendas conhecidas como repotenciadas, transformando, por exemplo, uma moenda 30”x54” em 34”x54”, uma 34”x66” em 37”x66”, uma 37”x78” em 42”x78” e assim por diante. O incremento da capacidade foi da ordem de 30 a 35%, levando aquela moenda do exemplo para moagens da ordem de 14.000 a 15.000 t/dia, com potencial de chegar a 17.000 t/dia com aumento da rotação para 8,5 a 9,0 rpm. Se considerarmos o final da década de 90, podemos observar um aumento da ordem de 110 a 125% em relação à capacidade antes do início do desenvolvimento da tecnologia de extração por moagem, atualmente podendo chegar até 150 a 160%, com o aumento da rotação.
Nas unidades instaladas após o ano 2000, observa-se a tendência de utilização de moendas maiores que as comumente utilizadas anteriormente, com bitolas de 90 a 100”, já com configurações geométricas ampliadas, capazes de processar em torno de 30.000 t/dia em um único conjunto. Em resumo, os níveis atuais de capacidade de moagem praticados nas moendas brasileiras são extremamente elevados e muito superiores aos praticados na maioria dos países, com níveis de extração, se não iguais, muito próximos aos melhores resultados de outros centros açucareiros.
No final da década de 80, após uma tentativa anterior, o Brasil iniciou, efetivamente, a implantação do processo de difusão em algumas unidades novas e, posteriormente, já na década de 90, também na ampliação de algumas unidades existentes. Após um período sem investimentos significativos em unidades novas ou na ampliação das existentes, a partir da primeira metade da primeira década deste século, houve uma grande expansão na quantidade de difusores instalados no Brasil, chegando mesmo a mais que dobrar a quantidade de difusores instalados em nosso país. Isso ocorreu, principalmente, devido à expectativa de menor consumo de energia, menores custos de operação e, especialmente, de manutenção, quando comparado ao processo de extração por moagem.
Assim, a implantação da tecnologia de extração por difusores é relativamente recente no Brasil, e podemos considerar que ainda estamos na curva de aprendizado em relação a ela. Assim como aconteceu com a tecnologia de moagem, o nosso foco nas condições de operação desse processo já se mostra divergente em relação ao de sua origem, uma vez que a capacidade continua sendo a maior prioridade na nossa indústria.
A experiência tem mostrado que o difusor tem uma boa flexibilidade em relação à capacidade de operação, porém muito menos flexibilidade em relação à extração, uma vez que, operando em níveis de capacidade muito elevados, devido à redução do tempo de retenção da cana no difusor, é praticamente impossível manter níveis elevados de extração. Para melhorar as condições de extração e garantir capacidades elevadas, alternativa como a instalação de 1 terno de moenda antes do difusor, transformando-o em difusor de bagaço, tem sido considerada pela nossa indústria. Uma limitação importante no caso dos difusores se refere à sua capacidade máxima.
Enquanto as moendas podem atingir capacidades unitárias em torno de 30.000 t/dia, dificilmente uma unidade de difusor pode atingir essa mesma capacidade com apenas uma unidade, atualmente ficando limitados a aproximadamente 65% da que pode ser conseguida com moendas. Um fator relativamente novo para ambos os processos e que, certamente, afeta a ambos, porém de forma diferenciada, refere-se à qualidade da cana, que tem se alterado muito nos últimos anos com o aumento da colheita mecânica e, principalmente, pelo maior aproveitamento de resíduos vegetais.
Essa condição afeta negativamente tanto a extração como, principalmente, a capacidade, o maior foco de nossa indústria, e o difusor tem se mostrado muito mais sensível a esse fator do que a moenda. Ainda temos algo a aprender com relação à operação dos difusores nessa condição, experiência que também não existe nos países de origem dessa tecnologia, onde a qualidade da matéria-prima ainda se mantém em níveis muito melhores.
Assim, a velha pergunta sobre qual dos processos é o melhor ainda vai continuar algum tempo sem resposta, pois ela depende de uma série de fatores e, principalmente, de um melhor aprendizado em relação ao uso da tecnologia de extração com difusores nas nossas condições de operação, considerando, especialmente, os aspectos da qualidade da matéria-prima e sua influência na extração e na capacidade de processamento.
Lembrando que, na análise de investimento inicial e consumo de energia, é conveniente apurar com mais propriedade a necessidade de equipamentos adicionais no caso de instalações com difusores, considerando a necessidade de 1 terno antes do difusor ou um maior comprimento do difusor de cana para garantir o tempo de retenção em seu interior, instalação de 2 ternos no final do conjunto para garantir umidade satisfatória para o bagaço final, além de uma melhor avaliação das características construtivas disponíveis atualmente, como o de fundo fixo com correntes, de fundo móvel com correntes e, mais recentemente, o difusor sem correntes (chainless diffuser), com suas diversas vantagens e desvantagens.