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Cesário Ramalho da Silva

Presidente da SRB - Sociedade Rural Brasileira

Op-AA-38

Etanol para escanteio

O congelamento artificial do preço da gasolina como medida de controle da inflação vem gerando uma série de prejuízos para o setor sucroenergético, para a Petrobras, para a economia do País, para o meio ambiente e para a nossa saúde. Sem capacidade de produção e refino suficientes para atender à demanda interna, já há um bom tempo, a Petrobras está sendo obrigada a importar gasolina e óleo diesel a volumes cada vez maiores, com valores de compra no mercado internacional acima do preço de revenda. Estima-se que a defasagem possa chegar a 30%.

Dados da ANP mostram que os gastos com a importação de gasolina saltaram de US$ 71 mil, em 2009, para US$ 3 bilhões, no ano passado. O desarranjo na importação de combustíveis queima divisas do País e corrói o caixa da Petrobras. A recente alta do dólar agravou o quadro, pressionando ainda mais as contas da empresa, que, publicamente, já cobrou um reajuste nos preços.

O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, já confirmou que a Petrobras pediu um aumento de até 15%. O governo subsidiou a compra de automóveis, elevando a necessidade de combustíveis, mas não se preocupou com a capacidade de oferta e não a planejou. Com a inflação em alta, e a Petrobras no sufoco, a equipe econômica se vê numa encruzilhada entre alimentar o dragão da inflação reajustando os combustíveis, ou continuar a dilapidar o orçamento da Petrobras, os dividendos dos acionistas da empresa, o patrimônio do País, mantendo os preços vigentes.

Na órbita desse imbróglio, tratado como coadjuvante pelo governo, está o etanol e, a reboque, todo o setor sucroenergético nacional, o mais eficiente do mundo e uma das cadeias produtivas mais importantes da economia brasileira. O segmento da cana-de-açúcar emprega, diretamente, 2,5 milhões de trabalhadores, reúne cerca de 400 usinas, 80 mil fornecedores e quatro mil indústrias de base, distribuídos em mais de 600 municípios, que produzem acima de cinco mil hectares de cana por ano.

A política de subsídio à gasolina tirou consumidores do etanol, provocando uma desorganização acentuada do segmento. Recente seminário na Orplana escancarou a trágica situação de pequenos e médios produtores de cana, que estão sendo expulsos da atividade e entregando suas propriedades a grandes grupos. Nas duas últimas safras, cerca de 44 usinas deixaram de moer cana, e, se nada mudar, esse número poderá aumentar para 54 na próxima temporada. No período, 100 mil empregos foram extintos. As indústrias do segmento não têm encomendas e trabalham a 50% da sua capacidade nominal. Soma-se a isso o triste cenário marcado pela total ausência de projetos de novas plantas, como demonstra a carteira de consultas do Bndes.

Nos leilões públicos, o valor pago pela energia gerada pelo bagaço da cana é baixo, entre outros motivos, pela falta de critérios técnicos no formato dos leilões, que misturam várias fontes de energia numa mesma operação. Não há valorização dos benefícios gerados por fontes renováveis e limpas, deixando-as em igual condição de disputa com as de origem fóssil. Ademais, mesmo com a redução do superávit nos estoques mundiais de açúcar, a oferta ainda é enorme, e o produto que vinha sustentando o caixa do setor sucroenergético perderá fôlego financeiro para continuar pagando a conta. 

A ausência do setor sucroenergético nos planos estratégicos do governo denota, no mínimo, omissão das autoridades federais quanto aos riscos de sobrevivência que o segmento está correndo. São 40 anos de trabalho, desde o início do Proálcool, que estão escorrendo pelo ralo. Diante desse quadro preocupante, a única certeza existente é que, em alguma hora, o ajuste na política de preços de combustíveis terá que ser feito. Não menos importante é o governo definir, de uma vez por todas, qual é a matriz energética que deseja e qual o papel do etanol nesse modelo.

O setor sucroenergético não reivindica royalties, subsídios ou suporte oficial de prejuízos. O segmento quer única e exclusivamente um ambiente regulatório qualificado, com objetivos claros, segurança jurídica e menos intervencionismo, criando um cenário com mais previsibilidade para tomada de decisão do setor privado e de investidores.

Por fim, cabe destacar que a Sociedade Rural Brasileira – SRB, é uma das entidades apoiadoras da Frente Parlamentar de Defesa do Setor Sucroenergético, lançada no início de outubro na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Coordenada pelos deputados estaduais Roberto Morais e Welson Gasparini e apoiada por representantes de 12 partidos políticos, a Frente tem por objetivo chamar a atenção do Governo Federal e de toda a sociedade para os problemas que a indústria da cana e do etanol vem enfrentando nos últimos anos.

O apoio de produtores, fornecedores de cana, prestadores de serviço, parceiros e trabalhadores, além dos prefeitos de inúmeros municípios, todos diretamente impactados pela situação, é o que garante legitimidade à Frente, que nasce para buscar soluções em prol de uma energia ecologicamente correta e 100% renovável.