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Plinio Mário Nastari

Presidente da Datagro

Op-AA-37

O momento atual

Após vertiginoso crescimento nos primeiros dois terços da década passada, o setor canavieiro e sucroalcooleiro passou a enfrentar desafios relacionados à crise financeira, clima adverso, valorização do real frente ao dólar, que corroeu a competitividade do setor frente aos seus concorrentes no mercado mundial e frente aos derivados do petróleo, legislação cada vez mais exigente e onerosa nas relações trabalhistas, redução da oferta de emprego, pressão para investimentos crescentes na mecanização do plantio e da colheita e, para completar tudo isso, uma política fiscal e de preços para os combustíveis que não privilegia o combustível renovável, mas, ao contrário, desonera e subsidia o preço da gasolina ao consumidor.

Essas circunstâncias fizeram com que, até a safra passada, o setor convivesse com déficit de matéria-prima, alavancando ainda mais o custo de produção, já pressionado pelos demais fatores. A dívida de muitas empresas, a pressão por investimentos em mecanização e os custos de mão de obra aumentaram substancialmente.

Alguns dos componentes da crise atual começam a ficar superados ou amenizados. O clima parece estar voltando à normalidade, apesar das chuvas de inverno de 2013 no Centro-Sul, a seca no Nordeste e as geadas deste mês de julho. O câmbio está tendendo a um patamar mais próximo do equilíbrio de longo prazo, que estaria hoje perto de R$ 2,40 por dólar, e os efeitos da política de preços que subsidia a gasolina tendem a ficar cada vez mais restritos, mesmo que o governo insista em sustentá-la, à medida que a tendência é de diminuição da participação do hidratado no mix de produção e comercialização de derivados da cana.

É lamentável que não se tenham criado condições estáveis para que investimentos produtivos sejam planejados e executados visando atender às oportunidades de demanda que existem no Brasil e no exterior. A falta de uma política consistente de longo prazo resulta em irreparável perda de oportunidade para a sociedade. Ao aceitar como opção inescapável a importação de gasolina, ao invés de estimular a produção de energia líquida, limpa e renovável, no mercado interno, o País deixa de gerar emprego e renda no mercado interno e manda para o exterior valiosos recursos que não voltam mais. Não é esse tipo de política e de visão encontrada em países ciosos da importância do fortalecimento de seus mercados internos.

O setor de açúcar e etanol do Brasil é, algumas vezes, lembrado por sua contribuição à balança comercial, dada a sua expressiva participação no comércio internacional, em que, apesar de todas as vicissitudes, ainda representa praticamente 50% das exportações mundiais de açúcar e quase 60% das exportações de etanol.

As exportações de açúcar atingiram 24,34 milhões de toneladas em 2012, e 11,80 milhões de toneladas no primeiro semestre de 2013. O valor total dessas exportações foi de US$ 12,84 bilhões em 2012, e US$ 5,46 bilhões na primeira metade de 2013. As exportações de etanol ainda estão longe do recorde de 5,12 bilhão de litros atingidos em 2008, mas, ainda assim, têm gerado uma contribuição expressiva. Em 2012, foram exportados 3,1 bilhões de litros, gerando US$ 2,19 bilhões de receita, e, no primeiro semestre de 2013, foi exportado 1,15 bilhão de litros, com receita de US$ 772 milhões.

As importações de etanol têm sido regionalizadas e destinadas aos mercados das regiões do Norte e do Nordeste, que enfrentam quebra de safra há dois anos consecutivos e pelos elevados custos da logística interna do Brasil para o transporte do produto a partir dos estados do Centro-Sul. Em 2012, foram importados 545 milhões de litros, com dispêndio de US$ 379 milhões, e, na primeira metade de 2013, foram importados 96 mihões de litros, com dispêndio de US$ 66 milhões. No entanto a avaliação do impacto desse setor na balança comercial deve levar em conta também o volume e o valor da gasolina importada substituída pelo etanol. O Brasil continua importando gasolina para suprir o seu consumo doméstico, com dispêndio significativo de divisas. Considerando que, em 2012, o preço médio da gasolina importada pelo Brasil foi de US$ 0,797 por litro e que, no primeiro semestre de 2013, foi de US$ 0,751 por litro, o dispêndio de divisas evitado pela substituição de gasolina por etanol foi de US$ 11,83 bilhões em 2012 e de US$ 5,78 bilhões no primeiro semestre de 2013.

Portanto o impacto do setor sucroalcooleiro na balança comercial, considerando o valor das exportações de açúcar e etanol, o valor das importações de etanol e o valor da gasolina importada substituída, foi, em 2012, de US$ 26,48 bilhões e, até a primeira metade de 2013, de US$ 11,94 bilhões. Esses valores demonstram que esse é um dos setores mais relevantes para o equilíbrio do Balanço de Pagamentos e que os objetivos preconizados na concepção original do plano de diversificação da indústria na direção do etanol, iniciado em 1975, durante o Governo Ernesto Geisel, têm sido plenamente atingidos.

Enquanto o País dispende atualmente US$ 0,751 por litro de gasolina importada, que à taxa de câmbio de R$ 2,25 por dólar equivalem a R$ 1,69 por litro, o etanol anidro que substitui gasolina diretamente nos motores numa relação de 1:1 é vendido pelos produtores a um preço livre de impostos de R$ 1,26 por litro. O etanol hidratado, que tem uma equivalencia de 70% em volume com a gasolina, é vendido pelos produtores a R$ 1,09 por litro (preços de 11 de julho de 2013). O ânimo dos produtores para produzir, investir em expansão da produção e saldar financiamentos contraídos no ciclo anterior de investimentos, com certeza, seria maior caso pudessem vender etanol anidro ao mesmo preço que o País dispende para importar gasolina.

Tanto no caso do anidro, quanto no caso do hidratado, o preço do etanol enxergado pelo consumidor deveria incorporar, pelo menos parcialmente, o valor de suas externalidades, amplamente reconhecidas nos campos ambiental e de promoção do desenvolvimento econômico descentralizado, que geram grande economia de investimentos em infraestrutura nos grandes centros urbanos, geralmente de responsabilidade do setor público.

Ao privilegiar o controle do preço, estagnado desde setembro de 2005, e ao reduzir a tributação sobre a gasolina, eliminando a CIDE, usada no transporte individual, em detrimento da geração de receitas capazes de viabilizar investimentos mais intensivos em transporte público de qualidade, a política atual tem induzido os agentes econômicos na direção contrária às metas de avanço no uso de biocombustíveis preconizadas até recentemente no próprio Planejamento Público, expresso nos detalhados e competentes estudos elaborados pela EPE e pelo Ministério das Minas e Energia.

Uma reflexão sobre os benefícios que o setor do açúcar e do etanol pode trazer para a geração de divisas e para o desenvolvimento econômico e social, mantendo a renda gerada com a produção de combustíveis dentro do País, gerando empregos, maior atividade do comércio e da indústria e também maior nível de arrecadação e equilíbrio fiscal nos níveis municipal, estadual e federal, poderia estar ocorrendo neste momento.