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Jorge Miguel Samek

Diretor-Geral Brasileiro da Itaipu Binacional

Op-AA-15

Geração distribuída e segurança energética

O Brasil reúne, hoje, todas as condições e vantagens para se tornar uma grande potência energética nas próximas décadas. Com a recente descoberta do campo de Tupi, na Bacia de Santos, asseguramos auto-suficiência em petróleo e gás natural e poderemos, ainda, ingressar no seleto clube de países exportadores. Mas, se quisermos garantir o futuro da humanidade e do planeta, a segurança energética brasileira – e mundial – deverá depender cada vez menos de combustíveis fósseis, principais responsáveis pelas emissões dos gases causadores do aquecimento global.

O Brasil conseguiu transformar-se na 9ª economia do mundo, com uma matriz energética diversificada e diferenciada, o que coloca o país em condições excepcionalmente favoráveis, para assumir uma posição de liderança no enfrentamento do efeito estufa. Atualmente, 55% da energia primária que move a economia brasileira provém de fontes renováveis, proporção bastante significativa, se comparada com a média mundial, de apenas 13%.

O contraste é ainda maior em relação aos países ricos da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE, que dispõem de apenas 6,1% de fontes renováveis, na sua matriz energética. Se consideramos, tão-somente, o suprimento de energia elétrica, a vantagem brasileira é ainda mais expressiva: 79% da nossa capacidade instalada é de fontes renováveis, com predomínio da hidreletricidade, contra 23,4% da média mundial.

Outro destaque é o pioneirismo brasileiro na área de biocombustíveis. O país respondeu prontamente ao primeiro choque do petróleo, na década de 70, com a criação do Proálcool. Graças a uma política pública arrojada, o Brasil tornou-se líder mundial na produção de álcool combustível. Hoje, outros países fazem fila para copiar nossas políticas e importar nossas tecnologias.

A conclusão é óbvia: construímos, pioneiramente, com engenhosidade e ousadia, a matriz energética que os países desenvolvidos estão avidamente buscando, premidos pelas dramáticas mudanças climáticas, associadas ao aquecimento global. A hidreletricidade, que teve um papel absolutamente central na modernização do país, continuará sendo a base da nossa matriz energética, pelas próximas décadas.

A energia hidráulica é a fonte de energia primária renovável mais limpa do mundo, se explorada com critérios rigorosos de sustentabilidade ambiental, conforme exige a legislação brasileira. Os novos projetos hidrelétricos no Rio Madeira são exemplos do extremo cuidado com que o país pretende aproveitar o enorme potencial hidráulico da região Amazônica.

É importante lembrar que o Brasil só aproveitou até agora cerca de um terço do seu potencial hidráulico, estimado, atualmente, em 261 GW. É uma dádiva da natureza. A hidreletricidade tem como vantagem adicional seu baixo custo. Além disso, o risco estratégico é mínimo, pois as usinas hidrelétricas instaladas em território nacional estão imunes às variações de humores dos mercados e às instabilidades inerentes às relações internacionais, condição fundamental para garantir a segurança energética e a modicidade da tarifa.

Não há qualquer razão, portanto, para que o país abandone a sua opção preferencial pela hidreletricidade. Ela garantirá a expansão do parque gerador nacional, indispensável para sustentar o novo ciclo de crescimento da economia brasileira.

Mas, a crescente demanda por energia elétrica não poderá ser atendida, simplesmente por meio de grandes projetos hidrelétricos. A diversificação da matriz energética é imperativa para o desenvolvimento sustentável.

Atualmente, estão em andamento no Brasil diversas iniciativas, que visam ampliar a participação de fontes não convencionais, tais como energia eólica, solar e de biomassa. Mas, mesmo essas iniciativas dependem da expansão do parque de geração hidráulica, para as viabilizar. A produção de energia eólica e solar é altamente variável, o que requer uma fonte adicional de energia para assegurar o fornecimento, qualidade essencial de qualquer sistema de suprimento de energia.

O governo Lula recuperou a capacidade estatal de investimento e de planejamento, em longo prazo, do setor energético, que havia sido comprometida durante o processo de privatização, conduzido pela administração anterior. O país aprendeu as amargas lições do apagão de 2001. Por isso, ao lado dos esforços para viabilizar novos projetos hidrelétricos, o governo federal adotou uma ambiciosa política de estímulo ao desenvolvimento de biocombustíveis e de fontes não convencionais de energia.

É neste contexto que se insere a geração distribuída de energia elétrica. A biomassa é uma alternativa viável para expandir o parque gerador nacional. O uso do bagaço de cana para produção de energia já se mostrou uma opção viável e rentável. Com o crescimento da demanda por etanol no mercado mundial, o Brasil deverá ampliar o plantio de cana-de-açúcar.

É interessante observar que a sua colheita nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste coincide com a estação de estiagem. Portanto, o uso do bagaço da cana para geração de energia poderá compensar eventual perda de capacidade de geração das usinas hidrelétricas, durante o período de baixa dos reservatórios. Mas, esta não é a única alternativa para ampliar a geração distribuída no país.

Um potencial ainda inexplorado é a biomassa residual, derivada do lixo urbano e de atividades agropecuárias e agroindustriais. Um projeto desenvolvido em parceria entre a Itaipu, Sanepar e Copel comprovou a viabilidade técnica e econômica da geração de energia elétrica, a partir da queima de gás metano, produzido por biodigestores, que processam dejetos de suínos.

A experiência, em andamento na Granja Colombari, na região Oeste do Paraná, testou, com sucesso, tecnologia desenvolvida pela Copel, para a conexão de microgeradores à rede elétrica. Além de oferecer solução para um sério problema ambiental, o aproveitamento da biomassa residual para produção de energia elétrica representa uma nova fonte de renda para cooperativas e associações de agricultores familiares.

A Itaipu Binacional, maior hidrelétrica do mundo em geração de energia elétrica, participa dessa iniciativa por reconhecer os enormes benefícios que a sociedade  poderá obter com o uso intensivo de biodigestores, para alimentar micro-geradores. Com o objetivo de contribuir no desenvolvimento de soluções criativas, como a experiência implantada na Granja Colombari, criamos o projeto Plataforma Itaipu de Energias Renováveis, vinculado ao Parque Tecnológico Itaipu.

A Itaipu está aproveitando sua capacidade institucional e técnica para desenvolver, em parceria com outras instituições, tecnologias para o desenvolvimento sustentável. O mundo volta os olhos, com grande interesse, para as soluções inovadoras encontradas pelo Brasil, para reduzir gradualmente a dependência de combustíveis fósseis.

Prova definitiva desse interesse foi a escolha do país para sediar o Fórum Global de Energias Renováveis, promovido pela Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Indústria - Onudi. Este evento, que acontecerá em Foz do Iguaçu, PR, no período de 18 a 21 de maio próximo, oferece uma oportunidade singular, para que o Brasil mostre aos demais países sua invejável matriz energética, que tem como carro-chefe a hidreletricidade.

Sobretudo, será também uma oportunidade de aprendermos com os países que estão mais avançados no uso de energia solar, eólica e de biomassa. A hidreletricidade é o esteio do nosso sistema, mas a segurança energética será maior, com a crescente diversificação da matriz energética. Fomos pioneiros e podemos continuar na liderança desse processo.