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Paulo Antonio Skaf

Presidente do Sistema Fiesp/Ciesp

Op-AA-19

Lições de casa em meio à turbulência

Em resposta à prioridade máxima do Brasil em 2009, de garantir o crescimento do PIB num cenário mundial de retração, são importantes as medidas anunciadas pelo governo, como a flexibilização dos depósitos compulsórios no Banco Central, a redução de impostos na indústria automotiva e o aumento dos investimentos públicos. Entretanto, tais providências são insuficientes, pois esbarram em problemas pontuais e estruturais não resolvidos, que dificultam bastante a reação do país à crise.

Dentre as questões pontuais, a mais urgente é garantir que os recursos injetados no sistema financeiro, por meio da liberação dos depósitos compulsórios, cheguem à economia real. Sem essa consequência prática, a medida é infrutífera e desnecessária, considerando que os bancos brasileiros, felizmente, não estão precisando de socorro.

Se esse dinheiro não for usado para financiar a produção e o consumo, é melhor que retorne ao Banco Central, sendo destinado a engrossar o investimento público. Complemento fundamental ao aumento da oferta de crédito pela utilização dos recursos dos compulsórios é a imediata redução dos juros. No presente cenário, é inadmissível a manutenção da Selic em 13,75%.

Todas as nações estão reduzindo as taxas, dando preferência ao fomento de suas economias, ante um eventual recrudescimento da inflação. O Brasil, contudo, vai na contramão desse processo, mantendo os juros reais mais altos do mundo, apesar de as previsões mais atualizadas sobre os índices inflacionários indicarem recuo em 2009.

Quanto aos problemas estruturais, um dos mais graves é a cultura equivocada dos gastos públicos. Como é possível observar na peça orçamentária para o ano novo, recentemente aprovada pelo Congresso Nacional, o custeio da União é absolutamente paradoxal ao perfil que se espera do Estado contemporâneo.

É um conjunto de despesas, resultante de várias décadas de equívocos na gestão dos organismos públicos, que continuam inchados, onerosos para os contribuintes e ineficazes no atendimento em áreas cruciais, como saúde, educação, segurança e infraestrutura. Em épocas de vagas gordas, tais distorções ficam um tanto esquecidas, mas em períodos de crise mostram-se em sua plenitude e limitam o poder de reação do Estado.

É óbvio que as medidas anunciadas pelo governo brasileiro para impedir a retração seriam mais consistentes em termos de volume de dinheiro, não fossem os recursos já comprometidos com a manutenção de uma estrutura pesada e anacrônica. Tivesse a União, assim como estados e municípios, um custeio mais racional, seriam melhores as suas condições para socorrer a economia, tanto com o aumento dos investimentos públicos, quanto por meio de redução tributária mais ampla do que a anunciada.

De maneira direta (com maior aporte financeiro em obras de infraestrutura e melhoria dos serviços públicos) e de modo indireto (permitindo que, em vez de impostos exagerados, as empresas investissem mais na produção e no mercado), o governo ajudaria muito mais o país do que lhe permite uma peça orçamentária permeada de despesas supérfluas, ante o presente cenário econômico.

Os elevados gastos estatais, é pertinente lembrar, também se incluem entre as causas dos juros altos, que refletem a generosa remuneração dos títulos públicos, com os quais o governo gira sua imensa dívida, já quase do tamanho do PIB. Tudo isso é mais grave e visível no contexto da crise. Em momentos como este, torna-se um fardo ainda mais pesado para a sociedade e os setores produtivos arcarem com uma carga tributária tão elevada quanto à brasileira.

Assim, tem um gosto ainda mais amargo, chegarmos ao final de mais um exercício e iniciarmos um novo ano - com o fator agravante da recessão anunciada nos países desenvolvidos - sem a realização da reforma tributária. É frustrante observar que sequer o projeto do Executivo, ainda longe dos anseios nacionais quanto à redução dos impostos, tenha caminhado no Congresso Nacional.

Há tempos temos alertado sobre todas essas questões, inclusive nos momentos de maior euforia dos mercados, quando os problemas ficam latentes. Mais do que nunca, o governo precisa dedicar-se à sua solução, pois a crise evidencia as fragilidades do país, ante os furacões do sistema financeiro globalizado. Não fizemos as lições de casa quando tínhamos céu de brigadeiro. Agora, teremos de realizá-las em meio à turbulência.