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Pedro Robério de Melo Nogueira

Presidente do Sindaçúcar - AL

Op-AA-19

Um ambiente para a evolução do setor sucroenergético

O calendário gregoriano impõe-nos uma tradição de, ao iniciarmos um novo ano, realizarmos uma série de exercícios para nortear as nossas atividades pessoais, profissionais ou empresariais. Esses exercícios têm grande significado para o desenvolvimento e a evolução de projetos. Em particular, o ano de 2009 requer do setor sucroenergético um aprofundado meticuloso e realista modelo de elaboração de cenários, para contextualizar o desenvolvimento setorial frente às realidades atuais, seus reflexos na evolução das empresas, na consolidação de mercados e na vida dos que integram essa extensa cadeia produtiva.

Não bastasse a preocupação dos empresários do setor com a redução de receita observada pela queda nos preços internacionais e pela taxa de câmbio vigente, num ambiente de franca expansão dos investimentos no setor, a nova realidade requer das empresas uma melhor avaliação da velocidade de implantação de seus projetos, considerando seu equilíbrio financeiro e a clareza de visão dos mercados internos e externos que se pretende atender.

Adjetiva-se essa crise das formas mais contundentes e catastróficas. A mobilização dos governos, empresas, entidades e classe trabalhadora ainda é de perplexidade e de desconhecimento da sua real magnitude e do prolongamento temporal dos seus efeitos. É racional, compreensivo e exigível que qualquer atividade ou setor da atividade econômica refaça e acautele-se no programa de inversões de capital nos projetos empresariais de expansão.

É atitude responsável avaliar os riscos que sejam reais e verdadeiros, definir o que pode ser postergado, sem comprometer o todo, e desenvolver a criatividade, a persistência e a vocação para os projetos de sua expertise. Ao analisarmos a performance mais recente do, hoje chamado, setor sucroenergético, podemos notar algumas constatações relevantes:

• O crescimento, na última década, na oferta de produtos finais está ao redor de 11% ao ano, em média, portanto, muito vigoroso;
• Esse crescimento não se verificou apenas em igual crescimento da oferta de matéria-prima, mas, por um aumento médio da produtividade industrial, em mais de 3% ao ano, o que demonstra uma melhoria significativa na competitividade e na confirmação do crescimento vertical autossustentado;
• As empresas vêm passando por profundo processo de profissionalização e reorganização societária, mediante o processo de aquisições e fusões e introdução de sistemas modernos de governança corporativas, atraindo um bom fluxo de inversões de capital externo. Atualmente, cerca de 11% da cana moída no país, localiza-se em empresas com participação de capital estrangeiro;
• O mercado interno de etanol consumido pela frota de veículos flexíveis vem crescendo de forma exuberante, alcançando parcela expressiva da oferta de veículos produzidos pela nossa indústria automobilística;
• A adesão a modelos de produção autossustentáveis pelas empresas, socioambientalmente corretos, credencia o segmento como integrado às melhores práticas no emprego e no respeito ao meio ambiente.

O arrefecimento atual no fluxo de capital externo, a incerteza quanto à velocidade de expansão para os mercados externos do etanol e a inexistência conjuntural de poupança própria do setor para manutenção dos projetos de expansão e da suas atividades operacionais, não deverá gerar, na mesma proporção, a involução da atividade ou de incertezas, no que se refere à sua viabilidade, a partir de invocações aos efeitos da atual crise financeira global.

O descompasso entre o crescimento extraordinário da oferta de produtos e a menor velocidade na agregação de novos mercados, sobretudo para o etanol no mercado mundial, deve ser a principal agenda nas deliberações empresariais para o curto e médio prazo. Assim como os marcos através dos quais dever-se-ão constituir todo o planejamento estratégico do setor como um todo e para os agentes econômicos envolvidos, valorizando, adequadamente, é claro, porém, de forma conjuntural, a turbulência presente, visto que os seus efeitos não estavam presentes na agenda de reflexões para o setor, antes dos últimos quatro meses.

Uma crise financeira na proporção que estamos vivenciando impõe-se, capitalizando todas as atenções, medidas e análises para o curto prazo. Entretanto, devemos considerar que nesses momentos de pressão extrai-se a criatividade necessária para seu enfrentamento, com medidas inéditas e ações que não recebiam encorajamento adequado para implementação.

Relendo algumas edições anteriores da Revista Opiniões, pude se constatar, nos temas abordados, o potencial de expansão do setor e a necessidade de algumas medidas estruturantes e de equilíbrio na equação - oferta e mercados. E é nesse contexto que deve ser construído o ambiente de trabalho para o setor sucroenergético. Algumas verdades positivas continuarão a frequentar essa atividade econômica e por elas que devemos direcionar as ações públicas e privadas, pois se tratam de âncoras definitivas na sua viabilização:

• Num ambiente normal de atividade econômica, sem movimentos de recessão, o petróleo terá sempre preços crescentes;
• A consciência mundial para a produção de energias limpas e renováveis, que não estimulem o aquecimento do globo, incorporou-se na pauta de todos os países desenvolvidos;
• Na vertente estratégica, a necessidade de produção de energias alternativas, para mixar a dependência excessiva da oferta de petróleo, originado dos instáveis governos do oriente médio e agora da América Latina, passa a integrar os objetivos de países desenvolvidos;
• Por essas razões, os movimentos iniciais de países desenvolvidos, para constituir o etanol combustível como uma commodity, passam a estimular a instalação de projetos para produção desse combustível em vários territórios;
• A inquestionável condição de menor custo de produção para o etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil, coloca esse segmento produtivo como consolidado em sua viabilidade econômica em regras de livre mercado;
• O potencial de produção alternativa de energia elétrica a partir do bagaço e da palha da cana-de-açúcar consolida o setor sucroenergético brasileiro numa posição de viabilidade consolidada de eficiência na produção e oferta de combustível e energia autossustentável;
• A absorção expressiva de postos de trabalho e a sua interiorização remetem esse setor para um dos mais significativos empregadores de mão-de-obra no país.

Depreende-se, pois, que essas verdades, vencidos e superados os efeitos da crise financeira mundial, tornam o setor sucroenergético como um dos mais promissores e importantes da atividade econômica brasileira. Contudo, faz-se necessário que não percamos de vista a implementação de todo um conjunto de políticas e ações público-privadas, com vistas a consolidar e dar expressão econômica empresarial às verdades acima. Essas agendas vêm apresentando alguns avanços.  

Entretanto, a) a lentidão ou indiferença dos EUA, Comunidade Europeia e Japão, dentre outros países, no sentido de reduzir as excessivas proibições de ingresso de etanol e açúcar em seus mercados; b) a ausência de uma política pública continuada, com vistas a definir a posição energética dos derivados da cana-de-açúcar em nossa matriz energética, vis-à-vis a particularidades dos demais energéticos em uso no país, no conceito da competitividade plena e direta e na valorização das externalidades dos energéticos renováveis, no conjunto institucional das políticas públicas para esse segmento, e c) a busca da consolidação de um modelo definitivo de comercialização e financiamento que contemple uma verdade “pétrea” que a sazonalidade da produção e o insuficiente sistema de financiamento de estoques.

Para atravessar o cenário econômico mundial atual sem sofrer na intensidade anunciada a magnitude dos efeitos negativos na redução do crescimento do país, no emprego e na eficiência da atividade econômica, vale afirmar, sem preciosismo, que o setor sucroenergético produz energia e combustível de menor custo, logo, contribuindo para a eficiência econômica. Ocupa um contingente de 800 mil postos de trabalho, num momento de redução de oferta de emprego, e permanece inserido na agenda das atividades autossustentáveis social e ambientais.

As empresas do setor já amargam o ajuste necessário entre o descolamento do aumento significativo da produção e o não alargamento dos mercados externos. Restam, pois, firmeza, equilíbrio e presteza para minimizar os efeitos da crise e para concretizarmos o horizonte bastante definido do futuro setorial, que era e continuará sendo o verdadeiro cenário de desenvolvimento.

Para tanto, é imperativo que as verdades positivas desse setor e a vitalidade empresarial disponível fundamentem o debate conjunto entre governo e empresas, no encaminhamento e consolidação de políticas e ações que hoje são apenas “cenários”. As medidas gerais que o governo vem tomando para minimizar os efeitos da crise financeira mundial não têm sido suficientes para possibilitar menores impactos no setor sucroenergético, dada a especificidade de situação e do potencial do impacto nesse setor.

Por esse fato, tornam-se necessárias medidas específicas e na dimensão da expressão setorial, que venham a permitir a normalidade do custeio da produção destinada ao comércio externo e adequada cobertura de crédito para formação de estoques sazonais. A esse conjunto de ações, somam-se as medidas tributárias voltadas para o futuro da competividade do etanol em cenários de incerteza com a volatilidade do preço do petróleo e para a formação de um sistema sustentável de formação de preços e comercialização de etanol futura, através da bolsa de mercadorias.

Devemos, portanto, nos orientar pelo cenário econômico mundial favorável no médio e longo prazo, conforme já demonstrado. Quanto ao presente, é inevitável nos submetermos ao ajuste perverso, que decorrerá da imposição da crise financeira no curto prazo. Sejamos firmes, objetivos, determinados e criativos. Aliás, isto tem sido comum nesse setor.