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Guilherme Bellotti de Melo

Consultoria de Agronegócio do Itaú-BBA

Op-AA-62

Ventos favoráveis e a volta do crescimento
Ao longo dos últimos anos, o setor sucroenergético vem enfrentando um ambiente desafiador que acabou gerando o que podemos chamar de letargia de investimentos. Estimativas do Itaú-BBA, com base em amostra do próprio banco, indicam que, nos últimos quatro anos-safras, o nível de inversões totais no setor, quando avaliado de maneira consolidada, foi insuficiente para manter a qualidade dos canaviais e cobrir a depreciação industrial e de bens e equipamentos agrícolas.  No entanto os sinais para os próximos anos são animadores e, uma vez materializados, poderão pavimentar o caminho para  a volta do crescimento do setor.
 
Essa apatia nos volumes de investimentos tem ocorrido porque parte das usinas apresentam saúde financeira bastante debilitada e, por conseguinte, não possuem capacidade para realizar tais investimentos. Esse grupo de players é caracterizado por apresentar uma menor liquidez e rentabilidade, que se traduzem em uma baixa capacidade de realizar a renovação de canavial, reposição da depreciação dos ativos industriais, máquinas e equipamentos agrícolas.
 
O conjunto  de  grupos econômicos  que goza de uma situação financeira bastante sólida – resultado de uma combinação da excelência operacional e baixo nível de endividamento – e  que está em plenas condições de voltar a investir  optou por encontrar formas de serem mais eficientes com seus ativos (reorganização da colheita, redução de gastos com mudas no plantio, otimização das plantas industriais, entre outros). Bem verdade que alguns já deram sinais de expansões incrementais, seja através de alguma aquisição de canavial, seja de investimento em cogen, biogás e destilarias (incluindo etanol de milho).

Porém  ventos favoráveis  parecem começar a soprar de várias direções. A primeira delas diz respeito à trajetória mais positiva para os preços do açúcar que, no curto prazo, deve ocorrer a reboque de um déficit global substantivo (na casa dos 10 milhões de toneladas) que deverá, finalmente, trazer alívio para cotação da commodity. No médio e longo prazo, espera-se que a efetivação dos mandatos de etanol da Ásia poderá servir como grande absorvedor de ATRs, trazendo um equilíbrio mais estrutural para esse mercado, servindo também para contrabalancear os efeitos deletérios de subsidios à produção e proteção tarifária presentes em tais países.

Do lado do etanol, a implementação do programa RenovaBio – que possui como principal pilar o estabelecimento de metas de redução de emissões de carbono para o mercado de combustíveis –  deverá reduzir a incerteza em relação ao papel do etanol na matriz de ciclo Otto brasileira ao trazer luz ao tamanho do mercado futuro de etanol e, ao mesmo tempo, em implementar o sistema para o reconhecimento monetário das externalidades positivas da utilização de biocombustíveis.

No âmbito econômico, o endereçamento do problema fiscal do País combinado com as reformas microeconômicas (que passam pela lei do distrato, terceirização, cadastro positivo, abertura comercial, entre outras) devem contribuir para um crescimento mais sustentável da economia brasileira ao longo dos próximos anos e, portanto, influenciar positivamente o consumo de combustíveis de ciclo Otto. 
 
Outro efeito positivo é que tais reformas ajudam a ancorar as expectativas de sustentabilidade de dívida pública e, portanto, abrem espaço para que testemunhemos níveis estruturalmente baixos de juros no longo prazo e, com isso, reduzir o custo de capital do setor.

Entretanto, a despeito desses fatores positivos que se descortinam para o setor, a nossa expectativa é a de que o crescimento virá em ondas. Em um primeiro momento, em que os sinais de aumentos de preços do açúcar e dos impactos do RenovaBio ainda não cheguem plenamente ao setor,  a tendência é que  os investimentos sejam puxados pelos grupos com boa musculatura financeira e se concentrem na  expansão de canaviais & ganhos de produtividade agrícola e na modernização dos próprios ativos industriais, com foco em aumentar a utilização da capacidade industrial instalada e melhorar a eficiência.  

As oportunidades de aumento da área de cana tendem a ser impulsionadas pela fraqueza financeira de outras usinas vizinhas, que também poderão “desaparecer” ao longo do caminho. É válido ressaltar que o interesse por canaviais deverá se ater às áreas que ainda apresentam boas condições agrícolas. Paralelamente, devemos seguir observando a expansão da capacidade de produção de etanol de milho em plantas localizadas, principalmente na região Centro-Oeste do Brasil. 

As estimativas do Itaú-BBA indicam que, até 2025, teremos 4,6 bilhões de litros de etanol produzidos a partir do grão (volume três vezes maior que o importado anualmente). E isso é importante, pois, se, atualmente, tais plantas abastecem prioritariamente os mercados do Centro-Oeste, Norte e Nordeste, à medida que esses novos projetos entrarem em maturação, provavelmente parte de tal oferta será direcionada ao mercado do Centro-Sul.

Em um segundo momento, quando os sinais positivos de preços, de fato, forem sentidos pelas usinas, e os projetos passarem a apresentar retorno sobre o capital atrativo e menor risco (inclui-se aqui toda a discussão sobre a adoção de carros elétricos, híbridos e célula de combustível), devemos voltar a ver interesse pela aquisição de ativos industriais em boas condições por parte dos grupos mais saudáveis, o que poderia contribuir para acelerar a consolidação do setor. 
 
Não podemos descartar também a hipótese de termos a volta de investidores/players internacionais interessados em participações acionárias diante do aumento esperado da atratividade do negócio no Brasil. Projetos greenfield de usinas de cana-de-açúcar, no entanto, ainda nos parecem um pouco distante e tendem a ocorrer apenas quando estivermos próximos de encher a capacidade industrial atual e as oportunidades de fusões & aquisições se esgotarem.
 
Assim, a nossa perspectiva é que um cenário mais positivo esteja se descortinando estruturalmente para o setor, e paulatinamente devemos voltar a ser testemunhas do crescimento das usinas sucroenergéticas. Esse processo tende a ocorrer em ondas, e o resultado será um segmento formado por grupos de usinas mais saudáveis (operacional e financeiramente) e com níveis de retorno que criem valor para o acionistas.