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Gabriel Junqueira Kropsch

Vice-presidente da ABiogás

Op-AA-67

o potencial do setor sucroenergético na produção de biogás
O setor sucroenergético tem, hoje, o maior potencial para a produção do biogás, à frente do saneamento e dos resíduos provenientes da produção agrícola e proteína animal. Em estudo realizado anualmente pela Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), calculamos que a indústria de cana-de-açúcar poderia produzir 57,6 milhões Nm³/dia de biogás (padrão ANP).

Em seguida, vem o segmento de proteína animal (38,9 milhões Nm³/dia), a produção agrícola (18,2 milhões Nm³/dia) e o saneamento (6,1 milhões Nm³/dia). Somando todos esses resíduos, que, hoje, são subaproveitados ou descartados de forma inadequada na natureza, o Brasil poderia produzir biogás suficiente para substituir 70% do consumo de diesel ou atender a 34,5% da demanda de energia elétrica. Hoje, aproveitamos apenas 2% de todo esse potencial.
 
Desde que a ABiogás foi criada, em 2013, temos chamado a atenção da sociedade para um melhor aproveitamento dessa fonte de energia renovável, que tem o poder de transformar passivos ambientais em ativos energéticos. O biogás ainda ocupa um percentual pequeno na matriz energética brasileira, mas acreditamos que o crescimento será exponencial a partir de 2021, puxado, principalmente, pelo setor sucroenergético, que, como vimos, representa o maior potencial, tanto de produção quanto também de consumo, em substituição ao óleo diesel. 

Ano passado, mapeamos 69 novas usinas de biogás, metade delas de pequeno e médio porte em propriedades rurais. Nesse levantamento, identificamos sete grandes empreendimentos, que, juntos, somam investimentos de R$ 700 milhões. Entre eles, tivemos a inauguração de uma das maiores plantas de biogás do mundo, da Raízen Geo Biogás, no município de Guariba-SP, com capacidade instalada de 21 MW.

A planta, construída na usina Bonfim, foi desenvolvida com base em uma inovação tecnológica que conseguiu dar aproveitamento energético a dois resíduos da produção do etanol, até então subaproveitados: a vinhaça e a torta de filtro. O empreendimento arrematou contratos no leilão A-5 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de 2016 e começou a fornecer energia elétrica ao Sistema Interligado Nacional (SIN) em janeiro de 2021.  
 
Na nossa visão, o interesse das usinas sucroenergéticas na produção de energia pela rota do biogás só tende a crescer. Apesar de ainda estar aquém do desejado, a infraestrutura de gasodutos para absorver o biometano gerado vem crescendo, e há um potencial enorme de investimentos com a aprovação da Nova Lei do Gás. Além disso, o custo do diesel está cada vez mais alto, o que tem levado o produtor a buscar combustíveis alternativos para o abastecimento da frota e funcionamento do maquinário.

Ainda, o apelo social por práticas ambientalmente sustentáveis tem levado o empreendedor a procurar dar uma destinação adequada para resíduos como a vinhaça. Vale lembrar que, após o processamento para produção do biogás, esses resíduos (chamados de digestato) podem ainda ser aproveitados como biofertilizantes.

Em relação à geração de eletricidade, a biomassa representa 8% da matriz energética brasileira, sendo o setor sucroenergético responsável por 82,3% dessa fatia, com 22,6 mil GWh ofertados à rede. Em comparação com 2019, o crescimento foi de 0,9%. Com o aproveitamento de resíduos ainda pouco explorados e o exemplo de grandes empreendimentos, nossa expectativa é de que o biogás dê um grande salto este ano, tendo o setor sucroenergético como alavancador desse processo. 

Ainda falando sobre potencial, pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) ressaltou que o aproveitamento da vinhaça, da palha e da torta de filtro, disponíveis, hoje, nos dez principais municípios sucroalcooleiros paulistas, seria capaz de gerar, por safra, 3 bilhões de Nm³ de biogás, com potencial para gerar quase 32 mil GWh, equivalente a 80% do consumo de energia residencial do estado de São Paulo, onde estão concentradas a maior parte das usinas de etanol. Transformando em biometano, chegaria a 30% do consumo de gás natural. 

Políticas públicas também favorecem o cenário de expansão do biogás. A entrada em vigor, no ano passado, do RenovaBio, programa nacional para incentivar os biocombustíveis, promovendo a descarbonização, principalmente nos transportes, traz uma nova perspectiva para o setor sucroenergético. 

A inovação do programa está no estímulo à produção mais sustentável e eficiente, sem a utilização de subsídios. Por meio da emissão dos créditos de descarbonização (CBIOs), o produtor passa a ter mais uma renda ao produzir biocombustíveis. O biometano está listado no programa com a melhor nota de eficiência energética por apresentar pegada negativa de carbono. 

Todos esses fatores têm levado grandes players do mercado a investirem na produção de biogás a partir dos resíduos da indústria do açúcar e etanol. A ZEG, por exemplo, se uniu ao Grupo Tereos, da França, para estudar a viabilidade econômica da produção de biogás a partir da vinhaça, proveniente da usina Cruz Alta, em Olímpia, no noroeste de São Paulo, pertencente ao Tereos. As companhias também estabeleceram um acordo para constituir uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) para comercializar biocombustíveis e eletricidade, que já recebeu aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Destaca-se, ainda, o projeto “Cidades Sustentáveis”, realizado em parceria entre a Cocal Energia, outra usina sucroenergética pioneira que está puxando investimentos do setor em biogás, e a GasBrasiliano, distribuidora de gás canalizado do noroeste paulista. 

A unidade terá capacidade de produzir 8,9 milhões Nm³/ano (cerca de 24 mil m³/dia) de biometano a partir dos resíduos da cana-de-açúcar (torta de filtro, vinhaça e palha). O projeto inclui uma rede dedicada para a distribuição de biometano para os municípios de Narandiba, Pirapozinho e Presidente Prudente, todos no interior de São Paulo, e beneficiará mais de 227 mil pessoas.

Uma matriz energética limpa e confiável precisa levar em conta as externalidades. O biogás tem atributos e benefícios que precisam ser corretamente valorados. Além de ser uma fonte não intermitente, é a única fonte de energia primária com pegada de carbono negativa, contribuindo para a redução de até 400% das emissões de gases de efeito estufa. Adicionalmente, promove a produção de biofertilizantes e a interiorização do gás, levando esse combustível a regiões não atendidas pela rede de gás canalizado. A indústria de cana-de-açúcar, por seu alto potencial de geração de resíduos, e histórico de pioneirismo na sustentabilidade, está atenta a essa oportunidade, abrindo caminhos que nós, da ABiogás, temos orgulho em compartilhar.