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José Antonio Bressiani

Diretor de Tecnologia Agrícola da GranBio

OpAA66

Cana-energia: a matéria-prima das biorrefinarias
Desde a sua origem, o melhoramento genético da cana-de-açúcar buscou aumentar a produtividade de sacarose. Isso levou os melhoristas a buscarem variedades com alta pureza e alto teor de açúcares no caldo, o que, por outro lado, levou a um baixo teor de fibras na cana. Isso ocorreu de forma contínua por mais de 120 anos de pesquisas.

A partir dos anos 2000, a exportação da energia elétrica, a partir do excedente de bagaço e dos resíduos deixados no campo (folhas e ponteiros), passou a constituir importante fonte de receita para as usinas do setor sucroenergético e, com isso, o teor de fibras das variedades de cana começou a ganhar importância na hora da escolha do plantel varietal para o plantio. 
 
Mais recentemente, a partir da última década, com o advento das tecnologias de segunda geração (E2G), que faz uso dos açúcares contidos nas fibras (bagaço, folhas e ponteiros) para sua produção, a fibra tornou-se ainda mais importante. É justamente nesse novo cenário, pressionado positivamente pela necessidade de se aumentar a sustentabilidade global, através da redução das emissões dos gases de efeito estufa, que iniciamos uma nova década para o setor sucroenergético, que irá transformar-se significativamente ao longo dela.

No dia 31 de dezembro de 2029, certamente veremos nossas indústrias produzindo uma gama de novos produtos, como o etanol de segunda geração (2G), bioquímicos de segunda geração, biogás, biometano, CO2, hidrogênio, entre outros subprodutos, além dos produtos que já produzem atualmente, que são basicamente o açúcar, o etanol e a energia elétrica. Certamente, ao o final dessa década, nossa agroindústria atual estará muito mais parecida como uma biorrefinaria.

E a matéria-prima principal para esse novo complexo agroindustrial será a cana-de-açúcar, por ter a maior eficiência energética na captura do CO2 e na conversão da energia solar, por ter grande adaptabilidade agronômica, podendo ser cultivada entre os paralelos 30º Norte e 30º Sul, por ter capacidade produtiva em ambientes restritivos, não competindo por alimentos e por ter um sistema produtivo eficiente e competitivo.

Para atender à demanda de matéria-prima para esse novo complexo agroindustrial, o perfil varietal, que hoje é composto por variedades ricas em sacarose e com baixo teor de fibras, terá que mudar. Ao invés de o melhoramento genético priorizar a produção da sacarose por área, ele terá que priorizar a produção de açúcares totais por área, que inclui não somente a sacarose e os açúcares redutores presentes no caldo, mas também a glicose presente na celulose e a xilose presente na hemicelulose. 
 
Os açúcares do caldo irão para a produção de açúcar e etanol 1G, enquanto os açúcares das fibras contidos na celulose e na hemicelulose irão para a produção de etanol e bioquímicos de segunda geração. Da fibra, teremos ainda a lignina, que poderá ser utilizada na caldeira para gerar energia para o processo industrial e, também, exportação para a rede de distribuição de energia elétrica.

Temos, portanto, a necessidade de se buscar um novo perfil varietal, o que coloca o melhoramento genético da cana-de-açúcar num novo divisor de águas, uma vez que a vantagem de se priorizar a produção de fibra é que as plantas serão mais rústicas, menos exigentes em solo, clima, água e nutrientes e mais resistentes a pragas e doenças, resultando em maior eficiência energética no seu cultivo, ou seja, maior unidade de energia produzida por energia gasta, se considerada toda a cadeia (output/input), e menor competição com a produção de alimentos, considerando a viabilidade de plantio dessas cultivares em áreas agrícolas marginais. Com esse novo enfoque, o da bioenergia, a GranBio iniciou, em 2012, o desenvolvimento de um novo perfil varietal de cana-de-açúcar, a cana-energia, cujo foco é maximizar a produtividade dos açúcares totais presentes na cana, oriundos do caldo e das fibras presentes nos colmos, ponteiros e folhas secas.

Após 8 anos pesquisa, a GranBio, através da BioVertis, desenvolveu 11 variedades de cana-energia, todas registradas e protegidas junto ao Serviço Nacional de Proteção de Cultivar (SNPC). Em função da produtividade, teor de fibras e teor de açúcares presente no caldo, as cultivares foram divididas em 2 grupos, a saber:

1) tipo 1: para as variedades que apresentam teor de açúcares redutores totais (ART) acima de 100 kg por tonelada de biomassa, produtividade acima de 50% da produtividade do padrão cana convencional na média do ciclo produtivo de 5 cortes ou mais, e teor de fibras inferior a 20% sobre a biomassa in natura; e

2) tipo 2: para as variedades de cana-energia que apresentam ART abaixo de 100 kg/t, produtividade média de ciclo acima de 100% da produtividade do padrão cana convencional, ciclo produtivo superior a 2 vezes o ciclo da cana convencional (10 cortes ou mais) e teor de fibras acima de 20%. 
 
A cana-energia tipo 1, por exemplo, a variedade Vertix 3 da GranBio, Foto, tem aptidão para ser utilizada na indústria de E1G nos ambientes restritivos, para colheita durante toda a safra, podendo, inclusive, ser utilizada para ampliar a safra. Por ter um sistema radicular bem desenvolvido, essa cultivar contribui para melhorar o teor de matéria orgânica no solo ao longo dos cortes.

A Vertix 3 vem sendo licenciada para as usinas desde 2017, e os resultados agronômicos dos experimentos conduzidos apontam para um aumento na produtividade de açúcar por hectare e redução nos custos de produção dada pela maior produtividade e maior longevidade do canavial (Tabela).

Já as variedades de cana-energia do tipo 2, como a Vertix 2, têm aptidão para serem utilizadas nas indústrias que priorizam o uso da biomassa na produção de etanol e bioquímicos de segunda geração, biogás e biometano, eletricidade, siderurgia, pellets, etanol de milho, entre outras. Pode ser plantada nos ambientes restritivos, para colheita durante o ano todo, sem competir por alimentos. 
 
O etanol obtido do caldo é suficiente para pagar a quase totalidade dos custos de produção, ficando a grande quantidade de bagaço produzido com um custo residual significativamente inferior ao custo das demais biomassas disponíveis no mercado.