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Marco Antonio dos Santos

Agrometeorologista e sócio-fundador da Rural Clima

OpAA71

Entre los Niños e las Niñas
A produção de cana-de-açúcar nos últimos anos vem sofrendo com inúmeras intempéries climáticas. Ora é excesso de chuvas, ora falta, e até mesmo geadas severas, que acabam ocasionando perdas realmente significativas não só ao produtor, mas a toda a cadeia sucroalcooleira.
 
Desde o início da década passada, vemos notando uma maior incidência de La Niña, visto que, de 2010 até 2022, foram registradas 6 ocorrências –10/11; 11/12; 16/17; 17/18; 20/21 e 21/22. Já pra El Niño, foram apenas 3 ocorrências –14/15; 15/16 e 18/19, sendo a La Niña de 10/11 a de maior intensidade do período e o El Niño 15/16, o maior da história. 
 
E, em todos os anos quando ocorre La Niña, a região do Centro-Sul tem chuvas abaixo da média, quando se analisa todo o período de safra – agosto a julho. Motivo pela qual o Brasil vinha passando por uma forte crise hídrica, melhorando agora, nas últimas semanas, em boa parte da região Sudeste, devido às chuvas extremamente volumosas que estão ocorrendo. Principalmente nas cabeceiras dos principais rios que abastecem os mananciais da região. E essa maior incidência de La Niña tem um motivo. A ODP (Oscilação Decadal do Pacífico) numa fase negativa.
 
Essa ODP é um fenômeno de larga escala que ocorre no Oceano Pacífico, que, em média, dura de 25 a 30 anos. E tem fases positivas e negativas, sendo que, em fases positivas – entre as décadas de 1980 e 2000 –, observam-se mais ocorrências de El Niño, e, em fases negativas – entre as décadas de 1950 a 1970 e agora –, tem-se mais La Niña. 
 
Assim, mesmo com um avanço da tecnologia e de variedades mais produtivas, as condições climáticas ainda continuam sendo um grande entrave ao aumento de produtividade. Apesar de que, ano após ano, observa-se esse aumento, poderia ser bem maior se não fossem essas intempéries. 

Além da La Niña este ano, que “tira” um pouco a pressão de chuvas sobre o Centro-Sul, o fato de as águas do Oceano Atlântico estarem também com anomalias negativas desde a primavera de 2021 colaborou para que os corredores de umidade vindos da Amazônia, e, consequentemente, as frentes frias, não ocasionassem chuvas regulares sobre essa localidade do Brasil, vindo a chover bem, principalmente em São Paulo, berço do setor no País, somente no final de janeiro, quando essas águas voltaram a se aquecer, possibilitando, assim, que os corredores de umidade ficassem mais posicionados sobre São Paulo, norte do Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. 
 
No entanto, em Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, as chuvas estão muito mais intermitentes, vindo a atrapalhar os tratos culturais e, até mesmo, o pleno desenvolvimento dos canaviais, visto que os vários dias seguidos com tempo nublado e chuvoso diminuem as taxas fotossintéticas e, consequentemente, o crescimento da planta. 

No entanto, a La Niña vem perdendo forças, e a tendência é de que, ao longo dos próximos meses, o clima entre numa condição de neutralidade, ou seja, impere a climatologia de cada região. Mas é fato também que, em toda essa segunda metade do verão e na primeira metade do outono, o clima ainda será influenciado por essa La Niña, o que fará com que as chuvas não se estendam tanto no outono, e o frio possa dar as caras mais cedo.

Como para a 2ª quinzena de fevereiro e a 1ª quinzena de março estão sendo previstas muitas chuvas sobre as principais regiões canavieiras do Centro-Sul, há uma grande tendência de que venha a ocorrer uma indução floral, principalmente nas variedades mais suscetíveis. O que poderá trazer muita preocupação junto aos produtores, obrigando-os a terem que efetuar aplicações com maturações para evitar o florescimento indesejável.
 
E, com a influência da La Niña, as chuvas deverão se estender até meados de abril, mantendo, assim, uma condição bastante favorável ao desenvolvimento dos canaviais e permitindo que a colheita se inicie já no final de março, ganhando forças ao longo do mês de abril. E o outono deverá ser marcado por um tempo mais aberto e com pouquíssimas chuvas. Não será uma total ausência, mas chuvas bastante esparsas. Isso manterá uma condição bastante favorável ao pleno andamento da colheita. Por outro lado, essa ausência de chuvas poderá comprometer o plantio de inverno. 
 
Com relação ao frio, é fato que, devido à La Niña, as primeiras ondas de frio já poderão ser observadas no final de abril e ao longo do mês de maio. Mas frio não significa geada. Apesar de as ondas de frio estarem ocorrendo mais cedo neste ano, os modelos não sinalizam geadas ao longo dessa primeira metade do outono. E é bem provável que esse inverno não venha a ser tão rigoroso como foi o de 2021, quando foram registradas 3 grandes geadas, ocasionando a quebra de produção dessa safra 22/23.
 
Falar agora na primavera/22 é muito cedo, e, em qualquer prognóstico que for feito, se poderá cometer um erro gigantesco, tanto para os fenômenos La Niña/El Niño quanto e, principalmente, para o regime de chuvas e temperaturas, já que há muitos detalhes meteorológicos e climáticos associados do que a La Niña isoladamente.