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Cesário Ramalho da Silva

Presidente da Sociedade Rural Brasileira

Op-AA-33

Políticas imprudentes

Depois de mais de sete anos com o preço de gasolina congelado para o varejo, o Conselho de Administração da Petrobras divulgou pedido de aumento de 15% para os preços da gasolina, sem o qual considerava impossível manter os investimentos programados para os próximos anos, especialmente os do Pré-sal. Em resposta, o governo, mais uma vez, reduziu impostos (a CIDE), o que resultou em aumento para a Petrobras de 7,83% no preço da gasolina e estabilidade de preços para os consumidores.

O baixo rendimento que os acionistas minoritários da Petrobras vinham obtendo nos últimos anos já haviam provocado expressiva redução no valor das ações, que caíram mais ainda com a nova decisão, o que dificulta a obtenção de novos empréstimos para investimentos. O fato é que a Petrobras valia R$ 430 bilhões em 2007 e, hoje, vale R$ 237,3 bilhões. O valor da empresa caiu R$ 190 bilhões e seus investimentos estão muito aquém dos esperados.

Aqui, no Brasil, a carga de impostos sobre os combustíveis é substancial. Como o petróleo não é da Petrobras, nem das demais empresas petrolíferas que aqui operam, mas sim da União, além dos impostos, é cobrado o valor referente ao petróleo extraído.

O preço da gasolina cobre o valor do petróleo, o custo de extração, do refino, da distribuição e do varejo, além das margens dos segmentos envolvidos. Por outro lado, o preço do álcool não é tabelado, mas, na prática, seu teto no varejo é de 70% do preço da gasolina, devido ao menor rendimento em termos de quilômetros rodados por litro, quando comparado à gasolina.

A produção de álcool no Brasil é antiga, desde o Brasil Colônia. Sempre foi muito importante para a nossa economia. Antes do Proálcool, que nos anos 70 contribuiu para o reequilíbrio da nossa balança de pagamentos, abalada fortemente pelo choque do petróleo, esse combustível já tinha movimentado a nossa frota durante a Segunda Guerra Mundial.

A tecnologia brasileira para a produção de álcool é líder internacional em toda a cadeia de produção, desde a tecnologia agrícola até a fabricação das usinas e equipamentos. Nos últimos anos, o setor também tem se destacado como gerador de empregos de qualidade, ainda mais nessa fase em que a mecanização da colheita avança, principalmente no estado de São Paulo, que tem até 2030 para eliminar totalmente as queimadas nos canaviais, mas já mecanizou 65% da colheita no estado.

Porém as dificuldades por que o setor sucroenergético vem passando são muito mais graves que as dificuldades da Petrobras. Até 2008, a produção de álcool vinha crescendo rapidamente, mas, a partir daí, as margens de lucro, que já eram pequenas, desapareceram. Na primeira fase, os novos investimentos foram suspensos. Na seguinte, tivemos grande desnacionalização do setor. E, no atual momento, vivemos a fase de redução da produção e do início do desmantelamento do setor.

Coincidentemente, a partir de 2008, a crise financeira reduziu drasticamente a demanda mundial e sobrevalorizou o Real, prejudicando nossas exportações industriais e aumentando as importações de manufaturados, além de expor todas as dificuldades de se produzir no Brasil. Em decorrência disso, passamos a incorrer em déficits crescentes de conta corrente, compensados até recentemente pelos investimentos diretos, que, neste momento, arrefecem.

A situação atual é tão grave, que números do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que, em 2011, açúcar e álcool não apareceram na lista dos 40 principais produtos exportados por Ribeirão Preto, reconhecida informalmente como capital da principal região sucroalcooleira do País. Cinco anos antes, em 2006, os dois produtos, somados, haviam rendido à cidade US$ 228,5 milhões em vendas para outros países.

Não é prudente permitir o desmantelamento do complexo sucroenergético brasileiro, cuja construção custou caro ao Brasil, pelo pioneirismo e seu tamanho atual. O custo de reequilibrar o setor é insignificante, comparado ao seu valor. No entanto só o governo pode encaminhar soluções, dado o nível de intervenção estatal no setor de combustíveis líquidos no Brasil.

O reequilíbrio da economia alcooleira teria repercussão importante no dinamismo da economia brasileira como um todo, distribuiria renda e contribuiria para o equilíbrio no balanço de pagamentos, reduzindo importações e aumentando exportações de álcool, gasolina e demais derivados do petróleo.

Mas esse setor tem ainda mais relevância para os demais segmentos da agricultura. A alta tecnologia aplicada à cana-de-açúcar se propaga pelas demais culturas, sendo um indutor do desenvolvimento tecnológico.

Mais de 28% da cana é produzida por fornecedores, agricultores pequenos e médios, distribui renda, dinamiza a atividade econômica em todo o interior do Brasil, estimulando o desenvolvimento de variados arranjos produtivos, parcerias e arrendamentos e gerando recursos para investimentos.

Como a cana-de-açúcar permite diversas colheitas e é muito resistente a problemas climáticos, estabiliza fluxos financeiros e constitui real garantia de renda. Por essas razões, a indústria da cana-de-açúcar é, em grande parte, responsável pelo boom que a agricultura viveu nos últimos anos.

Caso o governo tome a decisão de reativar a produção de etanol, essa retomada será lenta. Primeiramente, será preciso produzir as mudas de cana-de-açúcar, plantar os canaviais, esperar mais um ano e meio para a colheita e, só então, produzir o combustível, tudo isso com remuneração ao produtor e respeito ao meio ambiente.

Para reativar a produção, será necessário também recriar políticas de longo prazo, para dar segurança ao setor e permitir que os investimentos possam retornar. Definida a mistura de etanol à gasolina, a administração microeconômica da estrutura tributária incidente sobre o etanol é suficiente para alcançar a estabilidade necessária. A volta dos investimentos trará grande benefício à sociedade brasileira, que, em poucos anos, voltará a ter no etanol o principal combustível e terá petróleo e gasolina para exportar, gerando pelo menos uns US$ 10 bilhões na balança comercial.

Não há dúvida de que a inércia na definição de políticas equilibradas para a produção e comércio de combustíveis líquidos já alcançou o sinal vermelho, e o prosseguimento das indefinições atuais colocará a perder um dos poucos setores da economia brasileira em que temos tecnologia de primeira linha e boa participação de capitais nacionais. Sem falar nos benefícios da ocupação racional do território nacional, no controle da poluição e na redução da dependência de petróleo, que é finito.