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Aurélio Cesar Nogueira Amaral

Advogado sócio da RSA Advogados e Diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, ANP (até 03/2020)

OpAA68

É preciso manter a liderança
A emergência climática tem dominado o debate na última década entre as grandes nações do mundo e será pauta permanente em 2021. Como signatário do Acordo de Paris desde 2016, o Brasil avançou no tema com a Lei 13.576/2017, que trata da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio). Passo que alavancou a indústria de biocombustível brasileira como setor econômico promissor e potencial influenciador em nível mundial.
 
A regulamentação da legislação do RenovaBio foi realizada em tempo recorde e tornou realidade, em 2019, incentivos para expandir a produção e aumentar a eficiência e o uso de biocombustíveis na matriz energética brasileira. O objetivo é reduzir a emissão de carbono e substituir gradualmente combustíveis fósseis por biocombustível. 

Apoiado pelo RenovaBio, o comércio de biocombustível atingiu, no ano passado, receita de R$ 14 bilhões. Só em 2020, foram emitidos 18.508.636 de CBIOs – Créditos de Descarbonização – e negociados, na B3, 14.896.273 desses créditos, a um preço médio de R$ 43,66/CBIO. A operação movimentou R$ 650.371.279,18, riqueza extra para o setor. Em 2021, a meta é dobrar esse valor.

Com uma legislação de biocombustível vinculada ao setor de transportes, é preciso que o Brasil esteja atento ao debate mundial, especialmente no que se refere ao carro elétrico. O País vem mostrando sua capacidade em criar infraestrutura, gerar tecnologia e expandir o segmento de biocombustível. Com a decisão europeia de interromper, em 2030, a produção de carros a combustão, é necessário assegurar a sobrevivência da indústria brasileira de biocombustível e automobilística. Um sistema energético que tem uma indústria de etanol, um Programa Nacional de Produção de Biodiesel-PNBP e o RenovaBio é prova de que o Brasil tem muito para crescer em economia sustentável.

Neste mês de abril, aconteceu a Cúpula dos Líderes sobre o clima, e, em novembro, ocorre a Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança de Clima (COP26). 
 
O presidente americano, Joe Biden, foi o anfitrião da Cúpula e tem colocado a mudança climática como prioridade do atual mandato. Ele aposta na aprovação de um projeto para os EUA de US$ 2 trilhões em investimentos em infraestrutura, que traz, entre seus alvos, o desenvolvimento de energia limpa.

Precisamos acelerar nossa inserção na bioeconomia, reforçando políticas como o RenovaBio e o Pagamento por Serviços Ambientais. Para isso, é fundamental a implantação de um mercado regulado de carbono, no formato de um Sistema de Comércio de Emissões (SCE), como meios para permitir uma maior atratividade e posterior aceleração de entrada de recursos financeiros no País. 

O mundo empresarial nacional aponta para a urgência de o País avançar na Política Nacional de Biocombustível. Uma dessas iniciativas é a carta-manifesto “Neutralidade Climática: Uma grande oportunidade”,  que foi endereçada, em março, ao Governo. Na carta, 28 grandes empresas, apoiadas por entidades de diversos segmentos produtivos, como agronegócio, indústria, comércio e sociedade civil, pedem “metas mais ambiciosas” para o País no que se refere às mudanças climáticas.

Entre elas, que o País se comprometa com a neutralidade de emissões em 2050 e não em 2060, como anunciado em dezembro pelo governo brasileiro. A carta apresenta o resultado de levantamento realizado por especialistas do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), demonstrando que o investimento em Soluções Baseadas na Natureza (NbS), como o reflorestamento, por exemplo, pode gerar US$ 17 bilhões em negócios até 2030.

O professor de economia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Eduardo Seroa, afirmou, em artigo publicado no dia 9 de abril, que estudos demonstram que o Brasil, sozinho, representa mais de 20% desse potencial global das NbS climáticas, que poderiam gerar para o País uma receita líquida entre US$ 19 e US$ 27 bilhões até 2030.

A natureza privilegiada do Brasil oferece o cenário propício para que o País seja um grande contribuinte para a geração de crédito carbono. Um país que tem uma floresta Amazônica e uma indústria de biocombustível poderosa pode ser muito mais do que um importador de tecnologia. Em convergência com a emergência climática mundial, o Brasil tem como apostar no futuro, fortalecendo formas sustentáveis de exploração da natureza, explorando todo o crédito carbono para impulsionar a economia nacional, transformando esse crédito em riqueza e em instrumento de combate à desigualdade e promoção do desenvolvimento.

Todavia é preciso ficar alerta para não perdermos tempo e nem o espaço que conquistamos. É urgente definir com mais propriedade e clareza políticas públicas que integrem a cadeia dos biocombustíveis com a motorização da indústria automobilística. Do contrário, iremos ver o fechamento em massa da nossa indústria, que se converterá em importadoras e montadoras que, cada vez mais, desenvolverão essa atividade por meios de robôs. O que pode ser mortal para a indústria nacional de biocombustível e automotiva. Essa última nos deu o carro flex, o carro híbrido e uma logística de distribuição de etanol que, atualmente, nos permite rodar do Oiapoque ao Chuí sem problemas para o abastecimento. 

Algumas dessas conquistas estão em risco, assim como o nosso parque de engenharia e riqueza técnica. É imprescindível, portanto, que o País realize uma grande avaliação estratégica dos programas de renovação da frota e da sua regulação. O objetivo é integrar toda nossa potencialidade de produção de biocombustíveis, produção agrícola, produção energética, combinando com novas tecnologias e regulação adequada. A integração dessa cadeia nos prepara para não sermos tragados por uma política que vem de fora, impondo a obsolescência do parque automotivo nacional, com reflexos nefastos para a indústria de biocombustíveis.

Cabem, ainda, ajustes no RenovaBio, na regulação para incorporar todo o potencial da produção de biocombustíveis a partir de grãos (biodiesel/etanol de milho), elevando sua elegibilidade, hoje de 40%, para algo em torno de 80%. Seria um acréscimo de mais de 20 milhões de CBIOs, correspondente a uma riqueza de mais de R$ 800 milhões por ciclo de certificação.

Temos um agronegócio nacional pujante para fortalecer a indústria de biocombustíveis integrada à indústria automobilística. Para tanto, é preciso um grande pacto entre poder público, indústria e integrantes da cadeia do biocombustível para essa indústria avançar. A introdução de pacotes de tecnologia cria as bases para modelos de economia circular e bioeconomia. São alguns dos desafios que estão postos para que o Brasil assuma fatores de produção de serviços que valorizem a produção com menor impacto ambiental, em um ciclo de desenvolvimento positivo, contínuo, que preserva e aprimora o nosso capital natural, otimiza a produção de recursos e minimiza riscos.