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Raul Gabriel Beer

Assessor em Fusões e Aquisições

Op-AA-23

O etanol de cana já é uma realidade na estratégia das multinacionais

Alguns anos atrás, a grande maioria das usinas brasileiras de açúcar e álcool era nacional. Exceções relevantes eram os grupos Dreyfus e Tereos, ambos da França. Hoje, estima-se que, em 2010, as empresas estrangeiras representem cerca de 20% da cana moída no Centro-Sul do País. Segundo a PricewaterhouseCoopers, metade das 112 fusões e aquisições de empresas que ocorreram no setor nos últimos 6 anos tiveram empresas multinacionais como compradoras.

De 2000 para cá, a cana deixou de ser apenas mais um insumo para a produção de açúcar e se transformou em matéria-prima fundamental para a matriz energética. E alguns dos opositores originais do etanol de cana entenderam que era mais conveniente participar desse mercado agora e tomar posições relevantes do que continuar a combatê-lo.

Isso abriu o mercado para empresas globais do agronegócio, do setor de energia, de petroquímica e até de logística, que passaram a se interessar pelo setor e a buscar participações em todos os elos da cadeia do etanol no Brasil. Mas não foram só elas: fundos de private equity, empresas relevantes de alguns países emergentes e novos empreendedores do setor de biotecnologia também.

A crise financeira de 2008 inviabilizou alguns projetos cuja taxa de retorno dependia de preços mais altos e criou dificuldades para outros que ainda precisavam captar financiamentos. Houve casos também de prejuízos causados pelo uso de derivativos financeiros inadequados. Tudo isso incentivou a consolidação e facilitou algumas aquisições no setor. 

Nos últimos anos, o Grupo Dreyfus, tradicional trader de commodities, fez crescer a sua participação no setor, e o seu grande movimento recente foi a compra da Santelisa Vale. A Bunge, hoje a terceira maior exportadora de açúcar do mundo, comprou, entre outras, o controle da Moema. A ADM entrou no mercado em sociedade com o Grupo Cabrera, do ex-ministro da agricultura, e, por enquanto, segue uma estratégia de crescimento greenfields.

Chama a atenção, no entanto, que a ADM é uma das maiores produtoras mundiais de etanol à base de milho. A British Petroleum controla a Tropical BioEnergia e tem planos ambiciosos nesse mercado. Há também rumores de que multinacionais estariam disputando duas usinas de um grupo nacional que passa por dificuldades financeiras.

Em paralelo, despontaram algumas empresas nacionais com vocação e força para atuarem como agentes de consolidação, fazendo aquisições e desenvolvendo novos projetos green-fields. Note-se, porém, que algumas dessas empresas nacionais já têm, ou terão, em breve, participação estrangeira significativa no seu capital.

A Cosan S/A é controlada pela Cosan Ltd., empresa controlada por brasileiros, mas com ações negociadas no mercado norte-americano. Ela tem atuado como forte consolidadora de usinas, mas também focou na ampliação da sua presença em outros elos da cadeia.

Caso se confirme a operação anunciada recentemente com a Shell, apenas um pouco mais de metade do negócio da “Nova Cosan”, que então terá controle compartilhado entre capitais nacionais e estrangeiros, continuará a ser relacionado a moagem de cana e produção de açúcar e de álcool. E consolidando os ativos da Esso e da Shell, ela se transformará na terceira maior distribuidora no varejo de combustíveis do Brasil.

Esse acordo traz escala e sinergias para essas operações de distribuição, mas, principalmente, viabiliza o acesso da Shell ao mercado e à tecnologia de produção de etanol de cana, além de permitir que a Cosan avance mais rapidamente na direção do etanol de segunda geração.

Da mesma forma, a ETH, controlada pela Odebrecht, tem uma participação de 33% da japonesa Sojitz Corporation, empresa multinacional que atua na comercialização de commodities. Se confirmada a aquisição da Brenco, provavelmente mais alguns sócios estrangeiros dessa empresa podem se juntar à Sojitz como acionistas estrangeiros da “nova ETH”.

Esse é o novo mundo das usinas, que não podia passar longe da globalização. O etanol de cana já é uma realidade na estratégia das multinacionais, o que também ajuda a vencer a resistência ao produto em outros mercados e realimenta o seu interesse. Empresas brasileiras crescem e consolidam o mercado e devem aumentar a sua atuação internacional, contando inclusive com o capital estrangeiro. Neste mundo globalizado, com empresas fortes – brasileiras ou estrangeiras –, o bom e velho “álcool” vendido nos postos de combustíveis brasileiros passou definitivamente a se chamar etanol.