Me chame no WhatsApp Agora!

Luiz Eduardo Garcia

Diretor do Departamento do Fundo Nacional de Infra-estrutura de Transportes do Ministério dos Transportes

Op-AA-16

A hidrovia como alternativa da logística

O primeiro deles, movimentando cerca de 10 milhões de toneladas anuais, o corredor hidroviário Madeira-Amazonas, com movimentação crescente de soja, embarcada em Porto Velho, Rondônia, e transbordada para navios marítimos em Itacoatiara, no Amazonas, e/ou Santarém, no Pará, com vistas à exportação. No baixo trecho do rio Tocantins, através de by-pass, pela hidrelétrica de Tucuruí, já que as eclusas para transposição da barragem ainda estão em obras, ocorre a movimentação de ferro-gusa.

A hidrovia Paraguai-Paraná, por onde hoje transitam perto de 13 milhões de toneladas por ano, e que corta cinco países do continente sul-americano, Argentina, Paraguai, Bolívia e Uruguai, além do Brasil, é uma via importante para a movimentação de granéis bolivianos, argentinos e paraguaios, com destino ao mercado externo, com alguma soja brasileira, sendo de grande importância, no caso brasileiro, na exportação de minério de ferro e manganês, com grande possibilidade de expansão.

Restringindo-se ao caso da cana, do açúcar e do álcool, o corredor da hidrovia Tietê-Paraná é o único que contempla, atualmente, a logística dessas cargas. Historicamente, a hidrovia do Tietê iniciou-se com a movimentação da cana-de-açúcar, com destino a Usina Diamante, situada prati-camente às margens daquele rio, no reservatório de Bariri, no município de Jaú, estado de São Paulo, no início da década de 80.

Até então, como a hidrovia não era contínua até o rio Paraná, pois algumas barragens estavam com as suas eclusas incompletas, a única carga que se movimentava pelo rio Tietê era a areia extraída do leito e utilizada na construção civil. Além da cana que chegava por caminhão, a Usina Diamante expandiu suas áreas de cultivo, em terras ao longo da hidrovia, e passou a receber boa parte da cana para seu esmagamento, via hidrovia.



Das áreas de cultivo até os cinco terminais de embarque, situados em locais estratégicos na beira do rio, essa “ponta” de transporte é realizada pelos caminhões; depois de embarcada nos comboios, seguem para a usina. A cana transportada pelas barcaças é descarregada diretamente para a moenda. Esse movimento varia, anualmente, entre 400 e 600 mil toneladas, batendo o recorde, em 2007, de 871 mil toneladas.

O álcool já foi transportado pela hidrovia, durante a década de 90, portanto em passado recente. O álcool era embarcado em Araçatuba, ponto mais distante do ponto de embarque, e o comboio fluvial deslocava-se até Santa Maria da Serra, à beira da SP-191, onde era transbordado das barcaças para caminhões-tanque, que se dirigiam a Paulínia, para posterior distribuição aos postos de abastecimento de combustíveis.

Chegou a se movimentar, por essa logística, cerca de 20 a 50 mil toneladas anuais, com pico de 72 mil toneladas, no ano de 1997. O açúcar já teve uma movimentação experimental pela hidrovia nos anos de 2002 e 2003, pouco expressiva, pois, na verdade, foi um teste para verificar como se comportaria a logística completa desse transporte, quer seja em custo, como em tempo total do deslocamento origem/destino.

No ano de 2007, a experiência foi retomada e a movimentação atingiu, nesse ano, 88 mil toneladas. Agora, vai depender dos mercados do açúcar e do álcool, como se organizará a produção de cada um na região abrangida pela hidrovia Tietê-Paraná, para que esses mercados consolidem-se. O estado de São Paulo, através da Secretaria de Transportes, estabeleceu dois protocolos importantes para o transporte dessas mercadorias (açúcar e álcool), objetivando estudar, de comum acordo, qual seria a melhor plataforma logística naquele estado.

Os protocolos foram assinados com a Transpetro e com a Unica - União da Indústria da Cana-de-Açúcar. Para o caso do etanol, já há uma primeira alternativa de logística, que transpõe a fronteira daquele estado, por exemplo, pois há previsão de fluxos utilizando-se do modal hidroviário, com origens em Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais, além de Araçatuba e São José do Rio Preto, como regiões de produção importantes, seguindo por via fluvial até Conchas, em São Paulo, quando integra, por ferrovia, até o porto de Santos.

Outra opção seria com saída de Conchas, por duto até Paulínia (Replan) e daí mais duas opções de rotas, sempre por dutos, até a região metropolitana da Capital e daí até Santos, ou da Replan, via Guararema, atingir o Porto de São Sebastião, este último, especialmente o álcool do tipo combustível para exportação. As regiões produtoras no estado de São Paulo, Ribeirão Preto e Sertãozinho, estariam, aparentemente, melhor servidas pela rodovia e ferrovia ou mesmo por dutos, o que não impede que, alternativamente, se utilizem também da hidrovia.




Para o caso do açúcar, em situação semelhante ao do etanol, parece ser mais interessante para as regiões do Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás, assim como Araçatuba e São José do Rio Preto, utilizarem-se do tramo hidroviário, terminando em Conchas e daí integrando ao porto de Santos, via rodovia e/ou ferrovia. Assim também como para o álcool, o açúcar produzido nas regiões de Ribeirão Preto, Sertãozinho e Piracicaba, as alternativas por rodovia ou ferrovia aparentam ser mais interessantes, sem que a hidrovia não possa ser também considerada, alternativamente.

Para o estado de São Paulo e ao longo da hidrovia Tietê-Paraná, as regiões onde se localizam as importantes usinas produtoras de açúcar e álcool já foram citadas. Mas, existem outras, à beira dos rios Grande e Paranapanema, e outras que também estão localizadas nos estados de Minas Gerais e Paraná, que pode-riam também estar se beneficiando da opção hidroviária, não fosse a falta de visão de futuro, que não considerou a construção das obras de transposição (eclusas), simultaneamente com a realização das barragens de geração hidrelétricas, instaladas nesses dois importantes rios.

Infelizmente, a falta de visão prospectiva obrigará o setor público de transportes e, como conseqüência, o público em geral, a despender um alto custo na implantação dessa infra-estrutura, para a via navegável, caso queiram utilizar essa modalidade. Mesmo que não se possa utilizar a hidrovia no transporte em longas distâncias, da origem ao consumo, para o transporte do produto acabado (açúcar ou álcool), a alternativa de instalação de novas usinas, ao longo desses rios, poderá resultar de interesse, como foi o exemplo do caso da Usina Diamante, no rio Tietê.

Isto porque o transporte da própria cana-de-açúcar das regiões de plantação às unidades de esmagamento, sendo esse transporte geralmente de curto percurso, poderá ser viável em cada reservatório, mesmo isolado, e facilitar o acesso a ambas as margens do rio barrado, via travessia de balsas dos caminhões canavieiros. Além disso, a disponibilidade de água pode ser outro atrativo nessa decisão de localização. E quem sabe se, no futuro, não se viabilizam esses rios para o transporte fluvial?

Por último, cabe comentar as conclusões de recente estudo apresentado pelos professores Hernani Luiz Brinati e Newton Narciso Pereira, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, que analisou as vantagens comparativas do ponto de vista econômico e ambiental, para o transporte de combustíveis pela região da hidrovia Tietê-Paraná, entre as opções rodoviárias (caminhão-tanque) e as barcaças especializadas (casco duplo).

Analisaram quatro rotas, com origens diversas e todas terminando em Conchas. A análise econômica indicou custos econômicos pela rodovia como de oito vezes superior ao do custo pelo comboio fluvial. Do ponto de vista ambiental, identificaram para ambos os modais, os principais indicadores e quantitativos de emissão de poluentes, categorizando e quantificando o peso para cada tipo de impacto (esgotamento do combustível fóssil, aquecimentos local e global, chuva ácida, eutrofização e poluição aérea) e avaliando, através de um modelo, a relação entre os índices de contribuição de impacto ambiental entre as modalidades.

Concluíram, para uma das rotas analisadas, que o potencial de poluição do transporte rodoviário seria cerca de 3,7 vezes superior ao do impacto causado pelo comboio. É inegável que o transporte hidroviário tem grande contribuição a dar ao país, na racionalização dos custos, aumentando a margem de ganho dos produtores rurais e, um fator muito importante: a redução dos impactos ambientais, como conseqüência do uso de um transporte menos agressivo ao meio ambiente e racional no consumo de energia.