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Jairo Menesis Balbo

Diretor Industrial da Usina São Francisco

Op-AA-15

Um bem que nunca se apague

Houve tempo no futebol paulista em que dirigentes de clubes pequenos torciam para que seus times perdessem, porque não tinham recursos econômicos para pagar o “bicho” pela vitória. Estamos pertos, afinal o ministro da Fazenda, Guido Mantega, confessou: “Crescemos pouco para evitar apagão”. Mas, esperemos nunca chegar à hora de nossos dirigentes torcerem pela queda do crescimento do país, por falta de recursos energéticos para suprir sequer a demanda de empregos.

Estranho país este, eterno refém de outros, quando se trata de aproveitar suas próprias energias. Ele tem rios de energia, mas a importa de hidrelétricas paraguaias e venezuelanas. Sempre soube de suas enormes reservas, mas importa gás da Bolívia – que só entrega parcialmente. País que investe no indispensável conhecimento e domínio da tecnologia nuclear, mas há décadas desperdiça fortunas para produzir, em quantidades aquém da necessidade.

O Brasil desenvolveu, graças aos seus canaviais, a maior revolução energética da história da humanidade e encontrou o que o mundo ainda persegue, a alternativa limpa, renovável para o petróleo. Mas, foi preciso que o mundo assediasse, até comprasse, algumas unidades produtoras, para o país acordar e livrar-se de campanhas protagonizadas por ignorantes e falsos patriotas.

Um pé de cana oferece mais de 100 subprodutos - vários assombram o mundo, entre eles, o álcool (sem ele, não há combustível limpo, barato e alternativo ao petróleo) e o bagaço (sem ele, não há como produzir energia limpa e barata para a rede pública, até em períodos de estiagem). Qual é o cenário que nos permite a libertação dessa teia de inexplicáveis contradições?

Da energia total disponível, 41% vem das hidrelétricas, 30% do petróleo, 23% da biomassa, 3% do gás natural e 3% de outras fontes. Para cada 1% do PIB, é preciso um crescimento de produção de 1,2% de energia elétrica. Chegam ao mercado de trabalho, anualmente, cerca de 3.200.000 profissionais. Em virtude do ganho de produtividade e da inovação tecnológica, desaparecem 460 mil vagas.

Para atender a essa oferta de novos trabalhadores, o PIB precisa crescer, de forma sustentável, 5% ao ano, o que corresponderia a 6% de energia e sabemos que o país tem estrutura para crescer até 3%, sem risco de apagão. Usamos pouca energia e não temos como usar mais. Cada brasileiro consome 2,12 mil KWh/ano, ante os 9,6 mil do australiano, um país tropical, como o nosso.

Evidentemente, o inverno contribui muito para os 15,8 mil KWh/ano, que faz do canadense o maior consumidor do mundo. Na verdade, essa falta de infra-estrutura (energia elétrica, por exemplo) limita o desenvolvimento do país e gera pobreza. Para acompanharmos a demanda de empregos, o Brasil precisa de cerca de uma Itaipu (12.500 MW) a cada 4 anos, enquanto nossos canaviais significam a energia de duas Itaipus.

Durante o século 20, o PIB cresceu, em média, 4,2% ao ano, mas, atenção, nos últimos 25 anos, a média caiu para 3%. Vivemos momentos de apagão entre 2001 e 2003, quando o PIB caiu a 1,1%, abaixo do crescimento da população: 1,4 %. Hoje, 10% das usinas de açúcar e álcool geram excedente de energia. A capacidade atual de geração é de 2.810 MW; produz-se 500 MW e ruma-se para 7 mil MW, em 2.030, moendo-se 1,4 bilhões de toneladas de cana em todo o país.

Para se usufruir de todos os recursos energéticos em escala nacional, é necessário investir 40 bilhões de dólares em dez anos, a contar de 2004. Caso contrário, haverá apagão. Há projetos de geração de 7.681 MW de energia hidrelétrica, à espera de licença do Ibama. Enquanto isso, o déficit energético custa cerca de R$ 3 mil por MW. Portanto, a cada MW não consumido, a economia nacional perde R$ 3 mil. O racionamento de 2001 custou, sem correção, R$ 640,00 por MWh.

Qualquer decisão do governo, se optar por não investir e impuser racionamento via preço, será perversa, porque quem pode pagar leva e quem não pode, reduzirá o consumo. O país perderá a competitividade de seus produtos no exterior, cairá o desenvolvimento e, em conseqüência, a geração de empregos, e subirá o preço de serviços e mercadorias, a começar dos alimentos (já não começou?).

A cana, que ocupa somente 5% da área cultivável do país, é só energia: um terço dela é caldo (que dá açúcar/energia para o homem e álcool); um terço é proporcionado por folhas e pontas e o outro terço, pelo bagaço. Na região de Ribeirão Preto, a maior produtora do mundo, em um hectare de cana, colhem-se 90 toneladas.

Uma tonelada oferece 250 quilos de bagaço, que convertido em eletricidade, significa que a energia gerada em caldeiras pelo bagaço de um hectare de cana é suficiente para abastecer uma residência durante a safra. Se forem usadas novas tecnologias, com aproveitamento de ponteiros e palhas da cana, o poder de geração dobra. Com a gaseificação do bagaço, esse poder triplica.