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Heroldo Weber

Ridesa, DFF, CCA, UFPR

Op-AA-05

Adubação da cana-de-açúcar, por onde anda?

Foi a partir dos anos 70 que o setor sucroalcooleiro apresentou um grande desenvolvimento, o qual foi acompanhado e alavancado pelos órgãos de pesquisa criados na época, pela necessidade de apoio a este crescimento. Nos últimos dez anos, a instabilidade nos negócios do setor sucroalcooleiro proporcionou grandes alterações no sistema de produção da maioria das unidades produtoras do país.

Também neste período, os órgãos de pesquisa da cultura da cana-de-açúcar, da iniciativa privada e do governo, sofreram as conseqüências das repetidas crises, foram desmantelados e reestruturados, só para manter os programas de melhoramento genético da cana-de-açúcar. Nestes trinta anos, o potencial de produção agrícola e industrial de cultivares comercialmente cultivadas apresentou ganhos superiores à 25%, mas as adubações da cana planta e das soqueiras seguem recomendações preconizadas para as cultivares com potencial de produção inferior.

A desnutrição ou o desbalanceamento de nutrientes nos canaviais brasileiros é extremamente comum. Fórmulas mágicas aparecem diariamente. Busca-se a agricultura de precisão, mas não se tem novas curvas de calibração. Doses maciças de fertilizantes, às vezes, são aplicadas em áreas com altas infestações de nematóides, cultivadas com mudas de baixa qualidade, oriundas de lavoura comercial, quase sempre comprometidas pelo raquitismo e com elevada percentagem de mistura.

A expansão do setor quase sempre ocorre em áreas de baixa fertilidade natural, caracterizadas principalmente pelos baixos teores de matéria orgânica, ressaltando os malefícios ao desenvolvimento da cultura, causados pelas pragas de solo e pela qualidade da muda, afetando diretamente a eficiência das adubações. As áreas de plantio comercial com a cultura da cana-de-açúcar devem ser planejadas e cultivadas de maneira adequada visando a conservação, o acúmulo de nutrientes e de matéria orgânica, minimizar a ocorrência de erosão e da lixiviação e possibilitar uma ciclagem contínua dos nutrientes.

O preparo do solo no sistema convencional é responsável por grande parte da queima da matéria orgânica, que nos solos de baixa fertilidade natural já apresentam teores muito baixos, podendo ser minimizada, pelo plantio direto e pela colheita mecanizada, sem queima. Dentro deste enfoque, situa-se o manejo da adubação, que está intimamente ligado ao manejo da matéria orgânica.

A cultura da cana-de-açúcar pode ser considerada como muito rústica, em relação ao seu cultivo em áreas com baixo potencial produtivo. Qualquer tipo de correção de solo e de recomendação de doses de N, P e K asseguram, se não houver déficit hídrico acentuado, produtividades significativas, mas abaixo do real potencial das cultivares.

Informações básicas sobre a nutrição e a adubação da cana foram amplamente estudadas entre os anos 70 e 90. A partir daí muito pouco se tem produzido cientificamente, exceção aos excelentes trabalhos gerados em dissertações e teses nas universidades, que mantêm algum vínculo com o setor. Grandes questões ainda não foram definitivamente explicadas.

Como, quanto e quando se aplicar nitrogênio em cana planta, época de aplicação, localização e dose de nutrientes para as soqueiras, que representam 80% dos canaviais comerciais? Estudos recentes, incluindo a parte subterrânea da cana-de-açúcar - sistema radicial, ajudam a compreender a ciclagem de nutrientes e o comportamento diferenciado de cultivares, em diferentes solos.

O genoma da bactéria fixadora de nitrogênio possibilitará novos estudos, embora nas novas cultivares muito pouco se sabe sobre seu potencial de fixação biológica de nitrogênio, o que é importante para o manejo de uma cultura que extrai grandes quantidades deste nutriente. A necessidade de cultivares de maturação precoce (início da safra em março), média e tardia, que serão colhidas em períodos frios e secos, quentes e úmidos, também dá indicação de necessidades nutricionais diferentes. O crescimento exuberante de alguns novos cultivares também mostra que poderá haver uma demanda nutricional diferenciada entre as cultivares que compõem a área comercial das Unidades produtoras.

Outro aspecto importante da nutrição da cana-de-açúcar, está ligado aos chamados resíduos da fabricação do açúcar e do álcool. São mais precisamente subprodutos de altíssima qualidade e que, na maioria das vezes, são aplicados como descarte em áreas comumente chamadas, até hoje, de “áreas de sacrifício”, ou atendendo projetos que levam mais em consideração o raio de aplicação econômico do que os benefícios, que somente serão observados a médio e longo prazo.

Deve-se lembrar que a ferramenta básica para os estudos, não só de nutrição e adubação, mas de preparo do solo, irrigação, manejo da lavoura, locação de cultivares etc..., na cultura da cana-de-açúcar é a caracterização dos diferentes solos cultivados comercialmente. Hoje, com a prática do arrendamento, pouco se investe nisto que seria a pedra fundamental para a definição de todo o sistema produtivo do setor.

Estas considerações foram postas de forma bastante sucintas, com o objetivo de despertar a consciência de que muito terá que ser feito para se recuperar o tempo perdido. Anos de experiência acumulada por muitos pesquisadores foram e estão sendo perdidos por não estarem sendo formados novos pesquisadores, que atuem nas diferentes áreas do sistema de produção da cana-de-açúcar. Adubação da cana e remédio de gripe todo mundo tem receita. Estamos certos?