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Eduardo Alfred Taleb Boulos

Sócio da Levy & Salomão Advogados

Op-AA-20

Governança corporativa, empresas familiares e crise

Embora venha apresentando mudanças, o setor sucroalcooleiro é ainda caracterizado por empresas marcadamente familiares. A gestão nessas empresas enfrenta problemas clássicos e que se agravam com as novas gerações, suscitando dúvidas a respeito do futuro da empresa e da sustentabilidade financeira dos herdeiros. A divisão do patrimônio e a sucessão de membros da família na administração da companhia são usualmente combustíveis de discórdia que impactam a empresa.

Essa questão é particularmente premente no momento em que o setor sofre duramente os efeitos da crise econômica. Conseguir capital, seja na forma de investimento societário ou financiamento, requer condições de segurança e estabilidade para o investidor. É justamente esse capital que determinará quem sobreviverá em um mercado sob intensa consolidação. Endereçar adequadamente a gestão da empresa familiar, questão sempre importante, ganha, agora, ares de sobrevivência.

O remédio tradicional para problemas de gestão é a adoção das tão faladas práticas de governança corporativa. No âmbito da empresa familiar, contudo, a sobreposição de funções entre acionistas e gestores e a necessidade de atender aos interesses da família e da empresa, simultaneamente, trazem desafios adicionais àqueles enfrentados pela governança tradicional.

Nos negócios familiares, o papel da governança é, primordialmente, organizar as relações entre a família, o patrimônio social e a gestão da empresa, de maneira a assegurar os lucros da companhia e a perpetuação dos valores do empreendedor. Como exemplo dessa dinâmica própria, a regulamentação formal dos conselhos de administração, típica da governança tradicional, tem eficácia limitada, pois muitas decisões negociais são tomadas em processo informal, dentro do núcleo familiar. Diante desse quadro, como assegurar a perpetuação da empresa e organizar os interesses da família? Não há receita única. Cada empresa e família requerem uma configuração particular. As propostas listadas abaixo são algumas das principais medidas.

Holding Familiar: Uma das técnicas mais tradicionais é a criação de uma ou mais sociedades holdings, para controlar a empresa ou o grupo. Nessas holdings, a gestão é familiar, enquanto nas sociedades operacionais, a gestão fica a cargo de profissionais. Essa estrutura permite isolar os conflitos familiares.

Assim, as decisões da família podem fluir de maneira mais uniforme nas controladas e evitam-se os prejuízos causados por entraves gerados por brigas familiares no nível operacional. Acordo de Acionistas: Outra opção comum de organização é a celebração de acordos de acionistas, que podem, e devem, ser celebrados, inclusive dentro de holdings familiares.

Eles regulam o exercício dos poderes de voto, a eleição dos membros do conselho e da diretoria e mecanismos de votação e representação nas sociedades operacionais, além de regras relativas à circulação de ações - cláusulas restritivas de venda, direitos de preferência e opções de compra, e mecanismos de saída para os acionistas dissidentes, que sejam justos para o retirante, mas que, ao mesmo tempo, preservem a viabilidade da empresa.

Profissionalização da administração: A criação de regras de funcionamento dos órgãos da administração, incluindo regimentos internos e a eleição de membros independentes para tais órgãos, evita que familiares despreparados integrem a administração da sociedade e acrescentam profissionalismo à gestão.

Conselho de Família: Esta opção funciona como canal de comunicação entre acionistas e executivos, no qual se discutem os projetos a serem implantados a cada ciclo de gestão, as expectativas da família em relação à sociedade, a preservação dos valores, a preparação dos familiares para se tornarem acionistas ou administradores (se o caso) e a separação entre o patrimônio da família e o da empresa.

As vantagens desses mecanismos de governança são provadas e conhecidas. Sua adoção exige coragem para enfrentar situações estabelecidas e participação de especialistas técnicos e experientes. Há dinheiro para investimento e ativos demais precisando de capital. Os investidores estão mais críticos e seletivos e canalizarão os recursos para ativos que ofereçam mais estabilidade e segurança. Ficar sentado em cima do problema de governança, na atual conjuntura, é receita para ficar para trás.