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Humberto César Carrara Neto

Gerente Agrícola da Usina São João Açúcar e Álcool

Op-AA-36

Começar de novo

Para uma abordagem prática e objetiva da proposta “como produzir mais, melhor e com menores custos”, é necessário entender alguns vetores que atuam na equação Produção x Custos e o que nos fez perder o status de líderes mundiais em custos. Quero abordar o tema Volume (produção), Qualidade (melhor) e Custos, sem perder de vista que nossa fonte de receita é uma commodity que não aceita, no seu valor, o simples repasse de custos crescentes de produção de sua matéria-prima.

Estamos falando de processo de produção agrícola de uma gramínea, a cana-de-açúcar, em larga escala, portanto sofrendo influência direta de clima e de regime de chuvas, na qual a irrigação plena ainda não é uma prática adotada; portanto, como clima é um fator incontrolável pelos meios de produção, proponho isolá-lo da abordagem.

O que temos, então, de fatos novos nessa cultura secular e que podem ter algum efeito relacionado na equação citada são: 1. intensificação da mecanização; 2. incidência de regulatórios. Pretendo, então, uma abordagem ao tema proposto pela interferência desses dois vetores elencados. A mecanização de colheita, apesar de não ser uma prática nova nem desconhecida, nunca havia sido aplicada com tal intensidade e regularidade como nas últimas safras.

Eram raras as empresas que a utilizavam na totalidade de suas áreas, tampouco em toda a extensão da sua safra. Muitas unidades ainda se davam (e que ainda se dão) ao luxo de escolher época e local de colocar sua “escola na avenida”. Quanto ao plantio mecânico e suas derivações, como o híbrido, é prática nova que está sendo implantada de forma intensa e sem as adequações necessárias em sua logística, seus terrenos e parque de máquinas. São inevitáveis e inquestionáveis os danos aos rizomas, a compactação, as perdas de matéria-prima e o teor de  impurezas que a colheita mecânica, mesmo quando racionalmente aplicada, provoca nas lavouras, mormente se obrigada a operar em solos úmidos e terrenos não preparados e/ou adequados para a prática.

Como também inquestionável e até agora inevitável, o consumo de mudas que o plantio mecânico exige, admitindo-se que podemos conseguir uma qualidade de plantio (stand de plantas) desejável.

Mas percebam que, para todas as modalidades de plantio mecânico, um processo é único: a colheita mecânica de mudas e, impreterivelmente, em épocas de chuvas, portanto aqui se aplicam os efeitos tratados no parágrafo da mecanização da colheita sobre os rizomas, sobretudo sobre nosso mais sensível canavial, os campos de mudas.

Sem nenhuma apologia ao passado de operações manuais, mas o que temos aqui são vetores que afetam de forma negativa, reduzindo a qualidade e a produção/volume, e desconsiderar esse fato pode ser perigoso para sua estratégia.

Como também importante notar que países com mais histórico de mecanização de plantio adotam a prática de manejar seus campos de mudas, de forma a obter um material mais fibroso, com menor diâmetro e alta densidade de gemas/m de colmo, o que propicia um baixo consumo de mudas/ha.

Precisamos buscar alternativas químicas e/ou físicas para adequação de nossa muda, pois uma avaliação da taxa de conversão hectare colhido de muda/hectare  plantado e a valorização dessa muda, baseada em produção industrial cessante, vai nos remeter à dimensão do problema.

Desconsiderar que a mecanização de colheita foi fortemente impulsionada por um regulatório, o plano de eliminação de queimadas, e que outros, tais como áreas de vivência, sanitários móveis, NR 31, levantamento e monitoramento de flora e fauna, lei da balança, enlonamento de cargas, proibição de terceirizações, certificações, etc., estão e estarão influenciando de forma positiva, aumentando os custos de produção.

Novamente, não quero negativar as importantes conquistas que produziram bem-estar e segurança no trabalho para nossos colaboradores, tampouco os benefícios ambientais conquistados para nossas comunidades, mas desconhecê-los e desconsiderá-los vai nos colocar, enquanto profissionais executores, em uma desconfortável condição passiva de aceitação e de extinção de um fórum onde necessariamente se deve discutir, não se devemos aplicá-los, mas de que forma e em que tempo.

Explico-me melhor exemplificando um regulatório que brevemente nos assolará. A lei da balança, que na verdade não é lei mas norma, que nos coloca como transgressores, quer seja pela tipificação da composição de transporte utilizada (rodotrem), como pela carga que o mesmo carrega. Estima-se que a sumária aplicação de uma normatização de 1960, implicará em custos adicionais de 20 a 30% no transporte da matéria-prima.

Ora, em que fórum estamos discutindo a capacidade e a categoria das obras de arte e o pavimento de nossas rodovias, a capacidade de tração e frenagem de nossos caminhões, a possibilidade de se operar com composições múltiplas de 12 eixos sem colocar em risco o condutor e transeuntes? Analisem que toda a evolução de tecnologia de construção de veículos e equipamentos rodoviários, bem com as técnicas e padrões de construções viárias, se submetem passivamente a uma NORMA (...não é LEI) de 4 décadas e não se abre questão sobre o fato.  

Quero concluir o raciocínio proposto sob duas ópticas, mecanização e regulatórios, que produzir mais e melhor resume-se em retirar mais açúcares e fibras com qualidade por unidade de área e que a intensificação da mecanização, apesar de imperativa, é contrária à tese. Temos que tratar de mitigar os efeitos que a prática impõe, procurando, num ambiente de P&D, a disponibilização de variedades mais adaptadas e menos sensíveis à agressão mecânica, a práticas de manejo de mudas e de equipamentos dosadores de gemas que reduzam o volume de mudas consumido, ao mesmo que, no ambiente “caseiro”, no dia a dia de nossas empresas, desenvolvermos e aplicarmos boas praticas preservacionistas e espaçamento de plantio com georreferenciamento de forma a se localizar a zona de agressão fora do espaço de exploração agronômica.

Ainda na linha do aumento de volume e dentro do ambiente de P&D, a transgenia, a seu tempo, certamente irá trazer grande contribuição. Mas vamos nos debruçar mais sobre o vetor mecanização intensiva para explorar um “filão” importante na busca da produtividade com menores custos, sem muito tecnicismo e sem muita pirotecnia, orientado pela maneira “caseira” de análise de fatos, admitindo-se que uma máquina está disponível para o trabalho durante 24 horas/dia e, sob os ensinamentos de Mialhe com o seu “Máquinas Agrícolas, Ensaios e Certificações” de 1996, convido-os a revisitar o conceito de Eficiência Global, ou Capacidade Operacional de Longo Tempo,  que reflete o quanto das 24 horas de um dia, estamos conseguindo efetivamente produzir resultados operacionais. Ou seja, quantas horas do dia uma colhedora põe cana sobre um transbordo, quantas horas do dia uma plantadora lança rebolos ao sulco ou um caminhão transporta peso sobre seu chassi?

Temos recursos tecnológicos disponíveis e com custos acessíveis para que essa medição seja feita sem um exército de apontadores e digitadores e de forma automática, de forma que não custará ficarmos “corados de vergonha” ao descobrirmos o quão longe estamos da otimização dos ativos mais significativos da empresa. Quando efetivamente enxergarmos esses números, uma tempestade de ideias e perguntas aflorarão nas mentes mais criativas, do tipo: por que o tanque de insumos é tão pequeno? Por que o reabastecimento é tão lento? Por que tantos tempos auxiliares ou ociosos? Por que faço tanto transporte de máquinas entre fazendas? Por que levo uma máquina de cada vez? Por que tanta curva? Por que tiros tão curtos? Por que...?

Considero o vetor “Logística de Operações” um canal ainda mal explorado pela gestão na equação Produção x Custos no nosso segmento e vejo, aqui, uma janela de oportunidade frente a um cenário com poucas chances de grandes ganhos. Devemos também explorar o vetor Regulatórios de forma mais construtiva e contributivo, sem esquecer que nossa força motriz é uma commodity que não aceita o simples repasse de custos adicionais, mas também sem negar que tecnologias evoluem tal e como as necessidades e conquistas socioambientais; portanto é imperioso a criação de fóruns representativos para discussões e adequações de normas, bem como de sua aplicação nos meios produtivos.

Longe de preconizar uma postura retrógrada, mas também distante de uma postura passiva onde a culpa já nos foi imputada em cartórios, é imperioso criar ambiente para se discutir a aplicação de normas retrógradas que não captaram os desenvolvimentos tecnológicos dos sistemas que se propõem controlar.