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Bruno Rangel Geraldo Martins

Presidente da Socicana

Op-AA-44

O desafio de produzir

Como é de conhecimento de todos, o sistema  sucroenergético passa pela maior crise da sua história. Poderíamos listar, aqui, diversos fatores que interferem negativamente no desenvolvimento da cadeia produtiva da cana-de-açúcar, entretanto, muito já se falou disto. São assuntos recorrentes. E todas as perspectivas nos fazem repensar a maneira de como devemos conduzir e gerenciar adequadamente o nosso negócio.

A inovação, a criatividade, a difusão tecnológica, o aperfeiçoamento da gestão, a união, o diálogo, as decisões compartilhadas são ações mais do que importantes. Com certeza, são formas integradas de crescermos e atravessarmos mais esse período turbulento de incertezas e desafios. No século XVI, a cana-de-açúcar foi trazida pelos portugueses e começou a ser cultivada em nosso país.

O método utilizado para a propagação da lavoura era o plantio de toletes, fazendo o corte no meio deles para a separação da gema, que, posteriormente, germinava, e, então, formavam-se os canaviais. Esse método de plantio é utilizado até os dias atuais.  Mas algumas inovações surgiram. O plantio mecanizado, hoje, é dominado pelas usinas e alguns produtores. O maquinário adotado é de grande porte, o custo de aquisição é alto e necessita uma quantidade relativamente alta de hectares a serem plantados para a sua viabilidade, por isso se torna desinteressante para o pequeno e o médio produtor.

Porém um novo sistema deve revolucionar o plantio de cana nos próximos anos. É o sistema de mudas pré-brotadas, o popular MPB. O processo de produção se inicia com os toletes da cana-de-açúcar, os quais recebem todo o tratamento nutricional e fitossanitário necessário; posteriormente, são plantados dentro de tubetes e desenvolvidos em casas de vegetação. Assim que atingem o tamanho adequado, são transferidos para um local de adaptação fora das estufas e, depois, plantados no campo.

Algumas vantagens já foram avaliadas: esse sistema utiliza menor quantidade de toneladas de colmos para a propagação; necessita de maquinário de menor porte; podem-se utilizar as mudas para correção de falhas nos canaviais, diminuindo o custo com renovação e aumentando a longevidade do canavial; na cultura da cana, no primeiro corte, pode trazer um incremento de 30% de produtividade; além de outros fatores positivos.

As nossas organizações, em parceria com institutos de pesquisa e Secretaria da Agricultura, desenvolveram polos para produção de mudas, o que torna possível um novo negócio. Pequenos produtores podem se tornar “viveiristas”, produzir apenas a muda pré-brotada e vender a quem se interessar. Essa técnica está em desenvolvimento, e vários estudos estão sendo feitos, mas promete ser um excelente negócio no curto prazo. Aliada a esse processo, a agricultura de precisão começa a atingir uma maior quantidade de produtores.

Amplamente dominada no cerrado e em fronteiras agrícolas, a utilização dessa prática foi adotada por alguns produtores posicionados em centros mais avançados. Essa fantástica técnica de condução das lavouras vai muito além do GPS e piloto automático. Consegue-se fazer a aplicação de corretivos de solo e fertilizantes em taxa variada, colocando os produtos nos locais onde realmente se necessita, a aplicação de defensivos controlada por sensores, a sulcação de implantação da lavoura uniforme, aumentando a área plantada dentro do talhão, a colheita do canavial em conformidade com o plantio, evitando pisoteio e abalos danosos às soqueiras, a utilização de drones para investigação de falhas nos canaviais, para posterior correção e identificação de deficiência nutricional, através da coloração das plantas, entre outros.

O custo inicial de implantação desse sistema é alto, porém o retorno é no curto prazo. É fato que essa prática traz uma grande redução no custo de condução da lavoura e maior ganho de produtividade. Já estabelecemos parcerias e investimentos com alguns fabricantes de equipamentos, disponibilizando o sinal para que os produtores possam utilizar essa ferramenta e ter maior eficiência nos serviços. Todos esses processos são realizados buscando a sustentabilidade do produtor de cana-de-açúcar.

E, quando falamos em desenvolvimento sustentável, temos sempre que pensar nos três pilares principais: econômico, social e ambiental. Estamos estabelecidos em uma região extremamente dependente da agricultura, principalmente do cultivo da cana-de-açúcar e das atividades complementares, como o plantio de amendoim e soja na rotação de cultura. Essas atividades são de extrema importância para a conservação do solo, a reciclagem de nutrientes, a supressão de pragas, doenças e plantas daninhas, sem contar uma complementação de renda para o agricultor.

A rotação com culturas rentáveis deve ser mais bem observada pelas unidades industriais, que podem arrendar as suas áreas de renovação para que seus produtores possam realizar essa atividade complementar. Quando a agricultura se desenvolve, todo mundo sai ganhando: o proprietário da terra ganha com todas as vantagens citadas e com o valor do arrendamento da área; o agricultor, que vai colher a sua produção, entregar na cooperativa e receber por isso; a cooperativa, que receber esses produtos, processá-los e vendê-los no mercado interno e externo; e toda a sociedade e seus mais variados segmentos, como farmácias, supermercados, escolas, planos de saúde, etc.

Não existe distribuição de renda sem geração de renda, e esse é um modelo completo, que garante sustentabilidade na região produtora. Concomitantemente ao processo sustentável, existe a certificação da produção de cana. Nos dias atuais, apenas os produtos finais, açúcar e etanol, são certificados. Os canaviais não. Estamos em constante contato com certificadoras internacionais. Nos últimos quatro anos, participamos de fóruns de discussão e eventos internacionais, e essa questão é muito exigida por países importadores, então, estamos trabalhando para que a nossa atividade também seja certificada.

Todo o processo de produção de cana-de-açúcar é semelhante à das usinas. Hoje, alguns mercados exigem que os produtos estejam certificados, respeitando protocolos de produção e, inclusive, pagando a mais por isso. O produtor de cana tem todo o direito de participar desse bônus. Temos que mostrar ao mundo que produzimos de forma sustentável, respeitando a legislação trabalhista e ambiental, gerando empregos e desenvolvendo regiões.

Além dos dois principais produtos já conhecidos por todos, as unidades industriais faturam com a geração de energia e a venda de bagaço. O desenvolvimento de caldeiras de tecnologia avançada tornou viável a atividade de produção de energia, utilizada pela indústria para tocar sua fábrica, cujo excedente é vendido. O bagaço, quando não utilizado para esse fim, também é vendido para outras empresas, que o utilizam para abastecer as suas caldeiras.

Todavia esses produtos não estão contemplados no Consecana, sistema esse que valoriza a matéria-prima para fim de pagamento aos produtores. O Consecana deve ser revisto e modernizado, para que as atividades que não existiam à época da sua implantação possam ser quantificadas e colocadas no cálculo de valoração da matéria-prima. Aliados a esse processo, os estudos de eficiência na produção de açúcar e etanol devem ser refeitos, pois, como já citado, o sistema de produção, hoje, é mais eficiente do que quinze anos atrás.

Com todas essas inovações e ações de aprimoramento, o agricultor deve estar bem preparado para esse novo cenário. A capacitação e o desenvolvimento profissional dos produtores, desenvolvidos através de cursos, palestras e intercâmbios nacionais e internacionais, são atividades importantíssimas para que se expandam os horizontes e convidem o produtor a enxergar a atividade de forma diferente. As nossas propriedades são verdadeiras empresas, que devem ser conduzidas de forma profissional.

Aquele produtor resistente a mudanças e apegado a paradigmas dificilmente terá espaço nos próximos ciclos de desenvolvimento agrícola do País. A gestão financeira das nossas propriedades, o controle de recursos humanos, a implantação de sistemas de controle são exemplos de inovações que devem estar presentes na estratégia do agricultor moderno. Essas ferramentas nos auxiliam e mostram, de forma clara, os resultados para que o produtor possa dominar toda a sua contabilidade e tomar as decisões com maior segurança.

Por fim, poderíamos escrever diversas páginas com ações que estão sendo feitas para a melhoria da atividade, sempre pensando no desenvolvimento sustentável do produtor de cana-de-açúcar. Agora nos resta, como gestores de entidades de classe, fazer também a nossa parte. Devemos procurar nos unir a outras associações e cooperativas para compartilhar serviços e estratégias que visam diminuir custos e ganhar competitividade no nosso negócio: deixar de lado as vaidades e trazer para o nosso lado pessoas que se interessam em conduzir as nossas agremiações e que possam ser capacitadas para fazer um trabalho melhor do que o nosso; firmar parcerias com universidades e institutos de pesquisas, para que possamos aumentar os estudos e trabalhos voltados ao desenvolvimento tecnológico do setor; sair da zona de conforto e conhecer outras culturas, para que possamos ampliar o conhecimento e network e, de uma forma moderna, aprimorar o nosso desenvolvimento. Enfim, o nosso trabalho não vai ser fácil. Mas, com um pouco de vontade e dedicação, temos a certeza de que não será em vão. Será uma nova fase para a agricultura do País. Juntos, poderemos fazer do setor sucroenergético a atividade que trará progresso e desenvolvimento sustentável para o Brasil.