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Suzana Kahn Ribeiro

Professora do Programa de Engenharia de Transportes Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Op-AA-09

A importância dos biocombustíveis na matriz energética

Os recentes eventos climáticos, tais como furacões, inundações, entre outros, juntamente com os aumentos constantes de preço de petróleo, fizeram com que a diversificação da matriz energética se tornasse de extrema relevância para o mundo. As questões do clima e do aquecimento global deixaram de ser um tema tratado apenas por acadêmicos, governos e ONG’s ambientalistas e passaram a ser debatidas pelo cidadão comum, que pressiona Governos e empresas no sentido que se reduzam as emissões de gases de efeito estufa.

Sabe-se que a queima dos derivados de petróleo emitem gases que contribuem para a intensificação do efeito estufa. Desta forma, o uso intenso e progressivo destes combustíveis poderá levar o planeta a uma mudança nos padrões climáticos, com conseqüências desastrosas para seus habitantes. Aliado a isto, temos os recorrentes problemas políticos no Oriente Médio, região rica em petróleo e principal exportadora.

Evidentemente, os preços elevados que hoje se apresentam podem ser circunstanciais, entretanto, é praticamente inegável que o patamar de 30 dólares/barril, dificilmente voltará. Isto faz com que os países procurem diversificar sua matriz energética, seja por questões de segurança do abastecimento, seja por questões econômicas ou ainda ambientais.

Assim sendo, os biocombustíveis atendem a esta demanda por diversificação. Do ponto de vista estratégico, é interessante, pois pode ser produzido em diferentes regiões. Do ponto de vista ambiental é positivo, uma vez que é produzido a partir de biomassa renovável, suas emissões de dióxido de carbono - principal gás responsável pelo efeito estufa, são praticamente anuladas quando a biomassa volta a crescer, pois, para tanto, se utiliza do mesmo dióxido de carbono contido na atmosfera, possibilitando um balanço nulo deste gás.

Além das questões de meio ambiente global, têm-se vantagens relativas ao meio ambiente local. Os biocombustíveis não possuem enxofre em sua composição, portanto sua queima não provoca emissão de óxidos de enxofre, poluente danoso para a qualidade do ar. Do ponto de vista econômico, representa muitas vezes um combustível mais barato e produzido localmente, como o caso do álcool brasileiro.

Emprega mais trabalhadores, principalmente os menos qualificados, portanto com maior dificuldade de se colocar no mercado de trabalho. Em termos de gastos com saúde, também se pode afirmar que o emprego de um combustível que melhora a qualidade do ar, reduz efetivamente as despesas do Estado com saúde pública.

No que concerne ao uso de energia, o setor de transporte merece destaque, pois suas atividades são quase todas movidas por motores de combustão interna, que utilizam derivados de petróleo, em especial gasolina e diesel. É o setor mais dependente de petróleo. Assim sendo, alternativas à gasolina e ao diesel são de extrema relevância e urgência, conforme a argumentação apresentada anteriormente.

Além disto, é este o setor que mais cresce em termos de uso de energia, tanto por conta do aumento populacional como pelo aumento das riquezas geradas e distribuídas no mundo. Isto ainda é mais acentuado nos países em desenvolvimento, onde a taxa de motorização ainda é muito baixa. É esperado que, nas próximas décadas, o uso de energia em transporte nos países em desenvolvimento, represente cerca de 40% do consumo de energia mundial. Some-se a estes fatos, a complexidade do setor de transporte.

O setor envolve uma ampla infra-estrutura e frota, ambas adequadas aos combustíveis líquidos, usados em motores de combustão interna existentes no presente e, certamente, nas próximas décadas. É neste contexto que os biocombustíveis assumem um importante papel, no que tange à diversificação da matriz energética de transporte, em especial o álcool e o biodiesel. No Brasil, o cultivo da cana-de-açúcar para a produção do álcool combustível já é um exemplo para o mundo, de uma alternativa energética competitiva, baseada na biomassa.

O balanço de energia e emissão de poluentes é extremamente positivo, quando comparado à gasolina. Evidentemente, isto se deu em função de uma política de governo, onde se investiu pesadamente nesta alternativa que, no entanto, não decepcionou. Os ganhos obtidos foram bem superiores ao que foi investido. A mesma evolução pode se esperar do biodiesel.

Evidentemente, não se espera que os biocombustíveis venham a substituir os derivados de petróleo, mas, certamente, serão parte significativa da matriz energética mundial, em especial, no setor de transporte. Neste sentido, o Brasil deve se posicionar de forma a manter a liderança na produção de biocombustíveis. O mundo todo se prepara para produzi-los. No entanto, o Brasil possui enormes vantagens comparativas, como a disponibilidade de terra agriculturável, recursos hídricos, clima favorável, entre outras.

No entanto, para que estas vantagens comparativas tornem-se vantagens competitivas em um mundo globalizado, mas que paradoxalmente procura proteger fortemente seus mercados, sobretudo no que se refere aos produtos agrícolas, é preciso investimento e uma gestão competente e responsável. Ou seja, a produção descuidada de biocombustíveis pode também representar o esgotamento do solo, concentração de renda, deslocamento de culturas alimentares, maiores emissões de poluentes atmosféricos, sonegação de impostos, entre outros problemas.  

Enfim, o Brasil poderá ter um papel de destaque na matriz energética mundial se souber gerir os programas de biocombustíveis com eficiência. No entanto, não é trivial conduzir um programa deste tipo, uma vez que envolve sincronia de setores tão diferentes como o de petróleo e o agrícola, além da importante interface com a área ambiental. Entretanto, é isto que se espera do Governo brasileiro.