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Clarissa de Araujo Lins e Rafael Saavedra

Diretora e pesquisador da FBDS, Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável Desafios da Sustentabilidade Corporativa

Op-AA-13

Desafios da sustentabilidade corporativa

O conceito da sustentabilidade corporativa consiste em incluir e balancear aspectos sociais, ambientais e econômicos, na definição da estratégia da empresa, sempre alicerçados em boas práticas de governança corporativa. O pressuposto por trás deste conceito é o de que a sociedade civil e seus diversos representantes são hoje mais exigentes e levam a empresa a prestar contas do impacto total de suas atividades.

Essa nova forma de conduzir os negócios traz em si algo que ainda não é plenamente percebido pelos executivos, já que a incorporação desse conceito na visão estratégica abre espaço à exploração de uma série de oportunidades, que contribuem para a competitividade, a estabilidade e a perenidade da empresa.

Neste contexto, a sustentabilidade corporativa propõe que se busque identificar os ativos naturais, humanos e financeiros, que promovem a geração de valor para o negócio, e verificar de que forma eles poderiam ser impactados pela evolução das demandas das partes interessadas. É preciso questionar se, no médio e longo prazo, as práticas adotadas pela empresa continuarão a gerar valor ao negócio.

No intuito de verificar o entendimento e a aplicação deste conceito, a FBDS vem conduzindo, em parceria com a escola de negócios suíça CSM/IMD e o Coppead/UFRJ, uma pesquisa aplicada em diversos setores da economia. No setor de Açúcar e Álcool, o estudo conta com o patrocínio do SESI Nacional e o apoio da Unica e do Sindaçúcar-AL.

O setor sucroalcooleiro apresenta desafios em todas as etapas da cadeia produtiva - cultivo da cana-de-açúcar, processamento e comercialização dos produtos - assim como nas práticas de gestão adotadas. Com base nas entrevistas realizadas, estas questões são aqui classificadas, de acordo com:

1. o potencial de impacto sobre o negócio, tanto em termos operacionais quanto de imagem e reputação; e
2.  a complexidade para resolução - mudança e investimentos necessários.

As questões ambientais - gestão de resíduos e de recursos hídricos, aproveitamento da bioenergia, uso e conservação do solo, etc - vêm sendo incorporadas aos negócios há mais tempo, em função da forte ligação da atividade com o meio ambiente e da regulação e fiscalização crescentes.

Já as questões sociais passam por considerar os diversos elos da cadeia, além do relacionamento com as comunidades e, neste sentido, ainda requerem uma postura proativa, por parte dos gestores das usinas. Em função do intenso desenvolvimento do setor nas últimas décadas, muitos destes desafios são considerados, na percepção dos executivos do setor, de baixa complexidade para sua resolução, como o problema de gerenciamento do vinhoto e as questões de preservação ambiental no plantio.

Ainda assim, o setor continua a ser cobrado pela sociedade, consumidores, clientes e ONGs, tanto no sentido de dar transparência às ações realizadas, quanto por envolver, no encaminhamento de boas práticas, os demais agentes da cadeia produtiva. Em um setor tão pulverizado, com uma grande massa de empresas de pequeno e médio porte, a análise do conjunto dos players é tarefa complicada. Os extremos convivem sem que se possa estabelecer uma relação clara entre tamanho da organização e práticas adotadas.

Algumas características, no entanto, têm se mostrado bastante fortes no setor, independente da localidade, tamanho ou história de formação do grupo. Dentre elas, a cultura predominante de não exposição e de pouca transparência e comunicação com as diversas partes interessadas. A forte presença de controle familiar nos principais grupos produtores (10 dos 11 grupos entrevistados têm controle familiar), refletida no controle acionário, parece reforçar a pouca predisposição das empresas à prestação de contas à sociedade, ao mesmo tempo em que desacelera o processo de profissionalização da gestão.

A resistência à mudança cultural apresenta-se como o item mais citado, pelos executivos entrevistados na pesquisa, de principal barreira à plena incorporação do conceito da sustentabilidade corporativa no setor. Essa característica do setor reflete-se nas práticas de comunicação das empresas, onde fica clara a dificuldade encontrada na tentativa de melhor mapear as práticas do setor e seu posicionamento estratégico, frente aos desafios futuros.

A fraca prestação de contas tem efeito direto sobre a confiabilidade transmitida pelo setor, bem como sobre sua reputação. Sem a clara distinção das práticas, metas e conquistas de cada grupo, todos são penalizados pelos erros de alguns, que adotam práticas repudiadas pela ampla gama de stakeholders. Todavia, um novo cenário competitivo já se desenha no setor sucroalcooleiro, tanto por meio da consolidação de players tradicionais e sua disposição de buscar recursos no mercado acionário – apoiando-se na adoção de boas práticas de governança corporativa – quanto pela entrada de capital estrangeiro.

Adicionalmente, o setor tem sido alvo de grande exposição a uma gama crescente de stakeholders, como consumidores internacionais, ONGs e a própria mídia. Nesse sentido, a incorporação da sustentabilidade corporativa como um valor estratégico do negócio mostra-se como o caminho natural e irreversível para o crescimento do setor e vem ganhando cada vez mais adeptos.

Ela pressupõe o avanço contínuo das práticas socioambientais e uma revolução na cultura de transparência e prestação de contas, permitindo que as empresas consigam auferir, de forma perene, os ganhos deste momento único de valorização internacional do diferencial competitivo da indústria sucroalcooleira brasileira.